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Feminismo e socialismo na fundação da DS | Tatau Godinho

Cadernos Democracia Socialista sobre Marxismo e Feminismo, publicação editada pela DS.

O feminismo é parte dos debates e da política da Democracia Socialista desde sua formação. Com uma militância formada na luta contra a ditadura, em sua maioria na década de 1970, o surgimento da DS coincide com a formação da segunda onda do movimento de mulheres no Brasil. É o tempo da construção do PT, da ebulição dos novos movimentos sociais, de reorganização independente dos trabalhadores e trabalhadoras, sindical e partidária. Alimentando-se de uma vertente libertária da luta socialista, da crítica forjada nas lutas identificadas com o Maio de 68, de um novo impulso para a elaboração marxista fora das amarras do dogmatismo imposto pelo stalinismo, a elaboração e a intervenção política da DS enfrentaram, desde seu início, o desafio de participar da construção do feminismo como elemento indispensável da luta socialista.

O diálogo internacional fortaleceu e colaborou para a elaboração da visão da DS em relação ao feminismo, das perspectivas de construção do movimento de mulheres, da incorporação do feminismo como parte de nossa visão de mundo, de nossa atuação militante e do nosso projeto de mudança para o país. Um feminismo socialista, enraizado socialmente, auto-organizado e militante, e com o desafio de se construir também por dentro das organizações mistas, disputando seu lugar transformador no interior das organizações populares, dos trabalhadores e trabalhadoras.

A aproximação da DS com a Quarta Internacional-SU se dá no período final dos anos 1970, nos anos de formação da corrente, e os debates junto com a Internacional enriqueciam nossos debates sobre o feminismo, contribuíam para fortalecer os laços com o movimento de mulheres também fora do país. Como parte essencial do crescimento da Nova Esquerda, a partir da década de 1960, questionando o stalinismo, a relação instrumental dos Partidos Comunistas tradicionais com os movimentos sociais, e diante do desafio de compreender a dinâmica das relações sociais que exigiam da esquerda ampliar sua compreensão do sujeito revolucionário, as organizações políticas organizadas em torno da Quarta Internacional-SU se colocaram o desafio de compreender e elaborar sobre as novas mobilizações que pulsavam em um feminismo militante, de esquerda, e que cobravam da esquerda e do pensamento marxista e socialista absorver a luta pela libertação das mulheres como parte de um projeto de mudança revolucionária. Pensar o feminismo como um dos aspectos centrais da renovação do pensamento socialista foi uma das grandes marcas da Quarta Internacional-Secretariado Unificado.

Já final dos anos 1960 e na década de 1970, as militantes da Quarta Internacional-Secretariado Unificado participaram ativamente da formação da Segunda Onda do feminismo. Na França, em particular, com a forte presença da LCR (Liga Comunista Revolucionária), e com força diferente também na Inglaterra, no Estado Espanhol, na Itália, nos Estados Unidos.No Congresso Mundial, em 1979, foi aprovada uma resolução que buscou sintetizar temas centrais desse novo debate, dessa nova luta. Questões que também desafiavam as militantes no Brasil. A importância e a necessidade da auto-organização das mulheres; a ruptura com a ideia dos movimentos como “correia de transmissão” dos partidos e o consequente reconhecimento de sua autonomia; o reconhecimento de que as contradições, e muitas vezes o conflito, presentes nas relações sociais entre mulheres e homens não significava uma oposição à luta de classes; de maneira resumida, que a existência de um movimento de mulheres autônomo, com organizações próprias, com suas pautas e demandas prioritárias não divide a classe.

Por outro lado, em especial do ponto de vista internacional, as tensões também se davam no interior do movimento de mulheres, com os setores do então chamado “feminismo radical” que, mesmo se diferenciando da corrente de corte liberal, recusava a militância nos partidos políticos de esquerda e em organizações mistas da classe trabalhadora. Atenta às diferenças na formação social e nas dinâmicas de classe na América Latina, onde despontara um pulsante setor popular de mulheres não presentes nas organizações de classe de caráter sindical – donas de casa de periferia, ativistas de movimentos sociais urbanos, camponesas e trabalhadoras rurais, mulheres indígenas (em especial no México, América Central e Caribe e países andinos) – nos anos 1980 o Secretariado Unificado mobilizou esforços para fortalecer e compreender a distinção do movimento de mulheres no continente. Surgiram novos debates, novos textos, novas resoluções. Mas isso já é outra parte da história…

O que essa breve recuperação histórica nos mostra é que a trajetória das lutas contra a exploração e opressão da classe trabalhadora está permeada por uma necessária conexão entre socialismo e feminismo. Não é possível reconhecer a história de luta das mulheres sem compreender seu envolvimento na luta geral contra o capitalismo, nem é possível entender a história do socialismo sem considerar a profundidade das mudanças propostas e a força democratizadora das mulheres organizadas nele. Mirando os desafios atuais, essas lutas nos indicam caminhos para um outro mundo necessário. A resolução de 1979 que aqui publicamos, “A revolução socialista e a luta pela libertação das mulheres” é documento fundamental da história de uma esquerda que encarou o desafio de ser sujeito do seu tempo presente.

Leia mais: Especial 40 anos Democracia Socialista.

Tatau Godinho é militante do movimento de mulheres, da DS e da executiva estadual do PT São Paulo.

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