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Diagnóstico comum. Remédios nem tanto

936350Por Raul Pont

A avaliação da conjuntura, aprovada pelo DN/PT em 29 de julho de 2013, apresenta um diagnóstico do período bastante consensual. O texto-base incorporou emendas, em especial aditivas, procurou fugir de uma definição agora sobre a política de alianças praticada no governo federal e fez um esforço em absorver a maioria das sugestões e emendas apresentadas.

Nesse sentido, a análise da conjuntura dá conta da caracterização dos acontecimentos de junho. Dialoga e sintoniza com as posições assumidas pela presidenta Dilma na resposta às ruas chamando o plebiscito e a reforma política urgentes para ouvir a voz e os anseios dos movimentos sociais que não se sentem representados no atual sistema político brasileiro. “A resposta está na afirmação do princípio da soberania popular. O povo deve decidir se deve haver uma reforma política e como deve ser feita”, diz o texto.

O documento da Direção Nacional constata, também, que a estratégia de gestão adotada a partir de 2003 encontra crescentes dificuldades. Sem uma avaliação mais profunda ou crítica da busca de governabilidade através da ampla aliança congressual que governa o país até hoje, reconhece que “o sistema político vigente bloqueia as chances para a formação de uma maioria mais progressista e estrategicamente articulada com o projeto que preside o país”.

Chegamos a um momento em que todas as boas conquistas econômicas e sociais dos dez anos de Lula e Dilma encontram dificuldades crescentes para sua continuidade. A ampla aliança não garante os votos para as iniciativas do governo. E, pior, o governo encontra-se emperrado, refém desse quadro.

Dialeticamente, “as manifestações (de junho) são conseqüência combinada dos êxitos e dos limites das mudanças realizadas no Brasil, ao longo dos últimos 10 anos”, afirma o documento.

O texto aprovado não esquece de incorporar na análise a questão do monopólio das comunicações e a situação internacional, seja a crise econômica nos centros do capitalismo, seja na crescente ação direta do imperialismo norte-americano no continente americano: tratados de livre comércio bilaterais para impedir a integração, ações militares crescentes (Colômbia), espionagem, provocações constantes (Evo Morales e Venezuela). Na primeira, o controle monopólico das comunicações é o principal entrave a um projeto de desenvolvimento inclusivo, igualitário e integracionista. O texto aponta, inclusive, para nosso engajamento ao projeto de lei de iniciativa popular sobre Comunicação Social Eletrônica, proposto pela Frente Nacional de Desenvolvimento das Comunicações (FNDE).

Na segunda, responde com a integração econômica, com o espaço de diálogo do Foro de São Paulo e a solidariedade aos governos e países democráticos populares do continente.

A avaliação do DN, também, convoca o Partido para manter sua luta pela reforma política através da lei de iniciativa popular onde defendemos o voto em lista e o financiamento público das campanhas, assim como as iniciativas que o governo Dilma vem assumindo em relação à Educação (recursos do pré-sal) e à Saúde (Mais Médicos, fortalecimento do SUS) e a defesa das leis trabalhistas que a maioria na Câmara Federal busca precarizar e/ou extinguir direitos.

Em suma, a análise conjuntural faz um diagnóstico do país, alcança um grau de consenso elevado no DN, mas na nossa avaliação, é insuficiente para dar conta da dimensão da crise e dos desafios que estão colocados nesse momento.

Uma leitura mais profunda dos acontecimentos de junho nos obriga a uma autocrítica partidária sem a qual não recuperaremos diálogo e relação orgânica com uma nova vanguarda que surge nesses movimentos, bem como uma nova geração por ela influenciada.

Para efeito didático, sem uma preocupação de rigorosa escala de prioridade, elencamos alguns temas e propostas que não podem continuar no limbo sem um posicionamento e uma correspondência prática na direção partidária.

a. Não é possível que o DN discuta, aprove e encaminhe uma estratégia sobre a reforma política e a lei de iniciativa popular e, na Câmara Federal, com a iniciativa do PMDB, o deputado Vacarezza leve adiante e fale pelo Partido na defesa de um simulacro, de um engodo de reforma que só traz mais desmoralização e crítica por parte dos movimentos que poderiam estar conosco. São ações como essas que quebram a confiança, a identidade e é isso que nos desmoraliza diante da juventude e dos movimentos sociais. Se a maioria do DN quer manter a prática do deputado Vacarezza esse deve ser um dos temas do debate do PED, responsabilizando diante do Partido quem mantém essa política. Ou, então, a maioria tem que desaprovar a proposta de lei de iniciativa popular pelo financiamento público e o voto em lista.

b. O não reconhecimento dos Partidos e dos políticos em geral, pelos manifestantes de junho expressa, claramente, que na ausência de novas formas de participação, de democracia direta e participativa, os manifestantes vão ampliar sua ojeriza à política e aos partidos, engrossando o niilismo, as ações anarquistas e individualistas, favorecendo o senso comum das saídas fascistas. O Partido tem que assumir e incidir com muito mais força junto ao governo federal para que ele desenvolva mecanismos de participação direta na elaboração do orçamento e na definição de políticas públicas.

