Como é ser mulher negra no Brasil ? Onde estão as mulheres negras? Todo mês de julho nos fazem essas mesmas perguntas, nós também nos fazemos essas perguntas com uma certa frequência, onde nós estamos? Quem nós somos? Para onde vamos?
Somos 55,6 milhões de mulheres negras no Brasil, isso corresponde a 25% da população. Se olharmos para os índices de desemprego e evasão escolar, infelizmente vamos ver a forte presença das mulheres negras. Mais da metade das pessoas que procuravam emprego no 4º trimestre de 2020 eram do sexo feminino e 60% se declarava de cor preta ou parda. Com o fechamento das escolas e o novo modelo de ensino (remoto), meninas negras estão expostas à evasão escolar com tarefas domésticas redobradas e sem acesso à ferramentas digitais para o acompanhamento das aulas, o trabalho infantil doméstico também atinge principalmente meninas, representando 94% do total, sendo 73% negras. Esses dados nos mostram como é perverso o cruzamento do racismo e do machismo para a vida das mulheres e meninas negras.
Desde ao longo da história mulheres negras resistem ao sistema dominador, violento e escravista que coloca nossas vidas a todo momento em uma grande disputa de sobrevivência. Força e coragem sempre foram requisitos da nossa existência, mulheres negras muitas vezes não podem demonstrar fraqueza, somos criadas para ser fortes e corajosas sempre, em qualquer situação temos que mostrar bravura.
Mas será mesmo que ser mulher negra é isso? Ser negra é muito mais que um sinônimo de força, somos mulheres que desejam e necessitam ser humanizadas, amadas e acalentadas. É como Bell Hooks cita, o sistema escravocrata e as divisões raciais criaram condições muito dificeis para que os negros nutrissem seu crescimento espiritual. É muito nítido que esse sistema escravocrata criou sim um impacto na nossa relação de amar. A nossa capacidade de reprimir sentimentos, no fundo, é anseio de experimentar um ambiente de intensa vulnerabilidade à dor. Quando nós, mulheres negras, nos deixamos ser transformadas por essa força de amar, derrubamos as estruturas sociais. Amar cria um um imenso quilombo entre nós, com amor criamos força e conseguimos seguir leve na luta contra o genocídio da nossa população.
Queremos muito mais que sobreviver, queremos viver, ter acesso a uma educação de qualidade, ter empregos justo com boa remuneração, queremos ter direito às nossas terras, queremos ter o direito à nossa memória, queremos ter direito à justiça, queremos políticas de reparação, queremos ter o direito de viver uma vida sem violência.
Um dos casos mais recentes de atrocidade e violência foi o de Kathlen Romeu, uma jovem negra, grávida que foi executada pela a PM do estado do Rio de Janeiro . A sensação que nós temos é de que em nenhum local que ocupemos estaremos seguras, as mulheres negras estão morrendo de fome, de covid-19 e pela a bala da polícia. Quem protege as mulheres negras? Por isso, precisamos urgente debater a segurança pública para as mulheres negras.
Nas eleições municipais de 2020 elegemos muitas mulheres pretas, foi um processo importantíssimo na luta das mulheres negras. Porém nesse exato momento são essas que agora estão sendo ameaçadas, maltratadas e violentadas nesse mesmo local, é primordial que as denúncias sejam feitas e as ações sejam cobradas. Pois como afirmou Marielle: Não aceitaremos ser interrompidas!
As mulheres negras têm sido fundamental e estado na linha de frente contra todas as crises, retrocessos e conservadorismo que enfrentamos nesse período. Convocamos o conjunto das e dos estudantes a se fazerem presentes nos atos contra esse governo da morte e se somarem com a UBES na resistência em defesa da vida, da segurança pública, das cotas raciais e por mais mulheres na política.
Neste dia 25 de julho trazemos a memória de Tereza de Benguela, líder do quilombo de Quiriterê, trazemos a memória de sua luta, de sua resistência, de sua liderança, mas também queremos trazer os quilombos como experiências concretas de sociabilidade, de trabalho e de relação com a natureza como modelo de vida em sociedade.
Por Dandara, Xica da Silva, Marielle Franco, Kathlen Romeu e muitas outras que resistiram e resistem todos os dias afirmamos: “Não queremos nem mais um minuto de silêncio e sim uma vida toda em voz alta.”
Pela vida, sustento, moradia e emprego às mulheres negras.
- Pâmela Layla é diretora de mulheres da UBES
- Publicação original: UBES