Participação popular e agenda positiva são indispensáveis para retomada da esperança. Raul pont analisa dificuldades do governo e afirma necessidade de construir canais de participação popular.
Raul Pont
Vários projetos que tramitam no Congresso Nacional revelam a dificuldade de aprovar iniciativas do nosso governo. Demonstram a pouca coesão programática e a escassa fidelidade de parte das bancadas aliadas. Ou então, o preço cobrado para o apoio é muito elevado e a perda de espaços ministeriais, mais cedo ou mais tarde, desqualificará, pela heterogeneidade, os objetivos que possuíamos e a expectativa dos eleitores quanto ao nosso governo.
A opção pela busca de governabilidade e sustentabilidade governamental através de alianças no Congresso responde ao resultado eleitoral que nos deu uma bancada de menos de um quarto da Câmara Federal, considerando, inclusive, nossos aliados eleitorais. Fruto do sistema eleitoral vigente, os 52 milhões de votos na candidatura Lula – Alencar não se expressaram no Legislativo, ainda que o PT, individualmente, tenha alcançado a condição de maior partido do país, na Câmara e nas Assembléias.
Essa estratégia aliancista teve o apoio e a legitimidade do Partido e foi aprovada em suas instâncias por larga maioria. Isso não impede que a avaliemos permanentemente à luz das experiências e do desenrolar do mandato que caminha para completar seu segundo ano.
Areia movediça
A “emenda paralela” à Previdência, em tramitação, a desfiguração da ainda inacabada reforma tributária, a retirada da urgência da reforma política e o comportamento dos aliados na questão da “M. P. dos bingos”, para ficar nos casos mais conhecidos, demonstraram que esse não é o melhor terreno para travar a luta política e aprofundar a relação com a sociedade, principalmente com o campo democrático, popular e sindical que foi a base da nossa vitória.
A tendência dessa estratégia nos torna, crescentemente, reféns de instituições em que somos minoria e estão constituídas para serem conservadoras e excludentes da participação popular. Não possibilitam que a cidadania e os movimentos sociais vivam os problemas e as contradições, tomem consciência e possam ter incidência na busca de soluções.
Num país como o nosso, onde a democracia plena e a experiência político-partidária ainda engatinham, a não participação e a desinformação conduzem, rapidamente, para a frustração e a desesperança. O caminho para a desilusão e a busca imediatista de outra alternativa, de outra saída é muito rápida e possível. Se a isso somarmos segmentos dirigentes de movimentos sindicais e sociais, setorialmente descontentes, o cenário de legitimidade e de hegemonia que qualquer governo almeja fica prejudicado.
Descentralizar para fortalecer
A busca de incorporação e ampliação do debate na experiência do Plano Plurianual foi insuficiente e tímida. Nossas mais ricas experiências de gestão local e regional mostram que o sucesso das nossas administrações está na razão direta da nossa capacidade de incorporação dos movimentos sociais na gestão publica. Não precisamos, nem devemos, abdicar das experiências programáticas e dos valores incorporados de democratização e descentralização em nossos governos.
Sem a presença ativa e protagonista dos movimentos sociais e da cidadania – com instrumentos de decisão e construção conjunta das políticas públicas –, ficamos à mercê de instituições e de forças políticas que, por sua lógica e interesses sociais a defender, nos levam ao isolamento e à derrota.
Necessitamos, com urgência, construir canais de participação popular, direta e com poder de decisão em nosso governo. Experiências como o Orçamento Participativo e a criação, o fortalecimento e a autonomia dos conselhos setoriais para formularem políticas públicas são o caminho para a reversão positiva da relação do governo com a sociedade. A essa ousadia de inovar, de criar novos mecanismos de participação popular no governo federal, impõe-se uma agenda positiva que responda, efetivamente, às necessidades da população.
Uma pauta de mudanças
Essa agenda passa por retomar e renegociar uma política salarial, ter a iniciativa de diminuir a jornada de trabalho visando aumentar o número dos que trabalham e ter ações concretas para mudar os preços dos serviços públicos privatizados que oneram brutalmente os trabalhadores (telefonia, energia, combustíveis, gás de cozinha, etc). Além disso, é preciso estabelecer um novo pacto federativo com municípios e estados na repartição do bolo tributário e das competências das esferas administrativas.
É bom lembrar que o Diretório Nacional do nosso Partido aprovou, antes das eleições de 2002, que lutaríamos para garantir 20% do total das receitas públicas aos municípios. Nessa linha, inserem-se, também, as reivindicações de liberação dos financiamentos dos bancos públicos para estados e municípios em programas de habitação, saneamento, obras públicas e geração de emprego.
Essas iniciativas e um arsenal de experiências concretas que já praticamos em nossos governos, alicerçadas numa ousada e necessária política de participação popular, serão as condições para um grande exemplo emulador de campanhas eleitorais vitoriosas em 2004 e que reforçarão nosso projeto nacional.
Raul Pont é deputado estadual no Rio Grande do Sul e candidato a prefeito de Porto Alegre pelo PT.