Uma das razões pelas quais muitos dos beneficiários das políticas governamentais (MCMV, Bolsa Família, Prouni, Vagas, Cotas, Créditos agrícolas e urbanos, etc) encontram-se entre os manifestantes, é de que não foram protagonistas ou não se sentem construtores dessas políticas, nem foram educados para uma cidadania desse tipo.

Urge, portanto, que através do Partido convençamos os nossos governos que não praticam essa política que o façam como questão programática, ideológica. Algo que nos distinga, nos singularize na política nacional, pela participação popular.

c. Sem a crítica e o fim dos privilégios e vantagens dos mandatos não há como recuperar uma imagem positiva da nossa história no combate à previdência parlamentar (IPC), às verbas assistenciais e clientelistas, ao crescimento burocrático dos gabinetes. A conciliação com a prática das emendas parlamentares é um câncer permanente e a ante-sala da corrupção e da troca de favores com empreiteiros e fornecedores do Estado.  Além do privilégio e da corrupção, a emenda parlamentar é a negação do planejamento, do gasto racional do recurso público.

Ou isso é objetivo programático do Partido sem tréguas, sem concessões, ou este será crescentemente refém disso em seus gastos, dependendo das empresas para sua existência e eleições.

Os gastos públicos na manutenção dos atuais Senado e Câmara Federal são um acinte à luta do povo por melhores condições de vida (educação, saúde, moradia, transporte públicos). Sem romper com a cumplicidade pragmática que se estabelece nessas esferas burocráticas, um partido originalmente transformador, popular ou socialista, acaba subordinando-se a essa lógica. Nós mesmos, na bancada federal e no Senado, há quanto tempo deixamos de lutar para extinguir um regime próprio de Previdência que só sobrevive com orçamento público?

Esse é o debate que temos que fazer no PED, junto com o cumprimento do Estatuto e do Código de Ética do Partido que afirmam e reafirmam que não podemos conciliar com qualquer política de vantagem pessoal, de privilégio e exclusividades para os portadores de mandato público.

d. Não há dúvida entre nós que o maior e principal articulador da oposição, da direita, é a mídia monopolista que controla as informações e as versões predominantes dos acontecimentos. O Instituto Millenium e setores dos partidos conservadores – na oposição ou no governo – compõem esse núcleo dirigente. Enquanto isso, recuamos na regulação do setor, abandonamos o projeto que vinha sendo construído e o Ministro das Comunicações não expressa a visão histórica do Partido e não pratica suas resoluções.

Os instrumentos públicos – rádio e TV – não conseguem, minimamente, romper com os oligopólios de audiência das redes e nem sinalizamos alguma disposição de recuperar os serviços de telefonia – por pior e caras que sejam as tarifas – para o controle e a operação pública. Argumentos e razões não faltam, em mais de uma dezena de Estados funcionam CPIs nas Assembléias originadas nos péssimos serviços,  no assalto diário aos usuários e nas bilionárias remessas de lucros para o exterior.

O Partido abdica de levantar a bandeira da retomada desses serviços, assim como de outros serviços como os pedágios que são “criadores de burguesia” e da acumulação capitalista às custas de serviços públicos. A criação da EGR, no RS, é a luminosa exceção à regra e que aponta um rumo que deveríamos estender nessa e noutras áreas. Empresa pública com controle governamental e também público via sociedade civil organizada.

Fruto desse oligopólio midiático, nesse momento, nos preparamos para um novo período de sangramento pelos meios de comunicação. A novela da Ação Penal 470 prepara seus próximos capítulos para 2014.

Por mais que tenhamos consciência de que comparada com as privatizações, com o mensalão mineiro, com o propinoduto paulista do Maluf, do Alckmin – Serra – Covas (Alstom/ Siemens/ Metrô) e tantas outras, a ação penal envolvendo petistas é coisa de traquinagens de jardim de infância, nenhum desses escândalos adquiriu a dimensão da AP 470. O objetivo desta era marcar de forma perene o PT, visando igualá-lo ao padrão corriqueiro dos partidos da burguesia e da própria classe dominante brasileira no seu cotidiano.

Se a direção partidária continuar tratando como até aqui a questão da AP 470 e os dirigentes implicados será incontornável caminharmos para mais um linchamento midiático em pleno processo eleitoral.

