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Honduras vai às urnas mais violenta e pobre desde golpe contra Zelaya

1160409Do Opera Mundi

O povo hondurenho se prepara para escrever outro capítulo de sua atormentada história neste 24 de novembro. Quatro anos atrás, o então presidente Manuel Zelaya foi tirado de sua casa na mira de militares, colocado em um avião e enviado de pijamas para a vizinha Costa Rica. Era o começo de uma crise política, institucional, econômica e social que repercutiu em toda a América Latina e cujos efeitos têm caracterizado e até modelado o atual processo eleitoral.

Honduras se apresenta nessas eleições gerais de 2013 em condições de alarmante fragilidade. Além de ter o mais alto índice per capita de homicídios no mundo e com 80% dos seus 20 homicídios diários impunes, a nação centro-americana encontra-se com sua institucionalidade fortemente debilitada e invadida pelo narcotráfico e pelo crime organizado. A crise econômica e a enorme dívida pública levaram Honduras à beira do abismo e muito perto de ser considerado um Estado falido.

Os efeitos do golpe de 2009 têm sacudido profundamente os estratos mais empobrecidos da sociedade hondurenha, aumentando a lacuna entre ricos e pobres e empurrando sem misericórdia os setores da classe média em direção à pobreza. De acordo com os dados da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), 5.5 milhões de pessoas estão em situação de pobreza – 67% da população —, 3.8 milhões das quais em pobreza extrema.

Uma das questões mais alarmantes que caracterizaram esses últimos quatro anos tem sido a dos direitos humanos. Segundo a recém-constituída Mesa de Análise sobre a Situação de Direitos Humanos, antes, durante e depois das eleições, Honduras estaria vivendo “um estado de emergência nacional em matéria de direitos humanos, em meio a um contexto de crescente militarização da sociedade, no qual os setores políticos e sociais que se opuseram ao golpe estão sendo perseguidos e reprimidos.”

Esta mesma preocupação foi compartilhada por vários senadores norte-americanos, os quais, em mais de uma ocasião, expressaram publicamente sua rejeição aos ataques, em alguns casos mortais, perpetrados contra defensores e defensoras de direitos humanos, assim como contra membros e militantes de partidos políticos. Também exigiram que as autoridades hondurenhas “velem por um processo eleitoral livre, justo e transparente”, e pediram ao Departamento de Estado de seu país uma observação “absolutamente imparcial.”
Processo eleitoral

Quando se considera a situação difícil em que se encontra a nação centro-americana, a um passo da votação deste domingo, não há dúvidas de que a crise gerada pelo golpe de Estado colocou em marcha processos totalmente inesperados.

Pela primeira vez na história de Honduras, 5.4 milhões de hondurenhos poderão escolher entre nove forças políticas, sete candidatos e uma candidata presidencial, para eleger um presidente da República e seus três vice-presidentes , 128 deputados e seus suplentes no Congresso Nacional, 20 deputados e seus suplentes no PARLACEN (Parlamento Centro-americano), 298 prefeitos e vice-prefeitos e 2092 membros dos conselhos municipais.

Além do candidato governista Juan Orlando Hernández (Partido Nacional) e Xiomara Castro (Partido Libre – Liberdade e Refundação), que, de acordo com todas as pesquisas, vão disputar a cadeira presidencial, destas eleições participam os partidos Unificação Democrática (UD), Partido Liberal (PL), Democracia Cristã (DC), Aliança Patriótica Hondurenha (Aliança), Partido Anticorrupção (PAC), Partido da Inovação e Unidade (PINU) e  a Frente Ampla Político-Eleitoral da Resistência (FAPER).

Entre os candidatos presidenciais, cabe destacar a presença do comentarista esportivo Salvador Nasralla, do PAC, do ex-membro da equipe negociadora do presidente de fato Roberto Micheletti, de Mauricio Villeda, do Partido Liberal, e do ex-general Romeo Vásquez Velázques, autor material do golpe de 2009, pelo partido Aliança Patriótica.

Serão as eleições mais observadas da história político-eleitoral do país, com quase 800 observadores eleitorais internacionais credenciados — entre eles 90 da União Europeia, 70 da OEA (Organização dos Estados Americanos) e 14 do Foro de São Paulo —, e uns 15 mil nacionais.

