Militante do Movimento Negro Unificado (MNU) e atual secretário estadual de combate ao racismo do PT da Bahia, Nei concedeu a entrevista abaixo ao companheiro Clédisson Junior, que é militante do coletivo Enegrecer e membro da Coordenação Nacional da DS.
Na entrevista ele fala sobre o início da sua militância pela questão racial, da importância deste debate no interior do PT e de sua candidatura à Secretaria Nacional de Combate ao Racismo do PT.
Nei nos fale sobre o inicio da sua militância.
Ivonei Pires – Minha entrada no Movimento Negro Unificado se deu após eu iniciar um curso de teatro amador. O Brasil ainda vivia na ditadura militar e até então eu não tinha consciência étnico-racial, não compreendia as dificuldades que os negros atravessaram ao longo da história. Ao entrar no MNU e adquirir essa consciência, vi despertar a vontade de lutar contra o racismo.
Não era fácil ser militante do MNU. Os membros da organização queriam saber por que você queria entrar, davam livros pra você ler, e no final, se você concordasse com o modo de ação do MNU, você podia entrar no movimento. Então primeiro você era formado politicamente para depois se filiar.
A partir daí, resolvi construir minha vida, minha trajetória política e as transformação da sociedade pala via da questão racial. Depois fiquei cada vez mais interessando e participava das reuniões; três anos depois fui pra direção, cheguei a ser coordenador estadual e municipal do MNU e hoje faço parte da Coordenação Municipal do MNU em Salvador.
Na sua avaliação, o que organiza a pauta política do movimento negro brasileiro?
Ivonei Pires – Se não incluir os negros, não haverá mudança no Brasil. Precisamos Falar da educação, saúde, da violência que atinge extremamente o nosso povo. Podemos também falar aqui da quantidade de negros e negras que estão hoje em presídios. Então, nossa ação é no sentido de construir uma sociedade inclusiva, onde negros, índigenas, mulheres possam conquistar o seu espaço.
O MNU sempre conduziu sua militância pra atuar na política geral, seja no local de trabalho, nos sindicatos, nos grêmios e diretórios estudantis, nas associações de moradores, nos partidos políticos. E isso tá dito em nosso estatuto, que onde tiver um negro ou uma negra, o MNU tem que estar lá combatendo qualquer forma de racismo. Ao longo desses últimos 30 anos, o MNU tem formado muita gente para atuar na política brasileira e levar essa pauta para o centro do debate político nacional.
Atualmente você é o secretario de combate ao racismo do PT da Bahia, nos fale sobre essa experiência.
Ivonei Pires – Hoje como secretário estadual de Combate ao Racismo do PT da Bahia, sei que estou cumprindo uma tarefa que me foi delegada desde que entrei no movimento negro.
Eu levo os princípios do MNU, a característica de atuação chamando todas e todos os militantes que são de outras organizações do movimento negro e que se referenciam no PT, para construirmos a unidade do nosso povo. Essa tem sido a marca da nossa Secretaria.
Como você avalia a contribuição dos negros e negras na construção do Partido dos Trabalhadores?
Ivonei Pires – Eu costumo dizer que o PT é um partido de maioria negra, sejam os seus filiados, militantes e simpatizantes. É nítido que a grande maioria desta base é composta por negros e negras, podendo ter diferença entre um estado ou outro.
Sempre colocamos que o programa tem que ser a luta de raça e de classe. A contribuição dos negros sempre foi debatida como elemento fundamental pelo Florestan Fernandes, sociólogo que contribuiu com a formação do PT, que sempre defendeu que para melhorar o Brasil, tem que igualar todos: índios, negros e brancos.
Florestan elaborou muito sobre o racismo no Brasil e a situação da militância negra dentro do PT. Se hoje temos resoluções no PT envolvendo mulheres, negros, juventude, LGBT, Meio Ambiente, Sindical, é porque essa militância continua atuante no partido.
O PT foi criado para aqueles/as que necessitam de um instrumento de luta política que combata o racismo e a desigualdade na cena pública e institucional. Desde a nossa fundação combatemos a ideia de que não existe racismo no brasil.
Em sua avaliação, quais são as tarefas a serem desempenhadas para que o combate ao racismo ganhe centralidade nos processos internos do partido assim como na relação com a classe trabalhadora?
Ivonei Pires – O Brasil foi o último país que aboliu a escravidão, que enriqueceu com a mão de obra negra escravizada e não podíamos de forma alguma continuar reproduzindo formulações e programas a partir de experiências de outras realidades da classe trabalhadora principalmente as européias. Era preciso fazer a leitura de que um país da dimensão do Brasil também enfrenta tensionamentos étnico-raciais.
Quando resolvemos enfrentar esse debate franco e direto dentro do PT, começamos um debate que estava para além das tendências internas, pois, como todos sabemos, a maioria das tendências sempre se espelhou na formulação política européia, ou seja, esse debate nunca tinha sido feito, porque não havia o reconhecimento do Brasil como um país racista.
Dentro do partido esse debate não tinha grandes diferenças mesmo entre as correntes mais à esquerda ou mais ao centro. Quando começamos essa discutição muitos negros que integravam as tendências não concordavam com essa elaboração por conta dessa formação teórica eurocêntrica. A classe trabalhadora, nessa perspectiva, não tinha raça, nem gênero.
É necessário cada vez mais no interior do PT – que se transformou no maior partido da América Latina – que o debate da questão racial esteja presente em todos os momentos da nossa construção, pois isso vai determinar nosso avanço tanto qualitativo quanto quantitativo na condução dessa pauta política tão cara a classe trabalhadora.
Como você pretenda apresentar à militância negra petista sua candidatura à Secretaria Nacional de Combate ao Racismo?
Ivonei Pires – Hoje apresentamos uma candidatura para o conjunto do Partido dos Trabalhadores, uma proposta que não se encerra em uma corrente política, mas busca o diálogo com todas que desejam construir um novo período para a Secretaria Nacional de Combate ao Racismo, sem perder o foco no processo de transição ao socialismo.
Nossos esforços visam construir uma nova correlação de forças, do tamanho da nossa presença na composição da sociedade brasileira. O primeiro passo para mudar essa correlação de forças é mudar o PT.