Não se trata, repetimos, de comparações com outros Partidos, nem de falta de solidariedade com os julgados. Trata-se de uma questão política que o Partido tem que enfrentar diante de uma opinião pública formada por uma mídia cujo objetivo é nos derrotar, acabar com “nossa raça” e que nos carimbou de “corruptos iguais aos outros” diante da sociedade. Erros políticos, com ou sem vantagens pessoais, são erros políticos e devem ser julgados pelo Partido e isso exige punições ou sacrifícios.

Dar-lhes legenda e/ou representação pública é manter acesa, permanentemente, a responsabilidade coletiva do Partido com o ocorrido. Por mais incomparáveis que sejam os escândalos de ilícitos no país, continuamos sendo alvos e responsabilizados pela corrupção nacional.

e. O tema predominante de forma organizada nas mobilizações de junho foi o transporte urbano, pois é caro e ineficiente. Se ao longo do nosso governo federal se estimulou o automóvel como motor da indústria e acesso a um bem visto como prestígio social e mobilidade rápida, as políticas para o transporte urbano foram secundarizadas e sem uma política que orientasse e estimulasse – via projetos, subsídios e recursos da OGU – os municípios a assumirem mais do que a simples fiscalização e regulação do setor.

O predomínio do transporte urbano é privado e, portanto, não combina com qualidade e preços baixos. As altas taxas de retorno (lucro) e a diminuição máxima dos custos não combinam com qualidade, planejamento e segurança que o setor deve ter.

Fica-se preso à conseqüência real: congestionamentos, stress urbano, elevação da jornada de trabalho nos deslocamentos e baixa qualidade. Com poucas exceções, na maioria dos municípios e Estados os órgãos de fiscalização e controle são capturados pelas empresas.

Assim, o Metrô apresenta-se sempre como grande solução, porém, caríssima e sempre acima das capacidades orçamentárias dos municípios. Portanto, uma não-saída.

O governo precisa pensar e propor alternativas mais baratas como uma política de fabricação e fornecimento de bondes modernos – veículos leves sobre trilhos -, muito mais baratos, sem obras caríssimas e que permitem redes mais abrangentes e articuladas, viáveis de serem absorvidas pelos municípios e seus orçamentos.

Porto Alegre é um exemplo. Com a rede de radiais e perimetrais já existentes e grande parte já com corredores exclusivos permitiria uma rede de grande abrangência, para uma metrópole que tem crescimento demográfico de 0,5% ao ano.

Isso, no entanto, não combina com licitações de empresas privadas, estanques, ciosas das suas “linhas”, dos seus “contratos” que impedem e dificultam alterações e modificações que respondam aos ritmos e mudanças do dinamismo das cidades.

Temos que ter a ousadia de defender que o transporte público tem que ser público em sua gestão, em sua realização, maleável, que acompanhe as mudanças, que não fique preso às “tabelas” que não enxergam o número de usuários, nem buscam adequação às necessidades da população.

Não basta fazer desonerações (mais renúncia fiscal), nos momentos de crise baixar centavos das tarifas ou fazer mais concessões aos permissionários. O transporte coletivo urbano e/ou metropolitano deve ser público com mecanismos de controle dos usuários ou suas entidades.

Este é um ponto de programa que tem que ser assumido pelos nossos governos e pelo Partido para que possamos dialogar seriamente com as reivindicações da juventude, dos trabalhadores nas jornadas de julho.

As questões aqui arroladas não dão conta de um programa de governo ou uma estratégia partidária e é evidente que muitas outras questões teriam que ser debatidas e formuladas pelo Partido. O objetivo desta avaliação conjuntural é contribuir para uma resposta aos desafios imediatos que estão colocados e que respondam aos recentes acontecimentos.

Se alguns aspectos podem parecer exagero ético-moralista ou formalismo estatutário, o objetivo é esse mesmo. Não é só o óbvio que às vezes tem que se lembrado. Na prática política a perda de identidade, a ausência de referências permanentes e quando o pragmatismo e a subordinação ideológica aos valores burgueses-capitalistas substituem nossas ações no dia a dia é porque caminhamos no rumo da degeneração política.

Não são só as ruas que nos alertam, como partido que nasceu dos movimentos sociais, da crise do sistema representativo brasileiro, mas, também, do afastamento dos partidos na sua relação com a sociedade.

Sem exemplos concretos que mudem as práticas partidárias e das instituições político-administrativas no Brasil não vamos recuperar e/ou ganhar os setores que queremos representar para novas conquistas. Sem uma radical mudança nesse sistema político dominado pelo poder econômico, viciado no burocratismo dos privilégios, na troca de favores e no clientelismo, as forças de esquerda serão, inexoravelmente, cooptadas e transformadas em partidos da ordem burguesa capitalista.

Daí a necessidade de não baixarmos as bandeiras do Plebiscito, da Constituinte, do Orçamento Participativo, dos Conselhos e Conferências que inflexionem nossos governos na direção de democracias participativas que questionem e produzem nova institucionalidade.

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