A campanha eleitoral tem possibilitado aos porto-alegrenses conhecer políticas públicas e iniciativas recentes da atual Administração. O atual prefeito e candidato à reeleição orgulha-se em apresentar as “novas conquistas” que a população estaria desfrutando.
A propaganda dá ênfase aos ônibus elétricos, que começaram a circular em plena campanha eleitoral: modernos, silenciosos, não poluentes e climatizados. É a sinalização do futuro, Porto Alegre na vanguarda e “sem aumentar a tarifa”. Ora, a realidade não é bem essa. A tarifa está entre as mais caras das grandes cidades. Além disso, o governo não publica que o subsídio às empresas pelo Orçamento deste ano é de R$ 132 milhões. E quem controla a venda antecipada, a caixa de compensação e o sistema não é mais a EPTC, mas os empresários. Quem define estes R$ 132 milhões? É muito dinheiro para quem destinou ao “Orçamento Participativo” atual apenas R$ 20 milhões.
Aliás, o governo municipal não acabou de entregar a Cia. Carris para uma empresa privada? A Cia. Carris era um instrumento poderoso aos governos anteriores para conhecer efetivamente uma planilha de custos e estabelecer, com outros indicadores, o valor da tarifa. Quem hoje é o fiador de que R$ 132 milhões é pouco ou muito? O prefeito deveria justificar aos munícipes esse subsídio milionário diante de uma tarifa tão cara.
O verbo entregar não é um exagero, pois o patrimônio da Cia. Carris foi passado para a Empresa Viamão por R$ 109 milhões, em leilão com um único concorrente, conforme noticiado pela imprensa. Todo patrimônio, imóveis, frota de uns 250 ônibus, instalações e a outorga de duas dezenas de linhas monopólicas, tudo para pagar em DEZ ANOS, em 120 suaves prestações mensais, atravessando os próximos três governos que Porto Alegre viverá.
E, durante o primeiro ano de vigência do contrato, se o imóvel ocupado até há pouco pela Cia. Carris voltar ao município, o preço do negócio cai para R$ 40 milhões, pois os imóveis da Cia. Carris foram estimados em R$ 69,7 milhões, visivelmente abaixo do mercado.
Ou seja, o neoliberalismo é pródigo em criar capitalistas sem capital. As 120 suaves prestações serão pagas com a receita da empresa “vendida”. O balanço da empresa privatizada apresentava uma previsão de faturamento, em 2024, na ordem de R$ 150 milhões.
Mas voltemos aos ônibus elétricos, tão bonitos e modernos na propaganda eleitoral. O atual governo comprou 12 ônibus elétricos pagando por eles R$ 38 milhões, conforme notícias de ZH nos dias 19 e 20 de agosto. Mais de R$ 3 milhões por veículo, três vezes mais que um ônibus convencional.
Sem a Cia. Carris pública, já entregue, inexplicavelmente, o governo destinou para efeito-demonstração (ou propaganda?) os veículos elétricos aos consórcios privados que atuam nas bacias radiais da cidade. Sem ônus ou custos, conforme a mesma matéria do jornal ZH que conclui “serão descontados das empresas nos próximos reajustes de passagens”. Grande negócio. Não houve nenhuma correção ou desmentido da matéria publicada por parte da Prefeitura e nem juízo de valor pela imprensa.
Certamente, o prefeito candidato vai dizer que está tudo legal, que a Câmara Municipal, por maioria, autorizou a venda da Carris e mesmo sem empresa pública de transporte coletivo, é necessário fazer experiências e testar novas tecnologias.
Os vereadores da oposição votaram contra a venda da Carris e entraram com representação no Ministério Público de Contas. Que vereador, que empresário, que cidadão se fosse proprietário da Cia. Carris, em sã consciência, faria este negócio?
Os R$ 38 milhões pagos por 12 ônibus elétricos (os 250 ônibus da Carris foram avaliados em R$ 40 milhões) não seriam mais urgentes e prioritários para fazer e acelerar os consertos e manutenção do sistema protetivo contra as enchentes e da recuperação da drenagem urbana visivelmente destruída na maior parte da cidade? Ou da urgente recuperação dos serviços de saúde, educação e assistência social também atingidos pela inundação em muitos bairros da capital?
Enfim, bons temas para refletir e agir neste momento em que discutimos e podemos decidir o futuro da cidade.
Porto Alegre, setembro de 2024.
Raul Pont é Ex-Prefeito de Porto Alegre.
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