Nessa data, que marca a luta e as conquistas do povo negro do nosso país, gostaríamos de aproveitar a oportunidade para falar diretamente com e sobre as trabalhadoras domésticas, categoria majoritariamente constituída de mulheres negras.
Devido à ausência de dados precisos e ao sub registro, decorrente da elevada informalidade, é difícil saber o número exato de empregadas domésticas no país. Segundo dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) de 2010, divulgados pelo Dieese em abril de 2011, os trabalhadores domésticos remunerados somavam 7.223 mil pessoas. É o segmento que garante a inserção ocupacional de cerca de 17% das mulheres que trabalham. Segundo informação do Parecer da Comissão Tripartite Convenção 189 Recomendação 201 da OIT “uma em cada seis mulheres ocupadas no mercado de trabalho está no trabalho doméstico. As mulheres correspondem a 93% do total de trabalhadores domésticos – proporção que não variou ao longo da década – e as mulheres negras a 61,6% do total de mulheres ocupadas nesta profissão”.
A PED de 2010 constatou que proporção de negras foi predominante em praticamente todas as regiões metropolitanas. A exceção da região de Porto Alegre, onde a população negra é bem menor a presença de mulheres negras ocupadas nos serviços domésticos foi de 26,5%. Na região metropolitana de São Paulo, essa proporção sobe para 48,9%. Nas demais regiões metropolitanas as mulheres negras ocupadas são maioria no trabalho doméstico: Belo Horizonte são 71%; no Distrito Federal 79,3%; Fortaleza 76,7%; Recife 80,9% e Salvador 96,7%. (DIEESE, 2011).
Embora o trabalho doméstico seja fundamental para o funcionamento geral da economia, não é reconhecido socialmente. Como atividade majoritariamente realizada por mulheres e negras, é considerada uma habilidade e uma responsabilidade natural das mulheres e portando subvalorizado. As pessoas que atuam nessa categoria profissional não têm os direitos definidos em lei para os demais trabalhadores e trabalhadoras.
Apesar dos avanços sociais, econômicos e políticos obtidos pelas mulheres, no que se refere ao compartilhamento de responsabilidades pelo trabalho doméstico e de cuidados a situação permanece praticamente inalterada.
Os números da discriminação
Nenhuma categoria profissional expressa tão claramente a discriminação de gênero e raça no mercado de trabalho brasileiro como o trabalho doméstico.
Somente 26,8% destas trabalhadoras tem carteira assinada. Entre as negras, o nível ainda é de 25,2%, enquanto que dentre as brancas, 30,5%.
Outro indicador de desigualdade é o rendimento. Em 2008, o rendimento médio mensal das trabalhadoras domésticas correspondia a 40,2% daquele recebido pelas mulheres em outras categorias. O rendimento médio mensal era de R$ 523,50, ao passo que entre aquelas sem carteira caia para R$ 303,00 e as trabalhadoras negras recebiam, em média, apenas R$ 280,00 (PNAD/IBGE, 2008).
A escolaridade entre as trabalhadoras domésticas está aumentando: passou de 4,5 anos de estudos, na média, para 5,9, mas ainda é uma média muito baixa se compararmos com a média nacional. Entre aquelas com mais de 60 anos, a média é de apenas três anos de estudo.
A jornada média “oficial” é de 36,5h, no entanto, este número pode estar fortemente influenciado pelo aumento da quantidade de diaristas. As diaristas são cerca de 26,5% do total de trabalhadoras domésticas e possuem renda média 17% superior às mensalistas. Em que pese algumas vantagens em termos de autonomia, a principal desvantagem é o nível de proteção social inferior. Somente 14,3% tinham carteira de trabalho assinada e 20,7% contribuíam para a Previdência Social em 2008.
Além da precariedade enfrentada nas condições de trabalho, o assédio sexual e assédio moral são outras formas de discriminação presentes no cotidiano dessas milhares de mulheres que têm no emprego doméstico sua forma de sobrevivência.
A um passo da conquista
A primeira associação profissional de trabalhadoras domésticas foi fundada na cidade de Santos (SP), em 1936. Em nível federal, em1997, foi criada a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD), que logo em seguida, em 1998, filiou-se à Central Única dos Trabalhadores (CUT) e à CONTRACS/CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Comércio e Serviço).
No entanto permanece como um compromisso da CUT promover a organização das trabalhadoras domésticas, contribuindo para que sejam sujeitos dos processos de luta por igualdade de direitos e por melhores condições de vida e trabalho.
Neste Dia Nacional da Consciência Negra reafirmamos nosso compromisso com sua luta e nos somamos aqueles e aquelas que lutam pela garantia dos direitos dessa imensa categoria. A CUT participa da Campanha 12 por 12, promovida pela CSI/CSA, para que em 2012, 12 países ratifiquem a Convenção 189. A Comissão Tripartite, da qual a Secretaria Nacional da Mulher Trabalhadora da CUT faz parte, já aprovou o relatório pela ratificação da Convenção 189.
Nesses próximos dias teremos o compromisso, como parte da agenda de combate à discriminação e ao preconceito de gênero e raça aprovada no 11º CONCUT, pressionar o Congresso Nacional para que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 478/10, que iguala os direitos das trabalhadoras domésticas aos demais trabalhadores seja aprovada por dois terços dos/as parlamentares da câmara e do senado.
Com a alteração do parágrafo único do artigo 7º da Constituição os trabalhadores e trabalhadoras domésticos terão direitos essenciais tais como regulamentação da jornada de trabalho, recebimento de hora extra e descanso semanal garantidos pelo Estado. Hoje, empregadas domésticas têm direito ao décimo terceiro salário, férias remuneradas de 30 dias após 12 meses de trabalho e ao recolhimento da contribuição à Previdência Social (INSS).
A luta das trabalhadoras domésticas não é uma luta apenas de mulheres e negros, é um compromisso que deve ser assumido pelo conjunto da classe trabalhadora, compromisso esse que implica em apoio às lutas e organização sindical desses trabalhadores e trabalhadoras.
* Rosana Souza é Diretora Executiva da CUT
Rosane Silva é Secretária da Mulher Trabalhadora da CUT