Chatos não desistem
No serviço, no local de lazer, no território onde vivemos, sempre há alguém que entendemos como sendo um chato. Não sei se o que é chato para uma pessoa é um chato para todas as pessoas, inclusive da sua própria família. Sempre há o tio ou o primo chato.
Dia desses caminhava com pressa, pois precisava comprar uns parafusos com urgência, quando de repente ouço:
– Dr. Rosinha, Dr. Rosinha…
Ao ouvir o chamado e reconhecer a voz, pronto, despercebidamente acabara de passar por onde não deveria. Não parei, esperei pela terceira chamada, que não falhou. O chato nunca desiste.
Como ia à frente, parei para esperar. Assim que chega, na esperança de que a conversa se encerrasse ali, avisei:
– Estou com pressa – e acrescentei a razão da mesma.
Não adiantou e me convidou:
– Vem, entra, vamos conversar.
– Obrigado, mas como já disse, estou com pressa – e repito a razão.
– Só cinco minutos.
– Não dá.
– Só cinco minutos – insistiu.
Fiz que não com a cabeça.
– Então dois.
Chato nunca desiste.
Mesmo sabendo que não seriam dois minutos, para acabar logo com aquilo, aceitei o convite.
Entrei e quando a conversa já passava dos 10 minutos tive que, quase na marra, sair. Mas, como chatos não desistem:
– Vou com você.
Me acompanhou e foi falando sem parar. Falou tudo que era de seu interesse, e eu, na maioria das vezes, respondendo monossilabicamente: sim, não, talvez.
Na loja, apesar de não conhecer ninguém, já demonstrou intimidade com os parafusos e com quem me atendia.
Efetuei a compra e assim que me despeço da moça que me atendeu vem a pergunta:
– Para onde você vai?
Respondi-lhe e saí rumo à minha atividade. Sem pestanejar, ele completou:
– Vou com você.
Tomo o rumo na direção em que o encontrei, com a esperança de que por ali ficasse. Paro, estendo a mão para despedir-me, mas, como chato não desiste, ouço:
– Vou com você até sua casa, depois volto.
Necessito urgentemente de uma receita: como não se chatear com chatos?
***
Este número não existe
Muitas vezes estamos esperando um telefonema, que é imprescindível naquele momento, o celular toca, o número não é conhecido, mas logo a imaginação funciona, “vá que mudou o número”. É fatal, atende e está lá o silêncio ou a voz padrão da Inteligência Artificial.
Se por acaso tiver a curiosidade e der o retorno para uma destas chamadas vai ouvir: este número não existe. Ora, se não existe, como me telefonou?
É insuportavelmente chata a quantidade de robôs nos telefonando.
***
Crônica chata
Como o tema aqui é a chatice e a chateação, imagino que já chateei muito com estes “Apontamentos”. Afinal chego ao número XX. Para não chatear mais, mas sem saber como será daqui para a frente, encerro a série destes “Apontamentos”.
Mas, como também sou um chato persistente, não estou me despedindo do Plural, tampouco significa que não possa voltar a usar este modelo de apresentação das crônicas.
Dr. Rosinha é médico aposentado e ex-deputado.