Nas últimas semanas, deputados e senadores aprovaram com celeridade a Renda Básica Emergencial destinada a trabalhadoras e trabalhadores informais, autônomos, intermitentes, desempregados, artistas, caminhoneiros para que tenham condições mínimas de cumprir o isolamento social, achatar a curva de contágio do Covid 19 e conter um grande colapso no sistema de saúde do país. Neste grupo, estão as mulheres que assumem os postos de trabalhos mais precarizados e/ou menos têm acesso ao trabalho dito produtivo e remunerado pelo mercado. Isto implica diretamente nas suas condições de vida e nas relações sociais estabelecidas.
Entre as especificações de quem receberá a renda básica, os deputados e senadores aprovaram uma proteção diferenciada para mulheres que são chefes de família. Elas receberão mensalmente duas cotas do auxílio, chegando a R$ 1,2 mil. Defendemos que, agora mais do que nunca, a implementação da renda básica emergencial priorize as mulheres como titulares.
Essa proposição não nasce das pedras. A luta feminista por autonomia econômica e os resultados quantitativos e qualitativos do Programa Bolsa Família no Brasil dão elementos para seguir com a orientação adotada de priorizar as mulheres como agentes das políticas públicas.
Segundo estudo do Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG) aplicado ao Programa Bolsa Família, em que 92% são beneficiárias, são as mulheres responsabilizadas pelo trabalho doméstico e do cuidado que, de posse da renda, direcionam o recurso para o bem de toda a família. Também de acordo com o mesmo estudo, o acesso direto aos benefícios do Bolsa Família aumentou a capacidade de tomada de decisão das mulheres em relação às questões domésticas, impulsionando sua autonomia. A experiência de ter uma fonte de renda fez com que as mulheres se sentissem menos dependentes de seus parceiros e ampliassem suas perspectivas para a vida futura.
De acordo com a antropóloga Walquiria Domingues Leão Rêgo, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), uma revolução está em curso. Silenciosa e lenta. Essa é a definição quando analisa os resultados qualitativos do Bolsa Família. O estudo mostra que o interior do Piauí, o litoral de Alagoas, o Vale do Jequitinhonha, em Minas, o interior do Maranhão e a periferia de São Luís são territórios nos quais podem ser percebidos as mudanças provocadas pelo programa.
Para além das constatações das pesquisas, as mulheres populares já experimentam que quando têm condições de acesso e oportunidades às políticas públicas elas conseguem construir seus próprios destinos. Um exemplo são as mulheres da região Oeste Potiguar que têm demonstrado através dos seus grupos autônomos e pela Rede Xique Xique de comercialização solidária que é possível construir a autonomia através da renda.
Nesse período de pandemia do Covid 19, fica escancarado como o modelo neoliberal não enfrenta a crise e não promoverá qualquer política de redução das desigualdades. Ter uma renda emergencial com preferência para as mulheres é, no mínimo, uma obrigatoriedade.
São nesses momentos que a mão do mercado quer sugar do Estado para manter lucros dos empresários. Somente um Estado forte e democrático voltado para as pessoas pode garantir a defesa da vida de mulheres e homens. Para isso é necessário um Sistema de Saúde, Universidade e Pesquisa, Trabalho e Renda fortalecidos para serem aliados na luta contra às desigualdades de classe, raça e gênero, que estruturam a nossa sociedade.
Este modelo neoliberal é violento especialmente com as mulheres negras e pobres. No domingo (29), abordado sobre o aumento de 17% de denúncias de violência doméstica neste período de isolamento social, Jair Bolsonaro fez a seguinte declaração: “Tem mulher apanhando em casa. Por que isso? Em casa que falta pão, todos brigam e ninguém tem razão”. Uma fala perigosa que naturaliza um crime como uma briga comum, influenciando e autorizando homens a bater nas mulheres por estarem passando por um momento difícil. A fala de Bolsonaro esconde a causa real da violência contra as mulheres que é o machismo que não tira quarentena e está sempre a postos. Neste momento de crise é preciso priorizar a defesa da vida do povo e isso inclui renda e autonomia para que as mulheres possam enfrentar a violência sexista e dar passos na construção da igualdade.
As mudanças nos pilares que sustentam a hierarquia de poder entre homens e mulheres são complexas. Se faz necessário transformações profundas e estruturais. No entanto, o acesso à renda representa um patamar mínimo de autonomia.
Cada vez fica mais evidente para a maioria da população o caráter do atual governo que, na verdade, mesmo nessa crise se coloca como um inimigo do povo. Este é o momento de levantarmos ainda mais alto nossas bandeiras na luta por democracia que significa colocar fim imediato no mandato do neofacista e o patriarcal que ocupa a presidência. Nossa tarefa é lutar por um Estado democrático e popular que prioriza as pessoas e não os bancos e grandes empresas. E fazer a defesa de que as políticas públicas de provisão de renda e trabalho para as mulheres não durem apenas o período de pandemia, mas que sejam permanentes afim de que possibilite o acúmulo de forças em busca de alterar a lógica capitalista neoliberal e patriarcal, enfrentar a violência e conquistar renda para abalar as estruturas da desigualdade. Por isto: #PagaLogo; #RendaParaAsMulheres e #ForaBolsonaro.
Isolda Dantas é deputada estadual e militante da Democracia Socialista.