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Estatuto do embrião e bolsa estupro: razões para dizer não

774906Por Lúcio Costa

Em 05 de junho, a Comissão de Finanças e Tributação da Câmara aprovou substitutivo ao Projeto de Lei (PL) 478/2007 que estabelece o Estatuto do Nascituro. Nos termos da proposta é estabelecido que o embrião, chamado na proposta de lei de nascituro, é um ser humano concebido, mas ainda não nascido, aplicando este conceito inclusive a “seres humanos concebidos in vitro”, produzidos por meio de clonagem. Consoante a proposta de lei, todo aquele que causar, culposamente, morte ao embrião/nascituro, poderá ser condenado a pena de um a três anos de prisão.

O projeto proíbe o congelamento, a manipulação ou o uso do nascituro com experimento, com pena de um a três ano de prisão, mais o pagamento de multa. Também poderá ser preso pelo período de um a seis meses aquele que referir-se ao nascituro com palavras ou expressões depreciativas.

Ao partir de uma de compreensão não unânime tanto, nas ciências da saúde quanto, nos terrenos filosófico e religioso, de que o embrião possui status ético, moral e jurídico idêntico ao de ser humano a proposta de lei em questão afronta profundamente o ordenamento jurídico vigente e, particularmente, os direitos garantidos pela Constituição Federal.

O direito a dignidade humana, garantido pela Constituição, não pode ser confiscado a mulher em nome de supostos direitos fundamentais do embrião.Tanto assim que, em variados cenários o ordenamento jurídico brasileiro assentou a primazia dos direitos da mulher face a embriões como, por exemplo, nos casos em que não é punida a interrupção da gravidez quando esta coloca em risco sua vida, decorre de estupro ou, nos casos de anencefalia.

De registrar igualmente que, o projeto de lei em questão não se limita a afrontar violentamente a garantia constitucional de proteção a dignidade humana das mulheres mas que, ao estabelecer que a concepção dá-se in vitro e garantir in vitro direitos a estes embriões inexoravelmente interdita a pesquisa científica das células-tronco embrionárias as quais, como é de conhecimento geral, tem imenso potencial para o tratamento da saúde humana.

A face obscurantista e misógina do projeto de lei 478/2007 ganha perfeita nitidez em seu artigo 12 eis que, o mesmo dispõe que é vedado ao Estado e aos particulares causar qualquer dano ao embrião em razão de ato delituoso cometido por algum dos genitores. De notar que, neste quadrante a singela redação usada na redação do projeto destina-se a tornar mais palatável a sociedade o crime de estupro.

O projeto de lei também prevê que, se for identificado o genitor/estuprador, ele será obrigado a pagar pensão alimentícia. Caso isso não ocorra, nem a mãe tenha condições financeiras para sustentar a criança, caberá ao Estado o pagamento, a chamada “bolsa estupro”.

Em seu artigo 13, a redação do projeto de lei em questão reza que ficam ressalvadas as disposições do art. 128 do Código Penal – possibilidades de aborto legal por “se não há outro meio de salvar a vida da gestante” e “aborto no caso de gravidez resultante de estupro”. No entanto, as disposições acima referidas são inoquas de vez que a proposta de lei em exame tem como objetivo levar a termo o completo desenvolvimento do embrião, constrangendo a mulher ao parto. Vejamos:

O projeto de lei fixa que “o diagnóstico pré-natal é orientado para respeitar e salvaguardar o desenvolvimento, a saúde e a integridade do nascituro” e, não da mulher bem como, dispõe que “é vedado ao Estado e aos particulares discriminar o nascituro, privando-o de qualquer direito, em razão do sexo, da idade, da etnia, da origem, de deficiência física ou mental”. Desta forma, de fato somente restarão às mulheres arcar com o risco a sua vida, suportar o crescimento de um embrião decorrente de estupro para ao final se “assim for da vontade da mãe” decidir-se pela adoção. De marcar que, igualmente aos cenários acima expostos há de agregar-se também as situações como, por exemplo, as de anencefalia, nas quais a mulher será constrangida a levar a termo o desenvolvimento de um embrião sem viabilidade de vida.

Atualmente, o estupro é um crime punido fortemente pelo Estado tanto assim, que é tipificado como crime hediondo. No entanto, dado o texto do projeto, o criminoso estuprador passará a ser candidamente chamado de genitor. Desta forma, a mulher vítima de violência sexual será por força de imposição legal coagida a se relacionar com o estuprador, de vez que a identificação deste traz como consequência lógica a assunção legal a paternidade.

Desta maneira, o projeto de lei em questão garante em primeiro, lugar o direito do estuprador que passará assumir o status de pai e, em segundo lugar, o suposto direito do embrião resultante de violência sexual. À mulher vítima de estupro restará apenas a obrigação legal de suportar tanto, o ônus de uma gravidez resultante de violência sexual quanto, a convivência com o estuprador elevado a condição legal de genitor/pai.

De salientar que, em decorrência do poder parental que acompanha as figuras do genitor e da genitora passará o estuprador a ter direitos e poderes quanto a criação e educação do menor resultante da predação sexual de uma mulher e nascido graças a uma gravidez induzida a ser levada a termo pelo Estado.

Por tudo isso, a proposta aprovada pela Comissão de Tributação da Câmara dos Deputados, afronta a Constituição Federal, é um retrocesso na legislação dos direitos das mulheres e, igualmente acarreta o abrandamento e a naturalização do crime do estupro. Assim sendo, há um conjunto de razões a justificar a rejeição do Projeto de Lei 478/2007 pelo Conselho Nacional de Direitos da Mulher e, a recomendar sua rejeitação pelo Parlamento, o Governo e a sociedade brasileira.

* Lúcio Costa é advogado. 

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