Democracia Socialista

Na ditadura, imprensa foi alvo de terrorismo de direita | Antonio Alonso

“Não boto bomba em banca de jornal e nem em colégio de criança, isso eu não faço, não”. O recado de João do Santo Cristo na música Faroeste Caboclo, do Legião Urbana, faz referência à série de atentados da extrema direita e de setores da “linha-dura”, especialmente nos anos finais da ditadura no Brasil.

Se nos dias de hoje a imprensa livre e plural incomoda governantes, ministros e poderosos, ela já era alvo preferencial nos anos da ditadura. Embora muitos desses ataques terroristas na época tenham sido assumidos por organizações como a Aliança Anticomunista Brasileira (AABB) ou o Comando de Caça aos Comunistas (CCC), invariavelmente elas terminavam em impunidade.

O Centro Sérgio Buarque de Holanda tem em seu acervo imagens do terceiro atentado terrorista da direita contra a sucursal do jornal Em Tempo, em Belo Horizonte (MG), ocorrido há exatos 40 anos, em 8 de julho de 1979.

No período, bancas de jornais também foram incendiadas em ações simultâneas em várias cidades do país. Os atentados ocorriam na madrugada, visando os quiosques que vendiam jornais independentes e de oposição ao governo. Ao longo do ano seriam alvos de bombas livrarias, redações de jornais de esquerda, escolas e entidades engajadas na luta pela redemocratização, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Era a “direita explosiva” em ação.

Os atentados de 1980 isolaram ainda mais a ditadura, mas aplicaram um duro golpe na imprensa independente e de oposição. Aterrorizados pelos ataques, que se intensificariam até setembro, os donos de bancas deixaram de vender os alternativos “Em Tempo”, “Movimento”, “Tribuna da Luta Operária”, “Companheiro”, “O Pasquim”, “Hora do Povo” e outros.

O terror de direita, que já havia atuado em períodos anteriores à ditadura, voltou a agir a partir de janeiro de 1980, coincidindo com o retorno dos anistiados à atividade política. Como aconteceu em 1968, com os ataques do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), e em 1976, com a Aliança Anticomunista Brasileira (AAB), os atentados deste período ficariam impunes. Abaixo, uma lista dos ataques da “direita explosiva” em 1980 e 1981.

1980

·  18/01 – desativada bomba no Hotel Everest, no Rio, onde estava hospedado Leonel Brizola.
·  27/01 – bomba explode na quadra da Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, no Rio, durante comício do PMDB.
·  26/04 – bomba explode em uma loja do Rio que vendia ingressos para o show de 1º de Maio.
·  30/04 – em Brasília, Rio, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Belém e São Paulo, bancas de jornal começam a ser atacadas, numa ação que durou até setembro.
·  23/05 – bomba destrói a redação do jornal “Em Tempo”, em Belo Horizonte.
·  29/05 – bomba explode na sede da Convergência Socialista, no Rio de Janeiro.
·  30/05 – explodem duas bombas na sede do jornal “Hora do Povo”, no Rio de Janeiro.
·  27/06 – bomba explode na sede do Sindicato dos Jornalistas, em Belo Horizonte.
·  11/08 – bomba é encontrada em Santa Teresa, no Rio de Janeiro, num local conhecido por Chororó. Em São Paulo, é localizada uma bomba no Tuca, horas antes da realização de um ato público.
·  12/08 – bomba fere a estudante Rosane Mendes e mais dez estudantes na cantina do Colégio Social da Bahia, em Salvador.
·  27/08 – explodem três cartas-bombas no Rio: na OAB, matando a secretária da presidência, Lyda Monteiro; no gabinete de um vereador do PMDB e na redação do jornal “Tribuna da Luta Operária”.
·  04/09 – desarmada bomba no largo da Lapa, no Rio.
·  08/09 – explode bomba-relógio na garagem do prédio do Banco do Estado do Rio Grande do Sul, em Viamão.
·  12/09 – duas bombas explodem em São Paulo: uma fere duas pessoas em um bar no bairro de Pinheiros e a outra danifica automóveis no pátio da 2ª Cia. de Policiamento de Trânsito no Tucuruvi.
·  14/09 – bomba explode no prédio da Receita Federal em Niterói (RJ).
·  14/11 – três bombas explodem em dois supermercados do Rio.
·  18/11 – bomba explode e danifica a Livraria Jinkings, do ex-deputado e dirigente comunista Raimundo Jinkings, em Belém.
·   08/12 – bomba incendiária destrói o carro do filho do ex-deputado Raimundo Jinkings, em Belém.

1981

·  05/01 – outro atentado a bomba em supermercado do Rio.
·  07/01 – bomba explode em ônibus a serviço da Petrobras na Cidade Universitária, no Rio.
·  16/01 – bomba danifica relógio público instalado no Humaitá, no Rio.
·  02/02 – bomba colocada no aeroporto de Brasília é encontrada antes de explodir.
·  26/03 – atentado às oficinas do jornal “Tribuna da Imprensa”, no Rio.
·  31/03 – bomba explode no posto do antigo Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), em Niterói (RJ).
·  02/04 – atentado a bomba na residência do deputado Marcelo Cerqueira, no Rio.
·  03/04 – explosão de uma bomba destrói parcialmente a Gráfica Americana, no Rio.
·  28/04 – grupo Falange Pátria Nova destrói, com bombas, bancas de jornais de Belém.
·  30/04 – explosão mata um agente do DOI-Codi e fere outro, no momento em que preparavam atentado contra 20 mil pessoal no show de 1° de Maio no Riocentro.

Esse texto é um trabalho do Memorial da Democracia, o museu virtual do Instituto Lula e da Fundação Perseu Abramo, que é dedicado às lutas democráticas do povo brasileiro.