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O falecimento de Lenin

Lenin morreu vítima de doenças vasculares que o afetavam há algum tempo no dia 21 de janeiro de 1924. Transcrevemos a seguir um episódio de seus últimos momentos de vida, que evidencia quanto ele estava ciente da batalha que a revolução estava travando.

Um homem vaga sozinho na imensidão gelada do Extremo Norte canadense, esfomeado, exaurido. Está perdido, seu companheiro morreu: luta para atingir o litoral.

Um lobo o espreita. Mas um lobo doente, numa situação quase tão ruim como a sua, que não ousa atacá-lo enquanto o homem parece ainda conservar alguma força.

Enfim, sem forças para dar mais um passo, o homem cai por terra. O lobo, acreditando que sua hora chegou, aproxima-se e tenta apertar os dentes na carne do homem.  Mas ele próprio encontra-se tão enfraquecido pela doença que não consegue fechar as mandíbulas na presa. O homem é sacudido então por um último arranco: morde o lobo e é tamanha a energia do desespero que seus dentes abrem uma ferida na fera, cujo sangue ele bebe. O alimento lhe dá forças para continuar a caminhada. E ele atinge finalmente o litoral onde é salvo por um navio.

A novela de Jack London se chama Amor à Vida. Trata-se do último texto cuja leitura Lenin quis ouvir, dois dias antes de sua morte, em janeiro de 1924. Lenin gostava muito desta história. E faleceu com esta imagem de uma luta final e atroz entre um homem esfomeado e um lobo doente, no momento em que a jovem República soviética, exaurida, mas provisoriamente vitoriosa, consolidava-se com a NEP (”Nova Política Econòmica”, adotada em 1921, pouco depois do fim da guerra civil).

(Extrato do livro de  Robert Linhart, “Lenin, os camponeses, Taylor”. Rio de Janeiro, Ed. Marco Zero, 1983.)

A PERMANÊNCIA DA PAIXÃO MAIS ALEGRE – POR JUAREZ GUIMARÃES

Não existe paixão mais alegre do que a aspiração a viver em um mundo da liberdade, da igualdade, da paz e sem opressão das mulheres, onde se possa amar livremente. É por encarnar esta aspiração que a revolução russa, cem anos depois, se apresenta para nós como o acontecimento mais importante e promissor de toda a história da humanidade. Nunca se sonhou tão alto assim porque se chamavam homens e mulheres – enriquecendo a letra da bela canção –  e sonhos não envelhecem. E exatamente porque este sonho era demasiadamente humano – histórico, acometido de contingências e possibilidades de erros e descaminhos – ele não conseguiu se realizar.

“Vivemos conforme as ordens de Outubro, o fogo da aurora está no nosso olhar” –
Maiakóvski

A revolução russa de 1917 foi certamente o acontecimento mais rico em formas de auto-organização de um povo, em revolta e em emancipação contra um dos regimes de exploração e opressão dos mais brutais da história. Trabalhadores, mulheres, camponeses, soldados, intelectuais e artistas compuseram cenas memoráveis da liberdade, para sempre gravadas na memória da humanidade. Cena de paz: soldados russos e alemães se confraternizando no front. Utopias de igualdade: “por que um cozinheiro não podia também governar”, perguntava Lenin nos cadernos azuis de seu livro mais libertário, “O Estado e a revolução?” De novas formas de viver em harmonia, propunha Trotsky em “Literatura e revolução”.

E, enfim, pela primeira vez na história um Estado anti-patriarcal: direito de voto e de ser eleita para as mulheres, igualdade de salários, seguro maternidade, princípio da emancipação do trabalho doméstico, direito ao aborto e ao divórcio. Uma nova moral sexual baseada na liberdade, conclamava Kollontai. Desde 1922, o casamento homoafetivo foi legalizado, pessoas trans podiam ser admitidas no Exército e desde 1926 os cartórios já admitiam a mudança de sexo nos documentos oficiais.

Mas, se é preciso falar desta paixão mais alegre, é preciso também falar, como socialistas democráticos, da tragédia desta paixão. Houve um fatal desencontro entre revolução e democracia. E este desencontro, já presente como tensão nos inícios de uma revolução barbaramente sitiada por exércitos mercenários e estrangeiros, formou o fenômeno do estalinismo. Não deve haver remissão nem esquecimento nem justificação para os crimes contra os direitos humanos ali cometidos.

“Toda história é remorso? ”, pergunta o verso de Drummond.  Não: somos herdeiros de outubro, da paixão libertária mais alegre e do que aprendemos, para sempre, da tragédia desta paixão.

Para ler mais:
Revista Democracia Socialista de outubro 2017, nro. 6, o artigo “Lenin em 1905: uma revolução que abalou uma doutrina”, de Marcel Liebman.

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