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Tendência Democracia Socialista: Identidade política e programática, organização e construção

1. A Democracia Socialista é uma tendência do Partido dos Trabalhadores. Ela organiza militantes do PT, em acordo com o direito de tendência do partido, para lutar pela sua construção como um partido socialista, democrático, internacionalista, feminista e anti-racista, eco-socialista, defensor da ética pública e do republicanismo; o que implica, atualmente, numa plataforma pela reconstrução/refundação socialista do PT.

2. A Democracia Socialista completa, nesta VIII Conferência Nacional, o processo de unificação com as correntes Construção: Democracia e Socialismo, Alternativa Socialista, Movimento Socialista e outros agrupamentos petistas. Somos um coletivo em torno a um projeto estratégico para o partido com referências programáticas que definem nossa identidade. A construção da tendência é um processo combinado com a construção do PT; é fruto de uma história de contribuições essenciais à construção do PT, que reafirmamos nesta Conferência.

3. Essa história e os debates em curso hoje atualizam referências fundamentais da nossa identidade como corrente petista:

a) a concepção de democracia socialista, expressão de uma visão radicalmente democrática da superação histórica do capitalismo pelo socialismo. Ela advém da nossa leitura crítica das experiências de transição socialista (centradas no regime de partido único, na fusão do Estado com o partido, na ausência de desenvolvimento da auto-organização e da democracia direta), das experiências contraditórias e, muitas vezes, limitadas de superação do neoliberalismo (em particular, na nossa América e no Brasil) e das experiências de participação popular e democracia participativa em nossos governos no Brasil (tanto pelos seus aspectos virtuosos como pelos seus limites).

A luta pela democracia participativa deve se fazer presente em todos os momentos da atuação política dos socialistas; no exercício dos governos, nos parlamentos e movimentos sociais, devemos impulsionar a ampliação da participação direta na condução do Estado e organizações sociais. Para os socialistas, a defesa da participação e do controle popular tem, portanto, um alcance estratégico, pois permite articular as reivindicações dos oprimidos, a demonstração dos limites da sociedade burguesa e da democracia realmente existente em nosso País à luta por uma sociedade socialista.

O socialismo deve ser, ele próprio, uma construção democrática e pluralista, realizada pelas maiorias através da participação popular. A democracia participativa é um processo de apropriação e transformação do poder pelas maiorias. É também um processo de superação de um vício comum às experiências de governos de esquerda, que é o substitucionismo, a desconfiança da participação popular, a idéia de que o partido resolve tudo e de que a conquista de governos é um fim em si mesma.

Não há socialismo sem democracia e não há democracia sem socialismo!

b) a concepção internacionalista, que expõe uma visão radical de superação do capitalismo como um processo universal. Ela advém da crítica ao conceito e à experiência do outrora chamado “socialismo num só país” e das experiências, sobretudo atuais, de construção de movimentos sociais e políticos internacionalistas. Ela se insere nos marcos das relações internacionais do PT e busca desenvolver, de forma plural, uma perspectiva socialista e democrática para o internacionalismo nos processos reunidos em torno ao Fórum Social Mundial, ao Foro de São Paulo e às demais experiências de esquerda, em particular na América Latina.

O debate sobre um “internacionalismo para o século XXI” deve recuperar os valores e a herança positiva das quatro internacionais, mas também deve fazer um balanço dos seus erros. Deve identificar os novos atores hoje existentes, assim como aqueles que sobreviveram à crise do socialismo real e que buscam um novo espaço de organização. Deve, sobretudo, ser capaz de impulsionar um internacionalismo aberto e plural, estreitamente vinculado às lutas em curso. Ao mesmo tempo, deve estar aberto a compreender e dialogar com uma diversidade de caminhos e tentativas de processos de transição e de resistência nacionais (e mesmo regionais). Uma discussão pertinente é a de qual seria o grau desejado de internacionalização e coordenação do desenvolvimento pós-capitalista – o que, necessariamente, inclui uma crítica frontal à globalização capitalista, e, que, portanto, exclui uma solução aritmética como mudar apenas o comando e o sinal para termos uma “globalização socialista”.

