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A democracia grita por socorro

Leia artigo de Robson Leite, professor universitário e assessor de movimentos populares no Rio de Janeiro, sobre a crise vivenciada em Honduras e intensificada na última terça-feira, com a chegada do presidente constitucional, Manuel Zelaya, ao país, e seu refúgio na Embaixada brasileira, onde milhares de manifestantes estão expressando seu apoio a ele e à retomada das liberdades democráticas no país. “Desde o golpe contra Zelaya, em 28 de junho, a resistência das forças democráticas e movimentos sociais se choca diariamente com a repressão da junta golpista. Só nesses últimos dois dias já morreram duas pessoas assassinadas pela polícia”.

ROBSON LEITE

A semana iniciou-se com as atenções voltadas para Honduras. É lá, naquele pequenino país latino-americano, que se desenrola um episódio dramático: derrubado por um golpe militar com o apoio da burguesia local, o presidente eleito, Manuel Zelaya, retornou ao país e encontra-se refugiado na embaixada brasileira.

Terceira economia mais pobre das Américas, Honduras vive hoje um processo muito conturbado. Desde o golpe contra Zelaya, em 28 de junho, a resistência das forças democráticas e movimentos sociais se choca diariamente com a repressão da junta golpista. O uso da força e o desprezo pelos direitos humanos são flagrantes. São várias as denúncias de tortura e de violência desproporcional. Só nesses últimos dois dias já morreram duas pessoas assassinadas pela polícia. Além disso, o cerco à embaixada brasileira inclui os cortes de luz, água e suprimentos na casa.

Neste contexto, é  preciso destacar dois aspectos fundamentais. O primeiro é justamente a utilização de Honduras como “balão de ensaio” para novos ataques à democracia na América Latina. E o segundo é justamente a postura da diplomacia brasileira e do governo Lula, apesar da cobertura no mínimo negligente da “grande” imprensa brasileira.

Nos últimos anos, assistimos a vitórias em série de forças progressistas no nosso continente. Esse processo é diretamente responsável pelo inédito aumento da inclusão social, pelo fortalecimento da participação popular e pela mudança do eixo de relação dos países – da subordinação aos interesses dos EUA para uma positiva integração da América Latina e dos países do hemisfério sul. Além disso, como o professor Emir Sader escreveu em seu mais recente livro, é na América Latina que hoje se desenvolve o principal foco de resistência e superação do neoliberalismo no mundo. O que, obviamente, desagrada às oligarquias e ao grande capital.

O golpe em Honduras, no momento em que o presidente convocava um plebiscito popular para aferir se a população desejava uma reforma constitucional, precisa ser compreendido nesse contexto. Se bem sucedido, servirá de combustível para um sem número de iniciativas golpistas visando à derrota e o retrocesso das experiências progressistas em nosso continente. Sua denúncia, portanto, é fundamental para a consolidação da democracia e dos direitos humanos.

É importante também salientarmos a postura do presidente Lula. Em todos os momentos, Lula denunciou o governo golpista de Honduras, defendeu a legitimidade do presidente eleito Zelaya e furou o cerco das notícias dos jornalões e TVs brasileiros, em geral simpáticos ao golpe e distorcendo as informações. A política externa brasileira atua de forma decisiva neste processo, construindo ações importantes. A utilização de nossa embaixada pelos 313 refugiados que acompanham o presidente Zelaya é uma demonstração de que o Brasil de fato não reconhece o governo golpista.

Enquanto isso, a mídia empresarial brasileira se limita a uma cobertura tendenciosa e hipócrita. Na impossibilidade de esconder a violência dos golpistas, desvia o foco para questões artificiais, como se o mais importante fosse saber se o Lula tinha ou não conhecimento da intenção de Zelaya de retornar ao país, e não o fato de que a maioria da população está mobilizada contra o golpe. O compromisso seletivo com a democracia virou a marca de um jornalismo panfletário e anti-esquerda, que ignora os fatos na construção das suas opiniões. A alternativa para buscarmos informações é a internet, onde podemos ver com fartura de detalhes a truculência dos golpistas, que inclusive usam estádios de futebol como prisão de manifestantes, assumindo semelhanças dramáticas com o golpe chileno comandado por Pinochet.

Aguardamos atentamente o desfecho da crise hondurenha, torcendo por um desenlace favorável à democracia e ao povo. Mais do que nunca, precisamos manifestar nossa solidariedade ao presidente Zelaya e apoiar as iniciativas do governo Lula, para que à sombra das ditaduras militares, apoiadas pelos setores reacionários da sociedade, que macularam profundamente a história do nosso continente, permaneça uma página suja de sangue nos livros, e não se tornem novamente uma cruel realidade.

* Robson Leite é professor universitário, escritor e assessor de movimentos populares.

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