Inegavelmente, o Twitter é uma ferramenta nova e poderosa para a troca de informações e interatividade. Ainda terá um amplo campo de crescimento no Brasil, possivelmente ocupando um papel cada vez maior na difusão de informação. Porém, um ocorrido no Rio Grande do Sul na semana passada mostra que seu potencial não está isento de mau uso e má fé.
Erick da Silva *
O Twitter, aliado aos blogs e a outras redes de relacionamentos, permite uma situação de amplidão nas trocas livres de opiniões, notícias e todo e qualquer tipo de manifestação, e a tendência é que o uso da ferramenta seja fortalecido pelo ineditismo da possibilidade de rompimento com o bloqueio dos grandes meios de comunicação, principalmente quanto ao acesso e difusão do conhecimento. Se afirmam que caminhamos para uma “sociedade do conhecimento”, nada mais potencialmente “revolucionário” que a construção de meios que rompam com a hegemonia na reprodução dos saberes.
Mas se existe essa potencialidade, ela ainda tem um caminho a ser trilhado e, por vezes, a velocidade da difusão, aliada a um instantaneísmo de pouca capacidade crítica, permitem que se gerem “mal-entendidos” e interpretações errôneas de alguns fatos.
Um exemplo disso ocorreu quinta-feira, 22 de abril, quando o “Trending Topics” do Brasil ou TTBrs, uma lista em tempo real dos nomes mais comentados no Twitter no país, apresentava no topo o nome de Edson Portilho. Me causou de imediato uma certa estranheza, afinal, o Professor Edson Portilho, da cidade de Sapucaia do Sul (região metropolitana de Porto Alegre/RS) não tinha realizado nenhuma ação, nesses últimos dias, que tenha ganhado amplo destaque nos meios de comunicação gaúchos.
Ao verificar do que se tratava, constava da aprovação de uma lei do Deputado Edson Portilho que permitiria a tortura e o sacrifício de animais. Descobri que esta denúncia, aparentemente, teve orígem em uma notícia vinculada pela Agência de Notícias dos Direitos dos Animais (ANDA) no dia 19 de abril. A informação original era descontextualizada, com informações vagas e fechava fazendo um pedido: “Divulgue, para que Edson Portilho não se eleja para mais nenhum tipo de cargo”. Em seguida, foi noticiada por outros blogs e sites em uma difusão crescente, sendo atendida em seu apelo e, dois dias depois de publicada, era o tema mais comentado no Twitter.
Passada a estranheza inicial, logo percebi que se tratava de uma grande confusão, e que ganhava, rapidamente, um corpo de “verdade”. Para começar, Edson Portilho não é mais deputado desde 2006, atualmente é vereador em seu município de origem.
A suposta lei da “tortura” ao animais foi aprovada em 2004, e se trata uma lei de âmbito estadual, já que o Professor Edson era então deputado na Assembleia Legislativa do RS. A lei que gerou a “campanha” com tons de denúncia, não fala de tortura de animais, mas versa a respeito das religiões de matriz africana, onde os animais utilizados nos cultos não são “torturados” com requintes de crueldade (como alguns afirmaram) e nem é irrestrita para toda e qualquer espécie de animal.
Cabe destacar que Edson Portilho tem notada atuação no combate ao racismo, e essa sempre foi uma marca importante de seus mandatos e sua vida pública. Nesse aspecto, a ação observada no Twitter não deixa de transparecer um forte componente de intolerância religiosa.Na época da aprovação da lei, geraram-se protestos por parte de alguns segmentos, como alguns ligados aos evangélicos e alguns “ambientalistas”. Foi mal disfarçada a intolerância com as práticas e manifestações religiosas de matriz africana, o que não chega a ser uma novidade para os adeptos dessas religiões, perseguidos historicamente em todos os cantos do Brasil.
Esses e outros aspectos do tema não foram levados em consideração pelas milhares mensagens no Twitter. A difusão em blogs e sites, a criação de micro-blogs, de uma campanha “Fora Edson” etc. já dava vasão a um fato que, no mínimo, estava descontextualizado. Sem haver o menor cuidado com um princípio básico de se verificar de onde vem a informação
O saldo final não deixa de ser um tanto perverso e demonstra o mal-uso que uma potente ferramenta como o Twitter pode ter. Para muita gente, qualquer desmentido e recolocação dos fatos talvez não seja mais eficaz, pelo próprio caráter efêmero e instantâneo da “denúncia”, e explicita o longo caminho que ainda temos para uma melhor capacidade crítica e cidadã da rede por um número maior de pessoas.
(*) Erick da Silva é estudante de História e blogueiro http://aldeia-gaulesa.blogspot.com. Foi secretário municipal de juventude do PT de Porto Alegre 2007/2008.
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