Reproduzimos a seguir Entrevista da Prefeita petista Luizianne Lins, candidata a reeleição, publicada no último dia 26/08 no Jornal Valor Econômico. Luizianne que subiu 5 pontos percentuais nas últimas pesquisas, reassumiu a liderança da disputa contra Praticia Saboya (PDT/PSDB) e Moroni Torgan (DEM/PP).
Publicado originalmente no Jornal Valor Econômico
Por Raquel Ulhôa
Luizianne quer Lula na campanha: “Fortaleza foi a capital petista que lhe deu o maior percentual de votos. Ele deve isso (a nós)”
A prefeita Luizianne Lins (PT) disputou em 2004 contra a vontade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que defendia apoio do partido a Inácio Arruda (PC do B). Eleita, trabalhou ativamente para a reeleição de Lula em 2006. Agora candidata à reeleição, cobra de Lula apoio no primeiro turno. “Ele deve isso a quem lhe deu 67,5% dos votos em Fortaleza em 2006”, diz. Mesmo sem Lula no palanque, a prefeita, que vinha se mantendo atrás do candidato do DEM, Moroni Torgan, passou a liderar a disputa, segundo pesquisas de ontem.
O presidente mantém distância no primeiro turno porque a senadora Patrícia Saboya (PDT), também da base aliada, concorre. E não quer desagradar o deputado Ciro Gomes (PSB), que apóia Patrícia embora o PSB esteja coligado ao PT. A prefeita critica a postura de Ciro, “que a cada eleição pensa de um jeito”, e diz que Lula não pode se render à “ambigüidade política” do deputado.
Em entrevista ao Valor, a prefeita diz que sua eleição abriu “novo ciclo político de poder” no Ceará e por isso tornou-se a principal adversária do senador Tasso Jereissati (PSDB), que governou o Estado três vezes e elegeu dois sucessores. “A turma viu que a gente não veio para brincar e está construindo um novo projeto político econômico para o Estado, então está tentando recuperar o poder” afirma.
Luizianne compara Tasso – que pôs fim à “política dos coronéis” no Ceará – a um “coronel eletrônico”. Diz ela: “O curral (eleitoral) virou o curral eletrônico. Ele tem uma televisão, para servir à política dele.”
Nesta campanha, Luizianne enfrenta oposição hostil de evangélicos. Em outdoors espalhados na cidade pela Convenção de Ministros das Assembléias de Deus Unidas do Ceará (Comaduec), é chamada de “Jezabel” (princesa fenícia que combatia o Deus de Israel e perseguiu profetas, segundo o Antigo Testamento). Para a prefeita, a entidade está sendo “instrumentalizada” pela campanha concorrente.
Apesar das críticas a Ciro, a prefeita reafirma o compromisso do PT do Ceará com a reeleição do governador Cid Gomes (PSB), seu aliado e irmão do deputado. Ao Valor, Ciro disse não acreditar que o PT vá apoiar a reeleição de Cid, assim como não o apoiará para presidente em 2010. A seguir,a entrevista da prefeita ao Valor.
Valor: Ciro está certo ao avaliar que o PT não apoiará a reeleição de Cid?
Luizianne Lins – Até que se prove o contrário, somos aliados de um projeto duradouro de poder. Se não houver mudança de conjuntura, se Cid continuar nosso aliado político estratégico, é inconteste que será nosso candidato a governador. Talvez o Ciro diga isso por ter dificuldade de imaginar projetos políticos que se firmam e pessoas que acreditam e confiam umas nas outras. De gente que a toda eleição muda de conversa e diz uma coisa diferente, não se pode esperar perspectiva futura. Não é o caso do Cid, um homem sério que tem se mostrado cumpridor de palavra.
Valor: Mas, sendo reeleita, a senhora não será forte candidata para o governo do Estado?
Luizianne – Jamais serei candidata a governadora contra a reeleição do Cid, se ele permanecer com a inteireza política que vem demonstrando. Não por causa do Ciro. Por causa do Ciro eu já seria oposição ao irmão.
Valor: E com relação à candidatura de Ciro para presidente?
Luizianne – Esse é um debate que o partido vai fazer nacionalmente. Sou membro do Diretório Nacional e posso atestar que o partido nunca fez essa discussão. Nunca tratamos disso. É justificativa que o deputado está arranjando para a posição dele. É claro que, como política se faz com gestos, esse tipo de comportamento do deputado Ciro Gomes, que a cada eleição pensa uma coisa ou apóia uma pessoa diferente, nos causa desconfiança e estranhamento.