Somos de uma tradição do movimento socialista que tem no internacionalismo um de seus valores estratégicos constitutivos. Nossa luta deve ter objetivos comuns no mundo todo. A fraternidade universal dos povos é um valor a ser perseguido. Um projeto pós-neoliberal, para ser coerente, necessita ser socialista e internacionalista.

c) o feminismo e o combate a todas as formas de discriminação e opressão. Nossa concepção socialista incorpora a compreensão de que não há socialismo sem feminismo, nem feminismo sem socialismo. A luta contra a opressão das mulheres e combate às práticas machistas, inclusive na esquerda, é parte de nosso programa e dos desafios cotidianos para nossa militância. Assim como é parte de nosso projeto o combate a todas as formas de opressão: a DS reconhece e reafirma a importância da construção do movimento de mulheres, bem como do movimento negro, do movimento GLBT. É a partir dessa auto-organização que se garantirá um efetivo movimento de liberação e se constituirão como parte do sujeito histórico de transformação.

d) a luta anti-racista, com políticas de promoção de igualdade racial, e de autodeterminação dos povos indígenas, com demarcação de suas terras, combinam uma visão de longo prazo para a construção de uma sociedade socialista e uma nova civilização brasileira pluriétnica, e orientam uma ação política no presente.

e) o ecossocialismo integra nossa concepção socialista. Ele advém das lutas contra a destruição permanentemente produzida pelo capitalismo e também da ausência ou limitação de uma dimensão ambientalista nos processos de transição socialista. Tem sua origem também na crítica ao culto ao progresso, que aniquila as indagações fundamentais de para quê, para quem, como e a qual custo esse progresso se desenrola. Afirmar como eixo estruturante de nossa práxis política a questão do ecossocialismo é estabelecer uma agenda pública e possibilidades de lutas sociais alicerçadas em novos marcos civilizatórios capazes de pôr em xeque o modelo de produção capitalista.

Mais do que buscar novos estilos de vida alternativos, objetiva-se alterar as relações de força nas formas de produzir e consumir em nossa sociedade, imprimindo, com isso, um fazer revolucionário em nossas práticas e valores partidários. Superar modelos produtivistas, ações danosas ao meio ambiente e à vida humana, fundam-se na qualidade de constituição de uma práxis sócio-política engendradora da relação do socialismo com a ecologia, que paute nossa atuação militante na tendência, no PT, nos movimentos sociais e na gestão pública.

O ecossocialismo é, acima de tudo, um projeto consistente para a disputa de rumos na sociedade, que agrega em si mudanças no mundo do trabalho, no uso de técnicas e tecnologias inovadoras e sustentáveis, de valorização dos saberes tradicionais, de gestão democrática dos recursos naturais e do poder público. O acúmulo programático de nosso projeto socialista de tendência e partido é também o acúmulo programático de incorporação em sua práxis dos valores ecossocialistas de elaboração e concretização de um novo Estado, de outras práticas societárias e de um socialismo renovado e verdadeiramente revolucionário.

f) a defesa da ética pública e do republicanismo expressa uma parte essencial da resposta necessária aos descaminhos recentes do partido e às práticas de corrupção generalizadas no nosso país. Essa dimensão é inseparável da concepção de democracia socialista e de uma concepção de partido que luta pela conquista do poder político não para si, mas para o exercício da democracia republicana participativa.

A defesa da ética pública não é apenas combate à corrupção, mas também compromisso com a utilização dos recursos públicos para atender demandas da população. Nossa defesa da ética pública e nossa prática do republicanismo devem marcar a ação de nossos militantes nos mandatos eletivos, quer seja nos parlamentos, quer seja nos executivos. Nosso compromisso com os valores socialistas nos remete à construção da democracia participativa e a uma gestão democrática de coisa pública, assim como nos coloca a necessidade de combater a corrupção que grassa na sociedade burguesa e aquela que surge no interior das organizações e nas experiências que se reivindicam do socialismo.

Os movimentos socialistas não são isentos de deformações e de processos de corrupção. A integração ao Estado e à sociedade burguesa são riscos permanentes e significam perda da perspectiva socialista. Construir uma crítica no interior do nosso próprio movimento, enriquecer nosso programa com esse combate, são armas contra o liberalismo e a degeneração.

g) a reconstrução/refundação socialista do PT, plataforma que recupera os anseios socialistas da fundação do PT: um partido de militantes e combatentes sociais pelo socialismo. E que busca atualizar essa concepção de partido à luz da crítica ao desenvolvimento organizacional do PT desde a “contra-reforma” estatutária que centralizou administrativamente o partido e que tentou dissolver o conceito de partido militante e substituí-lo pelo de “máquina” eleitoral.

O PT nasceu para ser completamente diferente dos partidos políticos tradicionais e também de partidos progressistas que preenchem nosso espectro político-eleitoral. Enquanto essas agremiações foram formadas somente para disputar e exercer o poder governamental, o PT surgiu como expressão política de um vasto conjunto de movimentos sociais, entidades de classe, correntes ideológicas para promover uma revolução social que encaminhe a sociedade brasileira a um futuro socialista.

O PT viveu uma crise de corrupção ética e programática, não apenas conjuntural e não apenas decorrente de desvios comportamentais ou de meros abusos de poder e de confiança. Decorreu de um modo de construção eleitoralista e adaptada ao Estado burguês, de afastamento das organizações de base e do mundo do trabalho. Sua superação não se dá apenas pela mudança da direção e da política, precisa revolucionar sua estrutura de poder e reencontrar seu programa socialista.