Fim do bipartidarismo

Estas eleições representam também o fim do bipartidarismo, um sistema bem aceito de alternância no poder com o qual o Partido Liberal e o Partido Liberal governaram Honduras por mais de 100 anos. “Já se definiram os dois grandes competidores, que são Juan Orlando Hernández e Xiomara Castro. Dessa forma, cristalizou-se o fim definitivo do bipartidarismo tradicional e proclamou-se o início de uma nova etapa da vida política do país”, disse o sociólogo e analista político Eugenio Sosa a Opera Mundi.

O partido Libre, cuja candidata é Castro, esposa do ex-presidente Manuel Zelaya, se alinha com o braço político do movimento de resistência contra o golpe de Estado, surgido de forma espontânea depois de 28 de junho de 2009.

Com mais de 20 mil coletivos em todo o país — mais de mil somente na capital Tegucigalpa — o partido Libre representa a verdadeira novidade política dessas eleições. “Depois do golpe não paramos de trabalhar um único instante para organizar e capacitar a população politicamente, eleitoralmente e na defesa do voto de todos os cantos do país”, afirmou Reyna Suyapa, coordenadora do MOBACCOHR  (Movimento de Bairros, Aldeias, Povoados e Colônias “Hernán Rosales”, por sua sigla em espanhol).

Segundo ela, tudo o que foi conquistado não teria sido possível “sem o grande trabalho organizado pela FNRP (Frente Nacional de Resistência Popular ) e a participação voluntária de milhares de pessoas que querem uma mudança real no país”, garantiu.

Depois do questionado processo eleitoral de 2009, as autoridades eleitorais, com o apoio dos partidos políticos, mudaram o sistema de contagem e de transmissão de votos e resultados. Em repetidas ocasiões, os magistrados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) garantiram que o mundo vai assistir a uma votação transparente, livre e independente. Os candidatos presidenciáveis até assinaram um acordo comprometendo-se a respeitar o resultado das eleições.

De acordo com a análise de Ana Ortega, especialista em Ciências Políticas, a população escolherá entre dois projetos de país muito diferentes. “Por um lado, temos o candidato governista. Ele representa a velha forma autoritária de fazer política, e vai continuar a concentrar o poder, a aprofundar o projeto neoliberal e de expropriação de terras promovido por Porfirio Lobo, adicionando agora uma forte conotação de militarização”, ressaltou.

Por outro lado, a catedrática menciona o projeto de Castro, que pretende convocar uma assembleia constituinte para criar uma nova Constituição. “Aqui temos um projeto de reconciliação e mudança, que propõe uma refundação pacífica do país por meio de um pacto social entre os diferentes setores da sociedade”, sublinhou.

Mesmo com o entusiasmo gerado na população e do fato de estar à frente em todas as pesquisas, vários analistas políticos concordam que a transição para uma “nova Honduras” será, necessariamente, muito mais lenta do que está sendo projetada na campanha eleitoral do partido Libre.

“Se ganhar as eleições, Castro não apenas não terá a maioria dos deputados no Congresso, mas também vai dar com os demais poderes do Estado e as principais instituições públicas controladas pelo Partido Nacional. Nesse sentido, para que o pacto social seja viável, a candidata do Libre precisará de uma precondição, que é um pacto político com os diferentes partidos no Congresso”, explicou Sosa.

Os grupos de poder

O golpe de Estado de 2009, entre outros elementos, evidenciou muito claramente a existência de um poder atrás do poder. Os setores que se opuseram à ruptura da ordem constitucional falaram de “poderes factuais” que controlam a política e a economia de Honduras.

Esse trágico evento que confrontou a sociedade e as famílias hondurenhas inaugurou uma nova época no que tange a configuração do sistema político e as relações globais de poder.

Segundo Sosa, esta nova conjuntura sócio-política e o surgimento de uma nova força que irrompe no cenário nacional hondurenho estão forçando um rearranjo dos grupos de poder. “Os principais grupos de poder ficaram sem candidato próprio, ao tempo que Hernández representa o capital emergente hondurenho, que se opõe ao oligárquico e tradicional. Nesse sentido, nos encontramos em um processo de reconfiguração e transição que não é apenas político e social, mas também de poder, onde as elites nacionais estão tentando se rearranjar com base na nova realidade”, explicou o sociólogo.

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