Decidir lançar uma candidatura a vereador em São Paulo exige capacidade, coragem e muita ousadia.
Foi isso que a gente decidiu que tinha. A mistura de trajetórias de vida e militância distintas, mas com um projeto comum, foi o que fez a campanha do Gabriel Medina acontecer do jeito que vocês estão vendo acontecer.
E é sobre isso que eu quero falar nesse post.
A gente, que já tinha feito um monte de campanha por aí, queria fazer uma campanha com a nossa cara, do nosso jeito.
Uma campanha que contribuísse pra derrotar essa lógica que impera em São Paulo, que transforma a maioria das pessoas em coisas descartáveis (ou incineráveis), mais um monte de gente em consumidoras e algumas poucas pessoas em gente rica.
A gente via as possibilidades de viver uma vida que vale a pena ser vivida ir para o ralo caso a gente continuasse perdendo aqui em SP pra essa direita conservadora.
A gente juntou todas as nossas indignações que dão o impulso pra gente ser militante, mas também juntamos toda a nossa experiência de um fazer política com a cumplicidade no desafio de conquistar corações e mentes. Somos de esquerda, somos libertários e acreditamos que não dá pra ser livre no capitalismo. Mas como falar de outro mundo possível, de socialismo, de desmercantilização da vida em plena eleição?
Muitos(as) do nosso partido rebaixam o discurso pra ser palatável. Muitos de partidos que se autoproclamam o caminho, a verdade e vida da esquerda mundial resumem seu discurso à defesa de uma ética baseada nas virtudes de indivíduos e não em transformações estruturais. Estes fazem isso em uma campanha confortável, pois estão fazendo propaganda nas eleições e não tem nem perto do horizonte a possibilidade de governar a cidade.
Nós estamos fazendo outra coisa.
Saímos da nossa zona de conforto e fomos defender em São Paulo um projeto de vida, que passa por melhorar a cidade, mas que passa também por mudar o mundo.
E nós fomos defender isso com a cara limpa, nas ruas e nas redes.
O Gabriel não parou um dia de percorrer a cidade, conversar com as pessoas, com gente que se organiza nos movimentos sociais, com gente que se organiza nos bairros, com gente que se organiza através da arte e da cultura, em grupos de teatro e trios de forró. E além disso também conversamos com as pessoas que não se organizam no sentido “tradicional” do termo, mas estão em movimento ao compartilhar suas opiniões ou ao decidir ocupar as praças e ruas para dançar.
Essa campanha representa a nossa geração política. E pra nós, uma nova geração política não tem a ver apenas com a idade, mas com uma forma e conteúdo que marcam o nosso fazer política. Aprendemos isso ao fazer o Acampamento da Juventude no Fórum Social Mundial em 2005, ao questionar a verticalização de estruturas burocráticas do movimento estudantil, ao organizar intervenções urbanas e dar a cara a tapa (ou a bombas de gás lacrimogênio).
Pra nós o novo não tem que apagar a tradição, mas tem que ver onde é que se situa num presente, considerando um acúmulo que fez a gente chegar até aqui, que passou por muitas mãos e lutas, e experiências que deram certo e outras que não deram. O novo que não se enxerga na história é só discurso, e normalmente acaba sendo mais do mesmo conservadorismo.
Tô divagando pra dizer que a campanha do Gabriel conseguiu expressar, nesses poucos meses, o que a nossa geração política tem para dirigir não só a juventude, mas sim a cidade e os processos políticos em que estamos metidos.
E essa direção é coletiva.
Chamamos voto para uma pessoa, mas vejo a cada dia um candidato que se preocupa o tempo todo em despersonalizar esse processo, em ser coletivo. Fazemos uma campanha que já teve como pauta, na mesma reunião, o conteúdo do programa, o slogan da campanha e a organização da limpeza do comitê.
Mas, o que eu queria mesmo dizer é que hoje, faltando 2 dias para as eleições, sabemos que a candidatura do Gabriel Medina é a candidatura de esquerda viável em São Paulo.
Esquerda não só como quem critica a direita, ok? Então, uma breve retrospectiva dessa campanha de esquerda:
Sintetizamos a nossa proposta em um manifesto e em uma plataforma de programa aberta para contribuições.
Participamos da elaboração do programa de governo do Haddad, ao mesmo tempo em que afirmamos que o novo em São Paulo não pode abrir caminho para o atraso.
Vencemos todas as burocracias para finalmente conseguir um comitê, que ocupamos com muito conteúdo: rodas de conversa LGBT, de mulheres, dos inter-religiosos que defendem o Estado laico, do combate ao racismo.
Fazemos uma campanha que fala de liberdade sem ser liberal. Que fala do direito à cidade e à ocupação das ruas e da noite, mas que afirma que esse direito não existirá de fato se: as mulheres não têm direito pleno a autonomia (com direito ao aborto, a uma vida livre de violência e com autonomia econômica); ou se a população LGBT continua sendo violentada por expressar seu afeto e sexualidade, ou se o genocídio da juventude negra continua sendo praticado inclusive pelo Estado. A saúde mental é um componente importante da campanha, o combate à política de drogas que criminaliza as pessoas e transformam usuários em não sujeitos.
Defendemos o direito de ir e vir, pra trabalhar ou curtir, a qualquer hora do dia e da noite, com o #Busao24h.
Inventamos o “É nóis produções” e experimentamos a horizontalidade na criação de conteúdo, imagens, frases e processos.
Fazemos a campanha na rede, mas fazemos muita campanha nas ruas.
Fizemos essas e outras na campanha, e temos um lado, somos parte de um projeto: somos do PT.
Defendemos o amor, mas sabemos que pra gente poder amar mesmo, aqui em SP, muito conflito tem que rolar. E que só o amor não muda o mundo, um tanto de indignação e movimento formam o combustível dessa luta que é cotidiana, mas que tem uma data pra mostrar que é viável.
Dia 7 de outubro não vai ser só a data que eu completo 29 anos e saturno faz (ou deixa de fazer) alguma coisa na minha vida.
Vai ser o dia que vamos mostrar nas urnas que o nosso projeto de vida é viável e que é a gente que faz acontecer.
E que nós viemos pra ficar =)
* Tica Moreno é militante da Democracia Socialista e integrante da coordenação nacional da Marcha Mundial das Mulheres no Brasil.