Refundar o PT significa restabelecer a ligação vital do partido com os movimentos sociais, com os sindicatos, as cooperativas e associações de trabalhadores, hoje comprometida pela insuficiente presença dos seus representantes nas instâncias de direção do partido. Refundar o PT significa devolver o poder de decisão dentro do partido aos militantes de base, que, em sua maioria, representam essas lutas. E instituir no partido um regime financeiro controlado pelos petistas e dependente, predominantemente, de suas contribuições. Além de impedir a dependência, por parte do PT, do dinheiro fornecido por interesses estranhos, quando não opostos, às aspirações dos trabalhadores em luta. Isso também significa restabelecer a vocação socialista do PT.

h) a intervenção socialista na experiência do segundo mandato do governo Lula, com amplas possibilidades de superação do paradigma neoliberal, que coloca de forma histórica e inédita para a esquerda brasileira, em escala nacional e internacional, as tarefas de combinar o enfrentamento a partir de reformas sociais, democráticas e nacionais com valores e dinâmicas na perspectiva do socialismo democrático. Concebemos esta experiência, então, como parte de um largo período de lutas democráticas pelo socialismo, na qual devem se inscrever revoluções de valores que organizam a vida social, intensificação e aprofundamento das formas de participação, auto-gestão e controle social.

4. Junto com a reconstrução do PT, é preciso resgatar o sentido ideológico da militância socialista hoje. Nosso país, em conjunto com a América Latina, vive um momento de nova politização popular. Vem-se formando uma consciência popular e democrática que clama por um PT socialista, democrático e de massas, renovado em suas perspectivas. Um PT que exerça o seu papel libertário e transformador não apenas no Brasil, mas que seja impulsionador de novas experiências na América Latina e no mundo. Sem dúvida, essa é uma tarefa que somente o PT pode, hoje, desempenhar.

Para que a nossa tendência contribua com esse processo, é preciso que ela própria seja um espaço de militância, de práticas coletivas e de respeito às decisões democráticas do partido e àquelas que toma para intervir nos seus debates, de elaboração política e compromisso com a prática da transformação socialista. Para que tenha coerência e força na defesa de suas propostas para o partido, é preciso que a tendência coloque em prática o que defende. Isso nem sempre é uma tarefa fácil, pois a tendência não é um corpo separado do partido – e, portanto, não é alheia aos problemas que, como um todo, este sofre – mas esse é um desafio permanente na construção combinada do partido e da tendência. A utopia socialista não se refere “apenas” à sociedade que queremos, mas também, às maneiras de lutar por ela.

Esse sentido geral da nossa militância é fundamental no atual momento de reconstrução do PT. Ele deve ser imprimido na ampliação do partido para a juventude, movimentos sociais e para amplas parcelas da população que despertam para as lutas políticas. É fundamental conquistar uma nova geração de militantes socialistas para o PT.

5. A tendência Democracia Socialista se estrutura em coletivos de participação e coordenação. A participação na tendência é aberta aos militantes do Partido dos Trabalhadores e implica em compromissos militantes com a construção do PT e com a construção da tendência. Esses compromissos incluem a contribuição regular com o PT e participação em uma de suas instâncias; a contribuição regular com a tendência, conforme as definições de suas Conferências Nacionais e Estaduais, e a participação em um de seus espaços de discussão e coordenação. É fundamental desenvolver uma militância voluntária coordenando ou participando de um núcleo de base do PT ou setorial.

A DS realiza Conferências Nacionais para a tomada de posições gerais, e estas elegem sua Coordenação Nacional. Nos âmbitos estadual, municipal e setorial, igualmente, desenvolve-se esse processo organizativo.

Nosso jornal, Democracia Socialista-EmTempo, intervém nos debates partidários. A sustentação e difusão do jornal fazem parte dos compromissos militantes da tendência.

A formação socialista não decorre apenas da participação política cotidiana, depende de um esforço específico de conhecimento da nossa realidade e das reflexões sobre a luta pela sua transformação. Em conjunto com o esforço partidário, buscando contribuir com ele, a tendência também realizará processos regulares de formação, como as escolas regionais, a publicação de materiais de formação e a organização de cursos de formação de base.

6. Nesta VIII Conferência Nacional da Democracia Socialista, a conclusão da unificação entre diversas correntes colocará em novo patamar o esforço de diálogo e de novas possibilidades de unificações com agrupamentos, personalidades e dirigentes petistas que se aproximam das perspectivas que propomos. A própria Conferência e o processo de elaboração das nossas contribuições ao III Congresso são momentos importantes desse processo, promovendo uma maior homogeneização política entre nós, e viabilizando nossa intervenção concreta nos rumos do Partido dos Trabalhadores.

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