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A impunidade e o vale tudo na publicidade eleitoral | Raul Pont

Os programas eleitorais na rádio e TV são de responsabilidade dos Partidos e seus candidatos. A Justiça Eleitoral age se suscitada e não avalia a objetividade e a seriedade das promessas e propostas apresentadas.

Uma imprensa preocupada com a boa e honesta informação deveria fazê-lo, para ajudar o eleitor a distinguir o discurso da realidade dos fatos. Isso, ao menos, diminuiria a demagogia e a possibilidade efetiva de promessas que são apresentadas impunemente nas “telinhas”.

É o caso da campanha do candidato Melo que concorre à reeleição em Porto Alegre, que se desresponsabiliza da inundação vivida na capital, quando todos os indicadores apontam ao contrário: 1) O manifesto de dezenas de especialistas, técnicos, ex-diretores do extinto Departamento de Esgotos Pluviais (DEP); 2) Posição dos consultores estrangeiros contratados para um diagnóstico da inundação; 3) A própria crítica que Melo fez ao ex-prefeito Marchezan, na eleição de 2020, por não ter usado recursos federais disponíveis para manutenção e melhorias no sistema protetivo contra cheias; 4) A ausência, ao longo da gestão Melo, de iniciativas para buscar financiamentos e realizar investimento na manutenção do sistema, como provam os números dos orçamentos de 2021 a 2024.

Não suficiente o desastre e a incompetência da gestão Melo na drenagem urbana e na proteção contra enchentes e chuvas volumosas, o programa na TV apresenta ilusões e promessas na área da saúde com maquetes de obras que não condizem com a prática real dos últimos quatro anos. Período que foi marcado pela terceirização e privatização dos serviços de saúde na rede básica, contrariando a política consagrada ao atendimento à saúde da família que exige a permanência, o conhecimento e a integração dos profissionais nas comunidades.

Apresentar na TV um “novo” Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV) na avenida Érico Veríssimo responde a qual necessidade? Um grande novo negócio com a área do atual na avenida Independência para especulação imobiliária? Mais uma entrega de patrimônio público como foi feito com a Carris e na malfadada entrega do Caís Mauá ( em conjunto com o governo Leite) para os grandes espigões especulativos?

Essa proposta foi apresentada e discutida com a Câmara Municipal para avaliação de equivalência em seus custos e benefícios? Foi aprovada no Conselho Municipal de Saúde que é o órgão responsável, junto com a administração, pelo planejamento e execução da política de saúde no município, como determina a Constituição? Essa é a maior prioridade da saúde na cidade?

Em 2021, depois de utilizar por uma década o Hospital Federal da rua Álvaro Alvim (ex-hospital da Ulbra), o Hospital de Clínicas (HCPA) transferiu os serviços ali realizados para a nova área do complexo da Ramiro Barcelos. Apesar de vago e sem custos, nem o prefeito Melo, nem o Governador Leite assumiram o hospital federal da Álvaro Alvim. Mais precisamente, o prefeito Melo foi ao hospital, tirou fotos e declarou que a prefeitura ocuparia o espaço.

Apesar da posição favorável dos Conselhos de Saúde do Município e do Estado, o gesto não passou da foto e logo não se falou mais no assunto, sem explicações plausíveis aos Conselhos de Saúde. Meses depois, o governo Bolsonaro, através do Patrimônio da União, colocou à venda o imóvel apesar do apelo e posicionamento dos Conselhos.

No final de 2022, após um primeiro leilão vazio, a empresa Melnick, como única concorrente, arrematou o imóvel por um terço do valor de mercado. Um hospital público pronto de 10.000 m² foi, rapidamente, demolido para mais uma especulação imobiliária em uma cidade que o censo recente aponta que Porto Alegre possui mais de 100.000 imóveis desocupados para moradia e carência flagrante de atendimento de saúde.

Agora, o prefeito Melo alardeia em plena campanha eleitoral uma bela maquete de um “novo” HMIPV, trocando seis por meia dúzia. O que será da área atual da avenida Independência? A que se destinará esta área em um local extremamente valorizado do ponto de vista imobiliário e comercial? Ou será esta maquete apenas mais uma ação marqueteira em meio a propaganda eleitoral? Será apenas mais uma imagem bela e colorida para exibir na propaganda na TV, que em pouco condiz com a cidade da vida real?

Para concluir, vejo esta proposta como uma promessa vazia, assim como a outra ilusão apresentada na propaganda do prefeito candidato, de “construir uma nova policlínica em cada região da cidade”. De que regiões está falando? As regiões do orçamento participativo? As regiões de planejamento? Os pontos cardeais?

Um governo que precariza e terceirizou serviços de saúde, que não cumpre a meta de equipes de estratégia de saúde da família de acordo com a população, que não recuperou ainda as unidades atingidas pela inundação de vários bairros, não tem autoridade para apresentar milagres durante a campanha eleitoral.

Set. 2024

Raul Pont – Ex-prefeito de Porto Alegre

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