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Crise na Democracia Representativa

Por Bruno Linhares

O sistema democrático representativo, conquista de lutas sociais desde o século das luzes e herança das revoluções burguesas que transformaram o mundo, está em crise em todo o planeta. Na verdade, em crise por dois fatores diferentes, que se relacionam e se reforçam mas que expressam, cada um deles, maior ou menor intensidade conforme a realidade de cada país.

O primeiro fator é estrutural – os limites da representação sempre foram alvo da crítica marxista. Os mecanismos do formalismo democrático de representação são incapazes de expressar a vontade das massas populares, ainda mais porque as decisões de condução do Estado interferem nos interesses econômicos de forma tão determinante. A negação, consciente ou não, de expressar os interesses dos eleitores e a falta de controle por estes dos rumos dos mandatos, assim como o cretinismo parlamentar, isto é, a autonomização do parlamentar e a busca da manutenção desta condição a qualquer custo, fazem parte da realidade de qualquer parlamento.

Com a queda do “socialismo real” e o advento do neoliberalismo, uma contraofensiva triunfante dos valores mercantis, conservadores e do individualismo só fez aprofundar tais limites e domesticar parlamentares e partidos que anteriormente buscavam se contrapor aos vícios do sistema.

Esta nova realidade política e ideológica abre as portas para o segundo fator, conjuntural, da crise política de representação. A adesão do conjunto dos partidos sociais democratas à ideologia liberal em muito pouco os diferenciam dos partidos de direita tradicional. Tais partidos, seja na Europa ou nas Américas, implementaram diretamente as políticas sociais e econômicas antipopulares do consenso de Washington, que remodelaram o arcabouço econômico, financeiro e social do planeta após a queda do muro de Berlim.

Grande parte dos antigos PCs, como o PCI, agora PDS ou o PCB, que majoritariamente se transformou em PPS, também abraçou o ideário liberal. Em muitos países, com exceção da América Latina, abriu-se uma brutal crise de representatividade, onde apresentam-se ao eleitorado, mais opções do mesmo, sem que seja possível, de fato, definir com propriedade a distinção entre as propostas e políticas dos diversos partidos. Da mesma forma, na Europa e em boa parte da Ásia, a extrema esquerda não consegue superar sua crise de pequenez, vencer o sectarismo, garantindo uma mínima unidade do campo popular, não se conformando como alternativa real aos olhos das massas.

Isto facilita o trabalho dos aparelhos ideológicos da dominação burguesa, que transmitem continuamente as mensagens do conformismo e do individualismo, afastando as pessoas da esfera política, incentivando o absenteísmo e a passividade. A cada vez fica menor a atenção das sociedades com a política parlamentar ou com as saídas coletivas para os dilemas que as atormentam e dividem.

Tal realidade é diversa na maioria da América Latina que, por uma série de fatores distintos e combinados, conseguiu impulsionar movimentos antineoliberais, que revalorizaram a política e colocam na ordem do dia a Revolução Democrática, onde os próprios limites da representação podem ser superados pela construção de mecanismos de democracia direta.

Também agora na Europa, na América do Norte e no Oriente surgem movimentos de contestação na onda da brutal crise econômica e social causada pela desregulamentação e pela especulação global. É o focinho da toupeira, na metáfora de Emir Sader, surgindo em espaços insuspeitos como as praças do Cairo e Madrid, na Wall Street de Nova York ou na Citi londrina, para questionar o sistema, os partidos e os governos. Se muitas vezes tais movimentos são confusos, é por faltar-lhes direção política dado o vácuo de formulações e de estruturas, seja pelas razões apresentadas anteriormente neste artigo, seja porque os governos autoritários, como no Egito ou na Tunísia, brutalmente haviam sufocado movimentos e agremiações de oposição.

A grande mídia tem promovido certo “escapismo” tecnológico, pelo qual as redes sociais agora ocupam o lugar das antigas formas “de se fazer política“. Uma explicação simplista para os novos movimentos e a busca de distanciar sua imagem contestatória, pela amenização.

Nada mais falso. A Tecnologia da Informação, a internet e as redes sociais tem revolucionado a comunicação humana, mas a atividade política só faz se enriquecer com a descentralização dos meios de comunicação e com o advento de uma “blogsphera” politicamente atuante e progressista. Não são nos aspectos técnicos que residem as novidades que vemos espocar pelo mundo afora. É no ressurgimento da contestação e da crítica progressista frente a uma crise de representação, açodada por um vácuo de lideranças das elites, perplexas com as consequências financeiras e econômicas de seus próprios desmandos.

* Bruno Linhares é membro da Coordenação estadual da DS-RJ.

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