“Nós, mulheres negras do Brasil, irmanadas com as mulheres do mundo afetadas pelo racismo, sexismo, lesbofobia, transfobia e outras formas de discriminação, estamos em marcha. Inspiradas em nossa ancestralidade, somos portadoras de um legado que afirma um novo pacto civilizatório.”
Abertura da Carta da Marcha das Mulheres Negras contra o racismo e a violência e pelo bem viver, de 2015, que ocorreu em Brasília e chegou a ser atacada violentamente por militantes de movimentos antidemocráticos que estavam acampados em Brasília à época.
No ano seguinte, 2016, a primeira mulher Presidenta do Brasil sofreu um golpe e a nossa democracia também. A luta das mulheres negras pelo direito de uma vida digna e pelo fim do genocídio descrita naquela carta sofre um golpe com o esvaziamento dos espaços de participação popular e com a aprovação das reformas trabalhista e previdenciária.
Em seguida, a eleição de Bolsonaro para a Presidência da República seguiu com a destruição dos Conselhos de participação social e com o desmonte das políticas públicas. Se em 2015 a reivindicação era por maiores investimentos que possibilitassem melhoria dos serviços públicos de saúde, educação e acirrava a discussão sobre a política de segurança pública, com a aprovação da Emenda Constitucional do Teto de Gastos e um governo neoliberal e conservador, os esforços passam a se concentrar na luta para garantir a sobrevivência e manutenção das políticas já existentes.
De 2019 a 2022 passamos por um processo de resistência e constante mobilização para defesa do direito à vida, à saúde, a condições dignas de vida, que se agudizaram com o surgimento de uma pandemia, agravada no Brasil pela irresponsável e criminosa gestão de um presidente contra o povo.
Mas a constante mobilização e a construção de ações nas periferias para enfrentamento à fome e à pandemia provaram, mais uma vez, a capacidade de organização coletiva e de solidariedade que criam soluções e rompem com o abandono do Estado.
A eleição do Presidente Lula em 2022 foi fruto não de grandes campanhas midiáticas, mas de gente que estava construindo cozinhas solidárias, campanhas de arrecadação e doação de alimentos, hortas comunitárias e tantas outras iniciativas lideradas em grande parte por mulheres negras que seguem insurgentes!
Neste ano de 2023, ocorrerá a IX Marcha das Mulheres Negras, de forma descentralizada pelos estados. É o retorno de uma mobilização que já tem uma história de quase dez anos, de luta por mais: mais direitos, mais dignidade, contra a discriminação, mostrando que as mulheres seguem organizadas. A data de 25 de Julho celebra Tereza de Benguela, líder do Quilombo do Piolho, liderança da comunidade negra e indígena que resistiu à escravidão por duas décadas no Mato Grosso.
25 de Julho é Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, dia de celebrar a vida de mulheres como Tereza de Benguela, que existem, resistem e insistem em sonhar construindo perspectivas de um novo pacto civilizatório, no qual não haverá espaço para o racismo, o machismo, a lgbtqiapnb+fobia, a violência. Um pacto para dar lugar à igualdade e ao bem-viver.
Viva as mulheres negras!
Vida longa e feliz àquelas cuja existência é revolucionária!
Dara Sant´Anna é estudante e faz parte da Coordenação Nacional do Coletivo Enegrecer e participa do Movimento Negro Unificado-MNU e da Marcha Mundial das Mulheres. Foi Diretora de Combate ao Racismo da UNE 2017-2019.