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O Bloco dos Juros Altos | Luiz Augusto Estrella Faria

As festas de Carnaval em Salvador são famosas pela brincadeira de dançar nas ruas da cidade seguindo os blocos que desfilam cada um atrás do seu trio elétrico. Entretanto, e de forma diferente do que é costume em quase todo o Brasil, a brincadeira não sai de graça. Para ocupar um lugar no cortejo é preciso comprar o abadá, a fantasia que dá acesso ao espaço logo atrás da frevioca, o carro onde a banda toca animando a festa. Quem não paga, não brinca.

Em outubro passado, Lula foi eleito para animar um outro tipo de brincadeira, bem mais importante que a folia carnavalesca. Como ele próprio resumiu: cuidar do povo, tão sofrido e maltratado pelo governo anterior. Cuidar é realizar obras e serviços que são fundamentais para a imensa maioria que carece de moradia, saneamento, transporte, saúde, educação e assistência. Nesse bloco, todos podem entrar e brincar com qualquer fantasia. Não há abadá.

Mas então quem paga os músicos e demais artistas que animam a festa? O governo, empregando os recursos da arrecadação de impostos e da dívida pública. As duas formas de financiamento têm uma grande diferença, já que a dívida tem um custo na forma dos juros pagos a investidores que “emprestam” para o governo. Problema: o Brasil é um dos países onde esses juros são os mais altos do mundo, razão do debate acirrado sobre o porquê dessa situação surgida às vésperas do Carnaval de 2023.

Além de pagar projetos, programas e investimentos do governo, a dívida tem outra importante função.

É através dela que o Banco Central faz a política monetária, aumentando ou diminuindo a circulação de moeda e fixando a taxa de referência para os juros de toda a economia. Assim, juros baixos reduzem a despesa do governo e tornam o financiamento mais barato, possibilitando que as empresas e pessoas possam gastar mais e investir em novos negócios e oportunidades. Quando os juros sobem, sobe o gasto financeiro e o governo é obrigado a cortar recursos das suas políticas; os investimentos diminuem e a economia reduz seu crescimento ou entra em recessão.

Os juros da dívida também são usados pelo Banco Central como meio de diminuir a inflação até uma meta decidida pelo governo. Guedes e Bolsonaro a fixaram em 3,25%. Entretanto, em razão da crise mundial da Covid-19 e da guerra na Ucrânia, a inflação cresceu muito entre janeiro de 2021 e abril de 2022, chegando a 12,13%. Já que a política de metas usa como arma exclusivamente o nível dos juros, na tentativa de atingir a meta estabelecida, foi feito um aumento forte e continuado dos mesmos, que estavam em 2% então e alcançaram 13,25% em julho de 2022. A inflação seguiu sua trajetória de queda continuada até chegar aos 5,77% de hoje. Entrementes, os juros continuaram subindo até 13,75% em agosto de 2022, onde permanecem. Como consequência dessa alta, a dívida bruta do governo subiu de 57,2% do PIB (3,9 trilhões) com Dilma para 73,5% (7,2 trilhões) deixados por Bolsonaro e Guedes.

Lula vem perguntando desde antes de assumir a presidência por que os juros não foram reduzidos com a queda da inflação? Se foi possível convencer o Congresso a aprovar a PEC da transição para viabilizar a volta do Bolsa Família, o aumento do salário mínimo e despesas com saúde e educação, por que o Banco Central não faz a sua parte liberando recursos hoje consumidos nos enormes pagamentos de juros?

Acontece que há quem ganhe com esses juros elevados: pessoas que têm dinheiro para aplicar em fundos financeiros que passam a render mais, os ricos que compram títulos do governo para seus investimentos. E há uma chusma de economistas “do mercado” e comentaristas na imprensa que só se informam com esses economistas, alegando a inflação fora da meta como razão para manter juros altos. Com a taxa atual, a dívida pública representa mais da metade do gasto do orçamento da União, custo do pagamento de juros e da recompra de títulos vencidos, o que só beneficia a elite do dinheiro.

Mas qual a razão de o Banco Central favorecer esses interesses? Há muitos anos, no Brasil, os diretores do Banco Central são sempre pessoas oriundas do mercado financeiro, diretores de bancos e fundos e assessores econômicos. Ora, os bancos e seus clientes são como aqueles blocos do carnaval soteropolitano, vivem de cobrar seu abadá, com a diferença de que nada fazem para animar a folia. Ainda mais, neste caso, o pagamento acaba com a diversão e a farra, pois retira recursos do governo que poderiam pagar a dança da melhora da vida do povo. Assim, é mais que necessário apoiar a determinação de Lula de enfrentar o Banco Central e sua predileção pelos ricos. (Artigo publicado originalmente no GRIFO Nº 33 de março de 2023)

Via Terapia Política

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