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Sem perder os passos

Precisamos nos preocupar com a construção de uma instituição realmente representativa da cidadania do Mercosul.

DR. ROSINHA

No centro do Congresso da Argentina está El Salón de Pasos Perdidos. Ao tomar conhecimento do nome, vêm de imediato algumas perguntas: por que esse nome? Quem por ali perdeu os passos?

Muitas são as explicações para o nome do salão. Uma delas diz que seriam os passos “perdidos” das pessoas que vão ao parlamento buscar alguma solução para seus problemas. Na impaciência da espera, caminham de um lado para o outro. Provavelmente, muitos por ali perderam os passos e as esperanças.

Na primeira vez em que entrei no Congresso argentino, conheci o Salão dos Passos Perdidos. Fui até lá participar da minha primeira reunião da antiga Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul. É um prédio histórico e cheio de histórias, assim como também é a cidade de Tucumán, onde se reúne nesta semana o Parlamento do Mercosul.

Na Casita de Tucumán foi declarada a independência da Argentina, em 1816. E é nessa cidade histórica que assumo a presidência do Parlamento do Mercosul. Há várias razões para a defesa da constituição de um Parlamento para a região. Cito apenas duas: a necessidade de segurança jurídica e a de representação da cidadania.

Quanto maior o número de instituições de um bloco, maior é a sua confiança e a segurança jurídica. Mirem-se no exemplo da União Européia, que possui a Comissão Européia, o Conselho Europeu, o Parlamento Europeu e o Tribunal de Luxemburgo. O Mercosul era – e ainda é— carente de instituições.

Um dos primeiros debates que ocorreu para a elaboração do protocolo constitutivo do Parlamento do Mercosul foi sobre o seu papel: um parlamento para representar o quê? Parece simples e óbvio que um parlamento é constituído para representar o povo e, assim, definimos no artigo primeiro do Protocolo: “O Parlamento é o órgão de representação de seus povos, independente e autônomo, que integrará a estrutura institucional do Mercosul”.

E, para que consiga cumprir com o desígnio acima, estabelecemos que o “Parlamento estará integrado por representantes eleitos por sufrágio universal, direto e secreto, conforme a legislação interna de cada Estado-Parte”.

Na institucionalidade do Mercosul, os Estados-Parte (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) estão representados no Conselho do Mercado Comum. Porém, este conselho não representa o conjunto das forças políticas presentes e atuantes na região. Nesta instância de representação, os cidadãos comuns estão ausentes. Dessa forma, as normas produzidas pelos órgãos da integração carecem de legitimidade, uma vez que não são suficientemente debatidas pela sociedade, e tampouco pelos parlamentos nacionais.

Aos parlamentos nacionais cabe a aprovação dos tratados. Mas isso não sana a deficiência do processo. Não corrige a deficiência porque nem todos os tratados internacionais devem ser submetidos ao crivo parlamentar e, se submetidos, não há possibilidade de alteração.

Cria-se, assim, a necessidade de um espaço (parlamento) destinado ao debate, pelos cidadãos, das normas em negociação nos órgãos do Mercosul. Tal debate caberá ao Parlamento do Mercosul. Também caberá a ele a construção da cidadania do bloco.

Sob a égide do atual protocolo, a representação cidadã no Mercosul ainda é falha. O atual número de parlamentares –18 por país – deixa o Brasil sub-representado. Nos seis meses em que presidirei o Parlamento do Mercosul, minha prioridade será construir uma nova proporcionalidade cidadã.

Defendo que o país seja representado por 75 parlamentares, com uma média pouco superior a dois representantes por unidade da federação. Vale lembrar que os parlamentares do Mercosul serão eleitos de forma direta no Brasil em 2010.

Assim como o Congresso argentino, o Palácio Legislativo do Uruguai também tem seu Salón de los Pasos Perdidos, mas sobre este não ouvi nem li qualquer explicação.

No momento em que estamos construindo física e politicamente o Parlamento do Mercosul, precisamos, mais do que nunca, nos preocupar com a construção de uma instituição realmente representativa da cidadania do Mercosul. Uma instituição através da qual, tendo ou não um Salão dos Passos Perdidos, possamos, juntos com os cidadãos e cidadãs, construir a integração e a cidadania, sem perder os passos na impaciência da espera.

Dr. Rosinha, médico, deputado federal (PT-PR) e membro da Coordenação Nacional da Democracia Socialista.

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