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A tal de lei de imprensa – por uma regulamentação do setor

Não há dúvidas de que a comunicação de massa precisa ser regulada. Da mesma forma que era preciso remover qualquer resquício do autoritarismo ditatorial que caracterizava a Lei de Imprensa derrubada há dias pelo STF, também é verdade que é preciso uma nova lei de imprensa que corrija e coíba distorções, garanta a democracia no setor e o direito à comunicação de brasileiros e brasileiras.

Alessandra Terribili*

Reexaminar a tal de Lei de Imprensa, que datava de 1967, já não era sem tempo. A lei carregava um entulho autoritário do período de ditadura militar no Brasil que há muito tempo já nem era aplicado. Coisas do tipo: apreensão de jornais que incitem a “subversão da ordem”; punição a órgãos de imprensa que questionem o poder público; e por aí vai.

É preciso, no entanto, contextualizar que a sociedade brasileira está habituada a olhar para os meios de comunicação como meros consumidores, em vez de se entender como sujeitos com direito à informação e à comunicação. Essa perspectiva garante aos veículos de comunicação uma “autonomia” muito além dos limites do razoável, o que traz implicações importantes.

Sendo assim, não há dúvidas de que o setor precisa ser regulado, e da mesma forma que se deveria mesmo remover qualquer resquício do autoritarismo ditatorial que caracterizava a Lei de Imprensa derrubada pelo STF, também é verdade que é preciso uma nova lei de imprensa que corrija e coíba distorções, garanta a democracia no setor e o direito à comunicação dos brasileiros e brasileiras.

Controle social e direito à comunicação
No caso de rádios e TVs, nem há o que se discutir. As concessões são públicas, embora empresas privadas as explorem. Portanto, a luta dos movimentos por controle social não é antiquada ou “invasiva”, como querem nos fazer crer. Controle social dos meios de comunicação é um pressuposto para a democracia. E precisa estar assegurado.

Assim como é um pressuposto para a democracia a garantia do direito à comunicação – não apenas a receber informação (que nunca é imparcial). Quem publica e circula a informação à qual a maioria dos brasileiros tem acesso é gente que controla muito mais do que seu próprio veículo. É gente que manda no país. Marinho, Frias, Mesquita, Sirotsky… as tais nove famílias. É gente que tem compromisso com o capital, com o status quo, gente que tem poder. Gente que tem lado.

Direito à comunicação é o que tentam exercer algumas rádios comunitárias, alguns jornais de circulação limitada, algumas TVs universitárias. Muitos são tratados como criminosos, acusados de derrubar aviões e de serem “piratas” nesse mar de um dono só. Muitos são estrangulados pela lógica de mercado que organiza também a mídia.

Respostas e sanções
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e de TV (Abert) demonstram preocupação particular com um item a ser apreciado pelo STF dentro da lei de imprensa: direito de resposta e sanções.

De fato, uma nova lei de imprensa precisa garantir que ações na Justiça não sejam praticadas com o objetivo de intimidação do autor, diretor ou do próprio veículo. A liberdade de imprensa e o acesso à informação precisam sim estar assegurados. Inclusive, não são poucos os casos em que, com base nas sanções previstas na antiga lei de imprensa, Davis e Golias duelaram – vezes Davi era o autor da mensagem, vezes era o atingido por ela.

Mas há que se compreender a posição de ambas as entidades na sua totalidade – que apenas inclui a questão particular dos direitos de resposta. Esses fiéis defensores da liberdade de expressão – quase todos que, 45 anos atrás, apoiavam o golpe militar e expressaram isso livremente em seus jornais e noticiários – odiariam ser submetidos ao que classificam como censura. E censura, pra eles, é qualquer coisa que os impeça de exercer livremente o direito de dizer o que bem entendem sem ter que prestar contas a ninguém e nem ter prejuízo de nenhuma espécie. Controle social, pra eles, é censura.

Esses fiéis porta-vozes da opinião pública, guardiões inquestionáveis da verdade dos fatos, não suportariam a idéia de ter limitado, pela perspectiva do direito de resposta, de sanções cabíveis, sua liberdade de empresa, ops, de imprensa.

O artigo 5º da Constituição Federal garante, em seu parágrafo V, que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral, ou à imagem”. Com base nesse artigo, não apenas indivíduos, mas organizações, inclusive políticas, reivindicaram seus direitos de resposta junto aos órgãos de Justiça competentes. Um caso recente foi aquele que tirou do ar, por 30 dias, um programa da Rede TV! que contrariava toda e qualquer premissa de defesa dos direitos humanos. Em seu lugar, circularam peças produzidas por movimentos sociais da comunicação, de mulheres, de luta LGBT, de negros e negras.

O parâmetro tem que ser a democracia
O interesse dos proprietários dessas empresas é disciplinar bem esse artigo, para que lhes cause o mínimo de dano possível. O interesse de quem luta por democracia há tanto tempo é garantir que esse pessoal não goze da prerrogativa de “donos da voz”. É garantir que eles não podem dizer o que querem, reforçar esteriótipos, legitimar preconceitos, seduzir pelo consumo, informar pela metade, esconder uma parte… não podem fazer isso impunemente.

A lei de imprensa de 1967 nunca foi usada a nosso favor. O que não significa que não seja necessário que haja uma nova lei em seu lugar. Não pode haver a hipótese de o setor ficar sem regulação. Que a Conferência Nacional de Comunicação, confirmada pelo Governo Federal para o fim do ano, e com processo já iniciado em muitos estados, seja um palco privilegiado para a construção disso, visando à democratização.

* Alessandra Terribili é vice-presidenta do Diretório Municipal do PT São Paulo e integrante da Secretaria Nacional de Mulheres do PT.

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