- A Democracia Socialista sempre enfrentou o debate acerca da reforma da universidade brasileira a partir dos princípios da educação pública, gratuita e de qualidade como direito universal e dever do Estado. Mais do que isso, a luta por uma Reforma Universitária sempre compôs o nosso programa democrático e popular enquanto uma das reformas estruturais que não apenas resolveriam a crise nacional, mas também avançaria na auto-organização dos trabalhadores, e conseqüentemente, no processo de transição ao socialismo.
- Foi dessa maneira que nos posicionamos frente à Assembléia Constituinte de 88, mobilizando e garantindo os avanços até hoje presentes na Carta, apoiadas pela 1ª Conferência Nacional de Educação, em 1987, não nos submetendo à lógica parlamentarista, mas sim submetendo o Congresso à dinâmica da mobilização social.
- Do mesmo modo ocorreu procedemos com a resistência às políticas neoliberais que avançaram sobre o país a partir da eleição de 89 e, principalmente, com a eleição de FHC em 1994. Nos juntamos às lutadoras e lutadores que construíram os Congressos Nacionais de Educação (CONED), as greves das Universidades Federais, etc, contra a realidade deixada pelo projeto neoliberal na educação: Segundo dados da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Educação Superior), os recursos do governo destinados à manutenção das 53 universidades federais caíram de R$ 551,605 milhões em 1995 para R$ 375 milhões em 2003. Isso representa uma queda de 32% em sete anos (números atualizados pelo IGP-DI). O Brasil reserva apenas 0,47% do PIB ao ensino superior, nos Estados Unidos este percentual chega a 2,3%. Os efeitos provocados pelas restrições orçamentárias são múltiplos: precariedade de laboratórios e salas de aulas; evasão escolar elevada pela ausência de políticas de assistência social ao estudante; bibliotecas mal conservadas e sem renovação de acervos; baixos salários e más condições de trabalho; déficit de funcionários e docentes. No setor privado, o cenário não é menos dramático. Estima-se que de 1995 a 2002 foram abertas em média, três Instituições Particulares de Ensino Superior por semana. No inicio do governo FHC, 69% das vagas na graduação estavam concentradas no ensino privado, hoje este percentual chega a 83,3%. O ultimo período foi marcado pela completa desregulamentação do ensino privado por uma expansão sem precedentes deste setor.
- É a partir deste histórico que nossa tendência encara o atual debate de Reforma Universitária encaminhado pelo Governo Lula. Devemos aliar a necessidade de recuperar os estragos feitos pelo neoliberalismo na universidade brasileira com um processo de disputa de rumos mais amplo, centrado na alteração de rumos do nosso governo que só será possível com uma ampla mobilização do movimento de massas que construa uma outra “governabilidade”, democrática e popular.
- Neste sentido, anteprojeto de Reforma Universitária que o MEC apresentou à sociedade no dia no dia 06 de dezembro é, dentre todos os demais apresentados pelo Ministério, o que mais se aproxima da plataforma para a Universidade brasileira defendida historicamente pelo PT. O anteprojeto nos permite vislumbrar a possibilidade da retomada do sentido público da Universidade brasileira e ainda esboça uma transição de paradigmas capaz de superar o legado neoliberal. Pois se tomarmos como centro das políticas neoliberais para a Educação Superior a desarticulação do setor público e a completa desregulamentação do setor privado, concluiremos que o anteprojeto interrompe um processo em curso há pelo menos dez anos. Esta nova orientação se materializa nos seguintes apontamentos:
– O restabelecimento e a reafirmação do papel do Estado como mantenedor das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e regulador do Sistema Federal de Educação Superior, afastando o risco da desresponsabilização do Estado com o financiamento das IFES e comprometendo-se ainda com a “qualificação e o fortalecimento da Universidade pública”.
– A construção de um Sistema Federal de Educação Superior revela a intenção do governo em regular o sistema e bloquear a expansão desenfreada e sem critérios do setor privado verificada nos últimos anos.
– A retomada da expansão da rede pública, buscando o reequilibrio entre o setor publico e o privado. O governo se compromete no art. 3º do Anteprojeto a alcançar o percentual de 40% das vagas no setor público até o ano de 2011 e com prioridade à abertura de novas vagas nos cursos noturnos. Esta expansão sempre foi uma reivindicação dos movimentos sociais ligados à educação e constava nas propostas do PNE da sociedade brasileira, entendemos ainda, que ela deve se dar preferencialmente no ensino presencial.
