Nos últimos dias, para estimular a retomada do crescimento econômico, o Governo Federal anunciou várias medidas para reduzir os juros dos bancos oficiais – Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Na sequência, com medo de perder clientes, os principais bancos privados nacionais também cortaram taxas de juros. Pouco depois, o Copom anunciou a redução da taxa Selic para 9% – o índice mais baixo em dois anos –, o que permitiu que o Brasil deixasse de ser o recordista mundial da taxa de juros.
Essas medidas ocorreram em meio a uma queda de braço entre os bancos e o governo, com a presidenta Dilma Rousseff defendendo a redução do spread bancário – a diferença entre a taxa de captação das instituições financeiras e os juros cobrados dos clientes – e a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) pedindo corte de impostos e diminuição do compulsório (percentual dos depósitos que os bancos são obrigados a manter no Banco Central). As reivindicações foram rechaçadas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que disse que os bancos têm margem para aumentar o crédito e reduzir os juros sem ajuda do governo.
De fato, como lembrou Mantega, o Brasil hoje é o país que pratica o maior spread do mundo. Os bancos justificam esse alto patamar sob a alegação de que temos uma taxa de inadimplência alta e que os impostos pagos pelo sistema financeiro são excessivos. O fato é que tais argumentos não explicam por que há uma década a taxa média de juros dos empréstimos bancários sempre esteve acima dos 39%, enquanto que, no mesmo período, a Selic variou de 26,5% aos atuais 9%; a inflação de 12,53% a 6,5% (em 2011), enquanto que, a inadimplência caiu de 15,9% para 5,7%. E o spread bancário se manteve em níveis estratosféricos mesmo durante a crise econômica mundial de 2008-2009, quando o governo reduziu o imposto compulsório e os bancos públicos baixaram os juros para estimular o consumo.
Recentemente, um levantamento da consultora Economatica revelou que, pelo oitavo ano consecutivo, os bancos brasileiros registraram rentabilidade maior dos que os americanos. A rentabilidade sobre o patrimônio (iniciais ROE – return on equity – em inglês) dos bancos brasileiros foi de 13,97%, contra 7,63% dos bancos dos EUA em 2011; 15,57% contra 6,06% em 2010 e 13,3% contra 2,81% em 2009. De acordo com esse levantamento, os 25 bancos brasileiros de capital aberto acumularam lucro de R$ 49,4 bilhões em 2011 – um crescimento de 14,48% em relação a 2010.
Na verdade, os spreads que proporcionam tal rentabilidade aos bancos brasileiros ocorrem não por causa da inadimplência ou dos impostos, mas em função do processo de concentração financeira que o país vem vivendo nos últimos anos. Os cinco maiores bancos brasileiros concentram cerca de 75% dos ativos e empréstimos do país. Há dez anos, esses cinco bancos tinham menos de 10% do mercado. E essa concentração aumentou depois da crise financeira de 2008, quando ocorreram grandes fusões e aquisições. Como se sabe, quanto mais concentrado é um setor da economia, maior poder ele tem para promover seus interesses.
Mas a situação trazida com a crise econômica talvez nos tenha indicado o caminho para conciliar os interesses dos bancos com o desenvolvimento do país. Naquele momento, enquanto o sistema financeiro privado se retraiu, os bancos públicos ofertaram crédito a juros baixos para o consumo. A robustez do mercado de trabalho; o grau de confiança de empresários e consumidores e a queda dos indicadores de inadimplência fizeram o resto. Com isso, formou-se um círculo virtuoso que permitiu aos bancos oficiais emprestar dinheiro, aumentar sua fatia no mercado e ainda lucrar com isso. Por que os bancos privados nacionais não podem seguir o mesmo caminho?
O fato é que estamos trilhando um novo caminho, sem volta. A política da presidenta Dilma Rousseff de forçar a queda da taxa de juros sem perder o controle da inflação deu passos decisivos no sentido de corrigir as distorções de um modelo que possibilitou a construção de um sistema financeiro robusto, mas à custa da atividade econômica produtiva do país.
* Cláudio Puty é deputado federal (PT-PA).