Valor: A senhora pretende disputar o Senado em 2010?
Luizianne – A minha intenção é ser prefeita mais quatro anos de Fortaleza, cidade que a gente está começando a reconstruir do zero. Uma das cidades mais difíceis de governar, a quarta do país em população (2,5 milhão), que acumulou problemas de saúde, educação, habitação e infra-estrutura. Temos uma explosão demográfica.
Valor: Como a senhora responde às críticas de falta de gestão?
Luizianne – Eu recebi essa prefeitura devendo R$ 278 milhões de restos a pagar e fornecedores com quatro, cinco meses em atraso. Peguei a cidade quase inviabilizada financeiramente. A folha de pagamento era de R$ 40 milhões e a prefeitura não tinha esse dinheiro . Se eu não tinha dinheiro nem para pagar o servidor, quanto mais para fazer investimento. Só o Hospital da Mulher, que estamos construindo, vai ser obra de R$ 60 milhões de reais. Cada Cuca (Centro Urbano de Cultura, Arte, Ciência e Esporte), um grande projeto de política pública para juventude, custa R$ 10 milhões e vou fazer seis.
Valor: De onde vem o dinheiro?
Luizianne – Nesses três anos e meio só corri atrás de dinheiro. O financiamento do Cuca é do BID (Banco Interamericano). E os recursos para o Hospital da Mulher vêm de emenda de bancada parlamentar e do Orçamento da União. Vamos ter o Transfor (obra de R$ 86 milhões, financiada pelo BID), projeto de transporte urbano que vem desde o governo passado e nunca deslanchou por falta de recursos. Mais de 100 mil pessoas moram em áreas de risco. A média anual do Orçamento é de R$ 2 bilhões e pouco. Só o IJF (hospital geral) consome cerca de R$ 110 milhões, que é mais que a arrecadação do IPTU do ano passado, e 50% da internação é do povo do interior. Nunca o governo do PSDB construiu um hospital no interior do Estado. Por que os modernos, os mudancistas, nunca construíram hospital? Os 20 anos de neoliberalismo tucano devassaram o interior do Estado.
Valor: E a modernização promovida pela gestão tucana?
Luizianne – Quando ele (Tasso) foi eleito em 86, vinha com uma crítica aos coronéis. Eles estabeleceram a figura do coronel eletrônico. O curral virou o curral eletrônico. Ele tem uma televisão, para servir a ele e à política dele. Eles tinham um modelo de industrialização do interior do Estado que não vingou. Deram, durante esses 20 anos, em torno de R$ 4 bilhões de renúncia fiscal para atrair empresas. Arrebentaram a agricultura familiar e muitas dessas empresas, quando tiveram que pagar o que o Estado investiu com essa renúncia fiscal, se mandaram. O único lugar onde teve impacto de empregos foi Sobral, onde a Grandene se instalou. Nos outros lugares as empresas quebraram e foram embora. Não ficou nem agricultura nem indústria.
Valor: A senhora se tornou a maior opositora de Tasso. Por que?
Luizianne – A nossa eleição de 2004 abriu novo ciclo político de poder no Ceará. Eu não sou filha do poder econômico do Estado nem do poder político. A turma viu que a gente não veio para brincar, que está construindo um novo projeto político econômico para o Estado, e está tentando recuperar o projeto.
Valor: O presidente vai participar da campanha?
Luizianne – Fortaleza foi a capital administrada pelo PT que deu o maior percentual de votos a Lula. Ele deve isso (a nós). O DEM e o PSDB estão do outro lado, são inimigos políticos ideológicos de classe contra o projeto político do Lula. Eu não vou medir esforços para convencer o presidente que a presença dele é muito importante no 1º turno.
Valor: Mas ele não quer problemas com o Ciro, que apóia a senadora Patrícia.
Luizianne – Ciro transita numa ambigüidade política que vai do Tasso ao presidente Lula. Só que isso não pode ser uma amarra para nós, porque são dois lados antagônicos, projetos políticos antagônicos, e o PSDB quer destruir o projeto nacional popular do PT. Não podemos ficar nos rendendo à ambigüidade do juízo político do Ciro. (RU)
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