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O Brasil e a expansão das políticas de ações afirmativas

Clédisson Júnior *

Passados 10 anos da pioneira experiência que se promoveu por meio de lei, a reserva de vagas para estudantes afrodescendentes (lei 3.708/01) no ensino universitário, hoje já contamos com um número superior a 80 universidades públicas que já adotam algum programa com  este propósito, e este índice vem sendo ampliado cada vez mais.

O processo de expansão das políticas de ações afirmativas para acesso da população afrodescendente no ensino superior é fruto de uma intensa disputa travada no campo ideológico e do direito, na qual os contrários ao sistema de cotas sustentam que a dinâmica da desigualdade no Brasil é explicada pelo baixo posicionamento da população negra na base da hierarquia socioeconômica, não pelo pertencimento étnico-racial. Esse entendimento é defendido por setores conservadores e atrasados da nossa sociedade.

Por outro lado, defensores do sistema de cotas o compreendem como um instrumento tático na recondução do debate sobre a existência do racismo em nosso país, e estratégico no sentido de empoderar negros e negras ao incluí-los nos espaços de formação da elite intelectual e dirigente, tal qual é compreendida a universidade brasileira, derrubando de vez a farsa da democracia racial.

Desafios

Mesmo sendo uma realidade, as políticas de reserva de vagas vêm sofrendo constantes ataques de seus detratores, que atribuem o acesso da população negra aos bancos universitários a “privilégios” somente a “eles” deferidos, posicionando os movimentos sociais progressistas em estado de alerta permanente.

Muitos são os desafios a serem superados na busca pela eliminação do caráter discriminatório da sociedade brasileira, e a universidade cumpre um importante papel nessa disputa. Os afrodescendentes representam cerca de 51% do total da população do nosso país, a construção de novas matrizes epistemológicas que confrontam perspectivas colonizadas na produção do conhecimento científico e políticas públicas permite aos estudantes cotistas  construírem uma trajetória sustentável até a conclusão de seus cursos.

Novas Perspectivas

Historicamente a juventude é tratada como fase conturbada no processo de transição à vida adulta, e constantemente, atrelada a problemas de sociabilização. Contudo, hoje vivenciamos significativos avanços no campo das políticas públicas para a juventude (PPJs) que visam a estabelecer novos parâmetros nas relações do poder público com a mesma, com aberturas democráticas que permitam participação no processo de formulação, implementação e controle social destas políticas tem reconfigurado o tratamento destinado aos jovens.

As políticas públicas de juventude têm a importante tarefa de manter um profícuo diálogo com as políticas educacionais, visando a promover o aprofundamento dos direitos dos(as) jovens que vivem em situação de vulnerabilidade, com destaque especial para a juventude negra.

Mesmo com a universalização do ensino fundamental e com o crescente investimento no ensino médio, a juventude negra, em função dos limites estruturais impostos pela sociedade, sustenta menores índices de escolaridade em relação à juventude branca. Na maioria das vezes, acaba por abandonar os estudos para se inserir no mundo do trabalho, mas mesmo aqueles(as) que conseguem lograr sucesso nesta etapa da escolarização, quando chegam ao ensino superior, ainda encontram enormes desafios.

As políticas de reserva de vagas para afrodescendentes nas universidades devem vir acompanhadas de programas de permanência que permitam aos estudantes cotistas o pleno exercício da vida acadêmica e deverá estar concatenada com políticas públicas que permitam a esses mesmos jovens ter uma existência sustentável fora dos muros universitários.

A verba para assistência estudantil não cobre toda demanda a que se propõe, fazendo com que os estudantes tenham que buscar formas de se sustentarem para completar a sua formação. Na maioria das casos, o desfecho é o abandono da vaga duramente conquistada.

Políticas públicas que dialogam com demandas reais da juventude negra, como o meio passe escolar, a construção de restaurantes populares e universitários, ousado investimento em bolsas de permanência, creches, reforma urbana, reorientação no tratamento dado a juventude negra pelo aparato de segurança pública e o adiamento da entrada no mundo do trabalho garantido pelo Estado, são demonstrações concretas de que estarão sendo ofertadas as condições objetivas para a nossa juventude vivenciar de fato a dignidade que nos é de direito.

* Clédisson Júnior é diretor de Combate ao Racismo da UNE e membro do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial.

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