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A greve na educação e a conjuntura pós-neoliberal

261030Por Bruno Moreno

A deflagração da greve dos docentes das universidades federais já é a mais importante desde o ano de 2001 e vem demonstrar uma mudança de paradigma das reivindicações, que muito se diferencia das realizadas sob os anos FHC. A característica desta greve marca fortemente a nova conjuntura que se abriu na sociedade brasileira e, em especial, na educação pública.

É certo que a universidade passou a ter um novo papel no desenvolvimento do projeto educacional brasileiro a partir de 2003 e mais ainda a partir de 2007. A lógica de que se deveria priorizar o investimento na educação básica para depois se pensar na universidade foi aadotada durante a década neoliberal no Brasil, e teve como resultado o sucateamento tanto do ensino básico quanto do ensino superior públicos.E por outro lado, a expansão desenfreada das universidades privadas.

Com a mudança desta lógica, passando a universidade pública a ser considerada como essencial para o desenvolvimento do projeto de educação no Brasil, tendo centralidade inclusive para a formação de novos professores qualificados; e a aplicação de mais recursos e projetos específicos para a educação básica, a educação pública pode contar com novos avanços. Passou-se a adotar a prioridade de desenvolver universidade e educação básica em conjunto. O resultado disto nas universidades públicas foia completa mudança de paradigma, passando-se de um cenário em que se preocupava com o pagamento das contas de luz e água para se discutir os projetos de expansão das universidades federais, principalmente através do Plano de Desenvolvimento da Educação, do REUNI e da criação do Banco de Equivalência, que permitiu aumentar as vagas de professores efetivos, especialmente com dedicação exclusiva.

Só a UFRJ, maior universidade federal do país, teve seu orçamento mais do que decuplicado (aumentado 10 vezes) na última década. No mesmo período, o crescimento doingresso nas Instituições Federais de Ensino Superior foi de 110,6%, sendo que de 2009 para 2010 foi o segundo ano consecutivo no qual as IFES lideraram o crescimento anual do número de matrículas(11,8% – 1,7 vezes maior do que o número nas instituições privadas).

Com este projeto de desenvolvimento que certamente impõe a valorização do público sobre o privado, a luta pela conquista de novos direitos passa a ter uma centralidade que havia perdido. Se na conjuntura neoliberal lutava-se para manter os direitos conquistados em décadas anteriores, travando-se uma verdadeira luta de entrega de anéis para se preservar os dedos, é certo que atualmente o avanço das lutas se dá por novas conquistas.

Isto não significa que não haja flagrantes contradições, como com a criação do FUNPRESP – Fundo de Previdência dos Servidores Públicos, mas quer dizer que no todo, atualmente, os avanços foram mais relevantes e que se vislumbra conseguir ainda mais.

A pauta de reivindicação dos docentes é clara: além de melhores condições de trabalho, querem um novo plano de carreira que lhes permita gozar plenamente e sem esforços extras, as possibilidades que sua carreira lhe possa oferecer. Ou seja, atingir seu topo sem um esforço hercúleo. É importante dizer ainda que leis anteriores, como a Lei 11.784/2008 já tinham lhes trazido novas conquistas, como a retribuição por titulação em suas remunerações, a gratificação de magistério superior e a incorporação da gratificação por atividade executiva, que correspondia a 160% do vencimento básico, ao mesmo. Mesmo a controversa MP 568 (que é prejudicial aos médicos)trouxe pequenos, mas novos ganhos e garantias de direitos a enorme maioria dos professores. Os demais servidores das IFES já se juntaram a este movimento e os docentes e servidores do Ensino Básico Técnico e Tecnológico assim também deverão fazer, o que aproxima o movimento para a assunção de um caráter de greve da educação e pela educação, como um todo.

E esta luta por novos direitos não se limita somente ao movimento grevista na rede pública federal. As greves e mobilizações municipais e estaduais pela reivindicação do cumprimento do piso nacional do magistério também demonstram que evidentemente tal luta só é possível porque fora criado um novo direito que lhes dá nova guarida.

Junto a todo este movimento pela valorização da educação e de reivindicação de novos direitos,passa a cumprir papel essencial o movimento estudantil, que garante a amplitude e universalização da pauta, principalmente através da entidade que efetivamente possui caráter nacional, a UNE, e que encaminha a discussão para a questão de maior importância para a educação no momento: garantir 10% do PIB-Produto Interno Bruto aplicado em educação. É uma pauta de caráter universal, que é diretamente comum a estudantes, professores, técnicos, reitores, da rede federal, estadual e municipal, assim como também da rede privada. E por ser universal não quer dizer que não seja uma reivindicação específica, concreta e plausível.

Se este bonito movimento que se desencadeia conseguir se expandir nas próximas semanas e assumir um caráter concretamente público e universal terá sido não só um marco para referenciar a conjuntura pós-neoliberal que presenciamos no momento, mas também para demonstrar que os movimentos sindical e estudantil, se bem articulados, garantem ainda uma forte mobilização social para além de suas questões corporativas.

* Bruno Moreno é advogado Sindical e membro da Coordenação Estadual da DS-RJ.

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