A invasão israelense aos barcos que levavam ajuda humanitária aos palestinos aconteceu ainda em águas internacionais, às 4h da manhã (22h no horário de Brasília), a 130 quilômetros da costa de Gaza. A frota partiu de Chipre no domingo, e as comunicações com os barcos foram interrompidas após o ataque.
Lúcio Costa *
Os barcos transportavam dez mil toneladas de ajuda e cerca de 700 pessoas, entre elas, cidadãos de Turquia, Grécia, Espanha, França, Alemanha, Suécia, e Dinamarca. Também estavam a bordo a ganhadora do Prêmio Nobel da Paz Mairead Corrigan Maguire, da Irlanda do Norte, legisladores europeus e Hedy Epstein, de 85 anos, sobrevivente do Holocausto. Há dezenas de feridos e pelo menos dez mortos. As identidades das vítimas não foram divulgadas. Em comunicado, a Marinha de Israel disse ter respondido a disparos que partiram das embarcações durante a abordagem.
Israel decretou um bloqueio quase total à entrada de mercadorias na Faixa de Gaza desde 2007, mas afirma que permite a entrada de 15 mil toneladas de suprimentos de ajuda humanitária a Gaza a cada semana. A Organização das Nações Unidas diz que isso é menos de um quarto do necessário.
Comunidade internacional condena ação do Estado Sionista
– O que Israel cometeu a bordo da Frota da Liberdade foi um massacre – disse o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, que declarou três dias de luto na Cisjordânia e pediu que o Conselho de Segurança da ONU se reúna para discutir o caso.
O líder do Hamas, Ismail Haniyeh, que governa a Faixa de Gaza, pediu que o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, intervenha.
O governo turco respondeu com indignação, retirou seu embaixador de Telaviv e denunciou um “homicídio cometido por um Estado”. “Um Estado que cometeu esses crimes perdeu toda a legitimidade ante a comunidade internacional”, afirmou o chanceler Ahmet Davutoglu, durante reunião emergencial do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).
Os membros do Conselho de Segurança da ONU deploraram, na segunda-feira, 31 de maio, o ataque israelense contra uma frota humanitária destinada aos palestinos e pediram o fim do bloqueio contra Gaza.
Em declarações individuais antes de um eventual pronunciamento oficial do Conselho de Segurança, seus 15 membros tomaram a palavra, quase todos para condenar o ataque israelense que matou uma dezena de pessoas. “Está mais claro do que nunca que as restrições israelenses ao acesso a Gaza têm de ser levantadas, tal como exige a resolução 1860 do Conselho de Segurança”, disse o representante da Grã-Bretanha, Mark Lyall Grant. Segundo Grant, “o atual bloqueio é inaceitável e contraproducente”. França, Rússia e China – também membros permanentes com direito a veto – pediram o fim do bloqueio e uma investigação independente da tragédia.
Brasil condena terrorismo
O governo brasileiro, através de nota do Itamaraty, condenou em termos veementes a ação israelense e chamou o embaixador do país no Brasil para manifestar sua “indignação”. Segundo a nota, “a Representante do Brasil junto à ONU foi instruída a apoiar a convocação de reunião extraordinária do Conselho de Segurança das Nações Unidas para discutir a operação militar israelense”.
Por fim, é de registrar que o ataque terrorista do Estado sionista revela de forma trágica onde está a ameaça à paz e à democracia no Oriente Médio: no Estado de Israel.
O Oriente Médio e o mundo se fazem menos seguros, para usar a expressão da Secretária de Estado estadunidense, Hillary Clinton, não pelo programa nuclear iraniano ou pelas recentes iniciativas diplomáticas de Brasil e Turquia para lograr um acordo nesta questão, mas sim, pela política belicista e racista de Israel – Estado sustentado a peso de ouro pelo governo norte-americano – de não reconhecimento do direito do povo palestino à autodeterminação, a criação de um Estado Palestino.
Leia a íntegra da nota do governo brasileiro:
Com choque e consternação, o Governo brasileiro recebeu a notícia do ataque israelense a um dos barcos da flotilha que levava ajuda humanitária internacional à Faixa de Gaza, do qual resultou a morte de mais de uma dezena de pessoas, além de ferimentos em outros integrantes.
O Brasil condena, em termos veementes, a ação israelense, uma vez que não há justificativa para intervenção militar em comboio pacífico, de caráter estritamente humanitário. O fato é agravado por ter ocorrido, segundo as informações disponíveis, em águas internacionais. O Brasil considera que o incidente deva ser objeto de investigação independente, que esclareça plenamente os fatos à luz do Direito Humanitário e do Direito Internacional como um todo.
Os trágicos resultados da operação militar israelense denotam, uma vez mais, a necessidade de que seja levantado, imediatamente, o bloqueio imposto à Faixa de Gaza, com vistas a garantir a liberdade de locomoção de seus habitantes e o livre acesso de alimentos, remédios e bens de consumo àquela região.
Preocupa especialmente ao Governo brasileiro a notícia de que uma brasileira, Iara Lee, estava numa das embarcações que compunha a flotilha humanitária. O Ministro Celso Amorim, ao solidarizar-se com os familiares das vítimas do ataque, determinou que fossem tomadas providências imediatas para a localização da cidadã brasileira.
A Representante do Brasil junto à ONU foi instruída a apoiar a convocação de reunião extraordinária do Conselho de Segurança das Nações Unidas para discutir a operação militar israelense.
O Embaixador de Israel no Brasil está sendo chamado ao Itamaraty para que seja manifestada a indignação do Governo Brasileiro com o incidente e a preocupação com a situação da cidadã brasileira.
* Lúcio Costa, advogado, é secretário de relações internacionais do PT-RS.