Jeferson Miola
“Artigo 1º – Fica instituída a Política Nacional de Participação Social – PNPS, com o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”.
O Artigo que abre este texto é a base do Decreto 8243, assinado pela Presidenta Dilma em maio deste ano. A oposição – PSDB, DEM, PPS – lidera movimentos no Congresso para sustar o Decreto presidencial. Com a proposição de Decretos Legislativos [PDC nº 1491 na Câmara e PDS nº 117 no Senado] que visam derrubar a proposta do governo, trancaram a pauta do Congresso, impedindo qualquer votação.
A justificativa do PDC nº 1491 é uma coleção de argumentos reacionários e retrógrados com a linguagem da guerra fria e apegados a uma visão medieval do mundo. Eles argumentam que “O Decreto presidencial corrói as entranhas [sic] do regime representativo, um dos pilares do Estado democrático de Direito ….”.
E, numa espécie de exorcismo, alertam para “os riscos aos quais as políticas públicas passam a se submeter, ante a necessária oitiva das decisões tomadas no âmbito do aberrante ‘sistema de participação social’ ”. Sim, eles dizem: “aberrante ‘sistema de participação social’ ”.
Advertem também para a “clara intenção da Presidente da República: implodir o regime de democracia representativa”. Para eles, é uma “tentativa de subversão da ordem constitucional posta, uma vez que a sanha autoritária da Presidente da República apenas aguarda o instante para se revelar e assumir o seu lugar”. Neste trecho embolorado, só faltou menção ao “ouro de Moscou”.
Defendem “a necessidade de se combater esta insanidade consolidada no Decreto nº 8243”. No dicionário reacionário, traduza-se por insanidade a participação da sociedade e a prática democrática de gestão.
Além disso, consideram a participação uma “ostensiva e flagrante inconstitucionalidade” a ser eliminada, mesmo que tal ato represente “ostensiva e flagrante inconstitucionalidade” que rompe o princípio da autonomia e independência dos Poderes da República.
A histeria da oposição é ainda mais excêntrica quando se sabe que o Decreto 8243 simplesmente articula e integra num sistema nacional, os vários mecanismos de participação previstos na Constituição e nas leis brasileiras.
É bom lembrar que estamos no terceiro milênio, no ano de 2014, no Brasil, América do Sul, e o planeta é a Terra. A despeito da inconformidade dos conservadores, o Brasil que inaugura o século XXI é o país que escolheu Lula e Dilma para liderarem um projeto de mudanças extraordinárias.
Essa é uma realidade insuportável para a elite reacionária que secularmente se valeu da exclusão política e de práticas autoritárias para viabilizar um padrão elevado de acumulação de riquezas e concentração de terras. É compreensível que PSDB, DEM e PPS se desdobrem para interditar esse novo Brasil – eles são saudosos daquele país arcaico da fala grossa e da obediência servil.
Essa elite sempre resistiu a mudanças; o Brasil foi o último país a acabar a escravidão, e a República nasceu abrindo guerra aos pobres – Canudos/Bahia, Chibata/RJ e Contestado/SC. Ao longo da história, subtraíram do povo direitos elementares, como da instrução e do acesso a escolas e Universidades, condenando nosso povo ao analfabetismo durante séculos.
Eles conservam um medo atávico do povo. Para eles, o povo continua sendo o escravo negro da senzala que está sempre prestes a se revoltar. É uma elite que, em pleno século XXI, ecoa as vozes da Casa Grande; se apavora com a possibilidade do povo se reunir, conhecer, participar, opinar, decidir.
Essa elite tolera somente aquela democracia que pode ser controlada, da eleição a cada quatro anos, dominada pelo poder econômico e organizada pelas regras que manejam e controlam.
O Brasil, porém, não é mais a colônia das capitanias hereditárias e da lógica patrimonialista. O país que finalmente é respeitado no mundo, tem hoje um povo que conquistou muito, adquiriu consciência de suas próprias possibilidades e quer mais mudanças para melhorar ainda mais a vida. Um povo que já não tolera o cabresto e o mandonismo, porque anseia por transparência e participação.
A sociedade brasileira não cabe mais dentro desta democracia limitada; quer mais espaço para exibir sua exuberante diversidade e ver atendidas suas urgências. O caminho aberto pela Presidente Dilma é um convite para que todos os Poderes – inclusive Legislativo e Judiciário –, e todas as esferas de governo – municipais e estaduais – aprofundem os mecanismos de expressão ativa da sociedade para aprimorar a gestão pública com transparência e melhorar a qualidade dos serviços públicos.
As experiências exitosas de gestão participativa comprovam a melhora da capacidade de planejamento estatal, a eficiência dos serviços públicos e a eficácia das políticas públicas. Melhoram também os indicadores de desenvolvimento e, em especial, se amplia o combate à corrupção.
A elite egoísta é contra o progresso e a modernização do Brasil com democracia e igualdade. Mas a agenda do país do século XXI é mais democracia, não menos; é mais república, não menos; é mais participação, não menos; é mais direitos, não menos; é mais cidadania, não menos.
O Decreto 8.243 traduz os pactos anunciados pela Presidente Dilma em junho de 2013, e é uma inspiração para o debate público sobre o padrão de democracia que necessitamos para responder aos desafios desse novo Brasil do século 21.
Seu debate amplo cria um ambiente apropriado para a discussão de outra necessidade democrática premente: da reforma política que responda à exigência de uma república moderna e fundada numa democracia que não seja comprada pelo dinheiro.
Artigo publicado originalmente em Carta Maior.
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