As ultimas pesquisas vêm anunciando que poderia dar “tilt” – aquela parada de funcionamento nas máquinas de jogos quando algo ou alguém bate nelas e perturba a carreira das bolinhas – nas eleições alemãs, em setembro próximo.
Qual é a situação? A possibilidade de não resultar, das eleições, nenhuma maioria clara nem coalizão possível. A última pesquisa feita pelo instituto Forsa para, entre outros clientes, a revista ‘Der Spiegel’, apontava para os seguintes resultados:
União Democrata Cristã (da chanceler Angela Mekel) + sua co-irmã União Social Cristã, da Baviera (ambas de sólida votação, mas sem ter maioria) – 40%.
FDP (como costumo dizer, um DEM sem tradição de coronéis, de fato liberal, participante da atual coligação de governo) – 4%.
SPD (o Partido Social-Democrata que, sob a liderança de Peer Steinbrück, tem oscilado demais nas pesquisas, com leve tendência para baixa graças a declarações desastradas de seu líder) – 23%.
Verdes (às voltas com um “pequeno ou grande escândalo” graças à admissão por Daniel Cohn-Bendit, um dos “heróis de 68”, de que teria praticado alguma forma de transa sexual com crianças há trinta ou quarenta anos atrás) – 14%.
Linke (à esquerda, partido profusamente atacado ou desprezado pelos demais como “remanescente da DDR) – 9%.
Piratas (alguns meses atrás, a sensação do momento, hoje em queda) – 3%.
Alternativa para a Alemanha (anti-euro) – 2%.
Algumas considerações sobre os números:
1) A CDU/CSU fica por aí. Não vai crescer nem decrescer muito, a menos que haja algum terremoto escandaloso, o que não é provável.
2) Com 4%, o FDP ficaria fora do Bundestag, comprometendo a coligação hoje no governo. A cláusula de barreira é de 5%.
3) Peer Steinbrück já declarou que só faria coligação com os Verdes. Mas… a ver.
4) Esta coligação teria 37% dos votos no Parlamento. Insuficientes para formar um governo.
5) 9% para a Linke seria um bom resultado. O partido já andou pelos 6%.
6) Linke + SPD + Verdes = 46%, próximo do que os analistas alemães consideram razoável para formar um governo. Mas a coligação é impossível. A esquerda da Linke a rejeitaria, a direita do SPD e o coração dos Verdes também. Divisor de águas, além de questões econômicas: SPD + Verdes são entusiastas da OTAN. A Linke não.
7) Os Piratas se enredaram nas próprias pernas, com delcarações desastradas de algumas de suas lideranças, entre elas a de que o seu crescimento vertiginoso anterior só teria paralelo na do Partido Nacional-Socialista (Nazista) antes da Segunda Guerra. Cabelos se erriçaram, adrenalina circulou, etc. Eles não tem nada a ver com o anterior e (felizmente) finado PNS, mas só a comparação derribou-os nas pesquisas.
8) Para o Alternativa, qualquer votação igual ou acima de 3% seria uma vitória no momento, como partido criado há um mês atrás, mesmo sem entrar no Bundestag. Só o fato de roubarem votos do FDP, e assim impedir que este partido permaneça no Parlamento e no governo lhes valeria um cacife em próximas eleições. A chanceler Merkel tem procurado fazer “vista grossa” para o Alternativa, mas esta estratégia vem sendo contestada no interior de seu próprio partido.
A menos que o SPD e a CDU/CSU decidissem reeditar a já famosa e surrada “Grande Coalizão”, a formação de um governo alemão, neste quadro, ficaria “sub judice” no plano político.
O que isto demonstra? Demonstra que apesar de declarações “otimistas” em contrário, a cena política alemã está bastante complicada. E a complicação vem das diferentes avaliações sobre o cenário europeu, tanto da parte das lideranças quanto da parte dos liderados. Há o temor de que a Zona do Euro se desagregue, o que provocaria uma violenta queda -pelo menos imediatamente – nas exportações alemãs, com agravamento do desemprego, além de provocar o renascimento/recrudescimento de tensões e conflitos nacionais e regionais.
Há o temor de que a Alemanha consolide a visão alheia de ser, ao mesmo tempo, o primo rico e o cisne (patinho, não!) feio da U. E., opressor e arrogante.
Enfim, a eleição parece pautada pelo temor, mais do que pelo desejo, ou pela preferência por projetos. Até porque a distinção entre os projetos – da CDU/CSU/FDP, face ao SPD/Verdes – não é muito clara, todos se pautando, nos fundamentos, pelas opções emanadas da ortodoxia econômica hoje dominante entre as lideranças da União Europeia.
Enquanto isto, a(s) esquerda(s) permanecem desunidas. Não se pode negar que tanto Verdes quanto Linke(s) cresceram por serem ou atraírem dissidências do SPD, quando este se tornou um partido dominado por geriatrias e aderiu ao programa neo-capitalista pós-Reagan, Tatcher, João Paulo II e Cia. Ilimitada. Mas os Verdes se deixaram atrair por este redemoinho neo-liberal, em grande parte – o que ajuda a explicar o crescimento regional dos Piratas em algumas eleições anteriores.
Houve uma aliança instável, durante algum tempo, entre os três partidos últimos citados, na prefeitura de Berlim, por exemplo. Os Verdes a romperam, quando da última eleição, por quererem apresentar candidatura própria. Na eleição que se seguiu, o candidato à reeleição, pelo SPD, Klaus Wowereit, com o maior número de votos, se decidiu por fazer uma aliança com a CDU/CSU, para ter uma maioria sólida no Parlamento da cidade. Com os Verdes a maioria seria muito pequena, e com a Linke apenas, não haveria esta maioria.
Este “impasse equilibrado” no país-chave para as políticas econômicas na Europa mostra que a dificuldade política em que a U. E. está imersa é maior do que parece à primeira vista. E que a crise pode durar muito mais do que se pensa inicialmente: aliás, segundo o relatório elaborado pelo National Intelligence Council para o presidente Obama, entregue na Casa Branca em janeiro de 2013, depois da sua posse para o segundo mandato, ela deve durar pelo menos um decênio.