– A reafirmação da gratuidade do ensino de graduação e pós-graduação e da extensão nas Instituições Federais. É amplamente sabida que, uma das principais propostas do Banco Mundial para a educação superior na América Latina, é a introdução do ensino pago nas universidades públicas.
– O aumento das exigências para a concessão do título de Universidade. Segundo o anteprojeto, as Universidades deverão possuir “pelo menos um terço do corpo docente trabalhando em regime de tempo integral, e pelo menos a metade com titulação acadêmica de mestrado e doutorado”. Além disto se exige; a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; a integração com outros níveis e modalidades de ensino; gestão democrática e colegiada da instituição e valorização profissional dos docentes e técnicos-administrativos da instituição.
– O documento trabalha com a perspectiva de recuperação do funcionalismo público assegurando no estatuto das universidades a observância aos planos de carreiras nacionais de docentes e técnicos e administrativos.
É preciso ressaltar, no entanto, que o debate sobre a Reforma Universitária vai além do Anteprojeto. O Programa Universidade para Todos e a lei de inovação tecnológica caminham no sentido oposto ao anunciado pelo Anteprojeto. O PROUNI, com a posterior autocrítica do próprio governo, iniciou uma política de ampliação do acesso ao ensino superior por meio do setor privado. A lei de inovação tecnológica além de deslocar recursos para o âmbito das empresas legitima as relações promíscuas entre a universidade e o setor privado.
- Este conjunto de iniciativas previstas pelo documento nos permite identificar claramente um sentido geral com o qual o governo busca orientar sua proposta de reforma. E este sentido não é o de uma reforma privatista e neoliberal. Estamos falando de uma proposta que ainda carece de muitas definições e apresenta alguns equívocos. No entanto, oferece uma razoável base de discussão na direção de uma retomada do sentido público e nacional das políticas para o ensino superior.
O Volume de recursos previsto no Art. 41 não garante a expansão anunciada para a Universidade Pública especialmente porque excetua os investimentos no FUNDEF/FUNDEB – fundo ainda a ser constituído, cujo financiamento pela extensão da cobertura da educação básica será um grande pressionador dos recursos da União também além dos estados e municípios. Nesse sentido apoiamos a proposta prevista no PNE da sociedade civil que vincula o financiamento da universidade do PIB nominal.
- Contudo, para que este sentido global se concretize é fundamental construirmos um amplo processo de participação popular nas decisões políticas nacionais, que englobe tanto o orçamento federal quanto as políticas públicas em geral, configurando dessa maneira um elemento decisivo, constituinte e legitimador de um governo de esquerda que deseja transformar a realidade econômica e social do nosso país.
- Essa necessidade se torna mais clara se analisarmos as reações ao documento vinculadas em matérias na grande imprensa nos últimos meses e nas próprias iniciativas de organização da direita contra o anteprojeto, como a criação do Fórum em Defesa da Livre Iniciativa, que busca dar conseqüência prática a uma critica mercadológica ao sentido global apresentado pelo anteprojeto, instrumentalizando seus interlocutores no parlamento, na academia e nos meios de comunicação com vias de deslegitimar e derrotar a opção feita pelo governo no documento.
- Partindo deste entendimento a FASUBRA, a UNE, a CONTEE, a CNTE estarão juntamente com diversas outras entidades e movimentos sociais organizando uma Conferencia Nacional da Educação Superior para debater alternativas e organizar a luta por um outro modelo de Universidade. A data prevista inicialmente para sua realização é o final de Julho e sem duvida alguma este será um espaço decisivo. Nossa tendência apóia e participa ativamente desta iniciativa, defendendo que esta Conferência, para além de analisar o anteprojeto do governo no sentido de melhorá-lo e sustentá-lo no Congresso Nacional, fortaleça um processo de mobilização que cobre do MEC a implementação dos diversos pontos do anteprojeto que não necessitam de lei para serem implementados, mas sim de vontade política dos governantes, e que se implementados aumentariam em muito o movimento de defesa dos pontos que fossem ao congresso, reconstruindo a confiança do Governo Lula com suas bases históricas.
- A DS enfrentará o debate sobre alternativas para a educação superior e lutará em defesa do sentido geral do anteprojeto que aponta para o fortalecimento da universidade pública e regulamentação do ensino privado. Lutando pela superação dos pontos impeditivos para que esse sentido se concretize. Nosso empenho nesse processo se dará através do protagonismo nas discussões e mobilizações previstas para o próximo período, resgatando experiências e debates acumuladas por nossa tendência, como, por exemplo, o projeto Alfabetação, que expressa um importante marco na elaboração da DS acerca da Universidade e da Educação numa perspectiva transformadora.