Estamos nos aproximando de mais uma Bienal da Arte e Cultura da União Nacional dos Estudantes. O Rio de janeiro, mais uma vez, servirá de palco para toda efervescência cultural universitária brasileira. Somada à produção universitária, a Bienal receberá vários convidados e convidadas das mais diversas áreas, tanto artistas com trajetórias consolidadas, como artistas com trajetórias mais recentes. A entidade, que carrega em seu DNA o CPC, sempre foi articuladora de importantes manifestações políticas e culturais do seu tempo. Desse modo há muito para se esperar dessa edição de 2015. Há, porém, novos elementos no cenário político local, nacional e na UNE a serem debatidos para entendermos de forma bem definida, o contexto em que acontecerá essa 9ª edição da Bienal da UNE.
Rio de Janeiro como palco
O Rio de Janeiro, além de palco de muitas Bienais anteriores, foi também um dos maiores palcos das manifestações de Junho de 2013. As manifestações imprimiram marcas que jamais serão apagadas nas ruas da nossa cidade. Essas mesmas ruas, em fevereiro, irão interagir e receber jovens, artistas e jovens artistas de todo pais.
É preciso, portanto, que esse encontro, que irá reunir centenas de jovens pensantes e inquietos em um ambiente questionador, como a Bienal da UNE, esteja em sintonia com essas marcas. A memória Junho de 2013 nos obriga a questionar não apenas a truculenta ação policial sofrida durante as manifestações de Junho, mas também a violência sofrida todos os dias pela juventude negra em nossa cidade. Consideramos a luta pelo fim do extermínio da juventude negra como uma responsabilidade civilizatória, e acreditamos que o estado do Rio de Janeiro e nossa capital, pelos altos índices de morte dessa parcela da sociedade, devem estar no centro dessa luta.
Outro grande problema a ser enfrentado em nossa cidade diz respeito às políticas de maquiagem que escondem a real desigualdade econômica e territorial existente. A disputa do público x privado nunca foi tão evidente por aqui.
Contra essa realidade, há respostas: os movimentos de esquerda se fortalecem, se unem. Ressalte-se a adesão e solidariedade dos mais diversos movimentos sociais, a ocupação do MTST no bairro de Santa Luzia em São Gonçalo e, ainda, a juventude que subverteu a antiga expressão Esquerda Festiva e, hoje, reúne jovens militantes e simpatizantes de diferentes partidos e movimentos no mesmo espaço cultural.
É importante que a presença da entidade máxima de representação dos estudantes e maior entidade de juventude no Brasil – a UNE -, em nossa cidade, dialogue com a Frente de Esquerda que construímos por aqui. Tal frente, entre nós, é construída por diversos partidos de esquerda e movimentos questionadores desse modelo excludente no qual vivemos.
Eleições e cenário nacional
Nacionalmente passamos por uma eleição dura, porém vitoriosa. A eleição de Dilma significou a quinta vitória estratégica sobre o neoliberalismo. Vencemos quatro eleições presidenciais e sustentamos políticas de esquerda frente à crise internacional.
Nossa campanha conseguiu conquistar eleitoralmente uma parcela decisiva de jovens da nova classe trabalhadora. Isso foi possível devido à agenda de compromissos assumidos pela presidenta ao longo da campanha. Apresentamos um programa da revolução democrática que, ao dar um passo adiante do programa anti-neoliberal, incluiu políticas de igualdade e de liberdades. Nossa campanha conquistou uma parcela importante dos jovens da nova classe trabalhadora e da juventude que foi às ruas em junho de 2013.
No segundo turno, fomos além. Ampliamos a esquerda resgatando antigos militantes petistas, jovens militantes de esquerda – organizados ou não em partidos políticos -, intelectuais de esquerda, movimentos culturais, ativistas de diferentes áreas, parlamentares do PSOL e seus militantes em luta unificada contra o neoliberalismo.
Foi assim que enfrentamos, como nunca, o debate da participação social, o combate à homofobia, a violência contra as mulheres. A campanha fez opções acertadas, empoderando movimentos de juventude, e trazendo o Juca Ferreira para o centro da construção do programa de cultura do governo.
Com tais opções a campanha construiu comícios, atos e reuniões com movimentos de juventude e jovens das periferias. As pautas da galera da favela, do funk, do hip hop, do passinho, e a reivindicação pelos Pontos de Cultura entraram com peso na agenda política. Vencemos o discurso que argumenta que “mudança é sinônimo de alternância de poder”. Ressalte-se que nossa vitória só foi possível porque conseguimos demonstrar que apenas deste nosso lado será possível mudar mais.
Mas a disputa não acabou, e esse novo governo gera novos desafios. Frente à vitória de um congresso mais conservador, e uma eleição marcada pelo ódio, é preciso que o novo governo politize os futuros enfrentamentos e recoloque o embate de ideias e valores no centro. Agora, cabe-nos sustentar com firmeza a ideia de que para produzir outros valores e radicalizar a democracia temos que encarar a cultura como um processo transversal e decisivo.
UNE e sua 9ª Bienal de Arte e Cultura.
Como se sabe, a UNE mistura sua história com história da luta pela democracia em nosso país. Também faz parte de sua história a capacidade de se reinventar e estar conectada com as atuais demandas da sua geração. A entidade acertou em cheio ao priorizar a Bienal nessa gestão. A UNE, como não poderia deixar de ser, quer estar à altura dos atuais desafios da sociedade e da juventude brasileira.
Vale lembrar que, junto as suas pautas tradicionais e as pautas da educação, a UNE tem dado cada vez mais centralidade a luta das feministas, dos negros e negras, homossexuais, e caminhando ao lado de todas e de todos que lutam pelo direito à terra, à saúde e à moradia. Mais: ela também é protagonista na luta pela reforma política e pela democratização dos meios de comunicação.
Como se sabe, existem hoje novas pautas que interessam a UNE, e novos setores da sociedade com os quais ela precisa dialogar. Trata-se de uma juventude que pertence a uma nova classe econômica. São jovens que não são sindicalizados, que não são filiados a partidos políticos, mas que produzem cultura. Eis outro desafio para a Bienal da UNE: incluir, dialogar, aprender, com esses novos atores culturais.
Entre os muitos e novos desafios, somam-se novas formas de se organizar. Tal reconhecimento não permite que o espaço da Bienal seja um fórum tradicional do movimento estudantil; ele desponta como um espaço libertário, livre do machismo, racismo, homofobia e autônomo. Espaço que se abre para novas experimentações e para produzir uma nova linguagem política, capaz de dialogar com as novas demandas da juventude brasileira. Estamos interessados em dialogar tanto com organizados como com os desorganizados. É preciso ter mais amor e menos crachá!
Nossa defesa incansável por uma universidade pública, gratuita e socialmente referenciada passa a ter como referência essa nova conjuntura. Que venha a 9ª Bienal da UNE, na cidade maravilhosa! Estamos animados e animados para juntos enfrentar esses desafios e receberemos a todas e a todos de braços abertos!
Felipe Malhão é Secretário Geral da UEE-RJ