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Partido de Militância ou Partido Eleitoral? – Por um novo estatuto

Uma das razões da crise de identidade que o PT vive hoje decorre da reforma estatutária de 2001. O conjunto das alterações realizadas naquela oportunidade tende a transformar o Partido, cada vez mais, num partido eleitoral que abdica de sua organização de base em prol de uma dependência crescente aos mandatos, da institucionalidade dos Executivos e de um abandono na organização e na representação dos movimentos sociais dentro do Partido.

O objetivo inicial, nossa declaração de princípios na fundação do PT, era por um Partido que nascia das lutas, de baixo pra cima, onde as bases efetivamente decidiam, “um Partido sem patrões e sem donos”. O Partido onde o núcleo era a pedra basilar de organização e legitimidade na escolha dos dirigentes foi, pouco a pouco, transformando-se numa caricatura daquelas definições.

A reforma de 2001, aprovada por maioria dentro do Diretório Nacional, por delegação do Encontro, fez com que esse processo corresse à revelia da maioria dos filiados que só começaram a perceber os graves equívocos cometidos nessa Reforma quando colhemos os resultados de prévias suicidas, de concentração dos recursos financeiros, do desestímulo aos núcleos e setoriais que perderam sua delegação aos Encontros e Congressos e com a prorrogação dos mandatos de direção partidária.

No momento em que nossa corrente realiza suas conferências regionais e nacional e prepara a disputa nas direções partidárias, devemos fazer o debate e a disputa de programa e também dos critérios de organização partidária.

Nesse sentido, propomos que a DS aprove e leve para os Encontros partidários as seguintes mudanças estatutárias:

  1. a)Mandatos partidários

Alterar os mandatos de 3 para 2 anos, (art. 21) nos anos ímpares como estava consignado no Regimento e Estatutos anteriores. Como é possível a reeleição, dois anos são suficientes e permitem um processo de balanço e renovação mais sistemáticos dentro do Partido.

Além disso, como nos anos pares temos eleições gerais ou eleições municipais no país, o mandato de 3 anos acaba coincidindo com o ano eleitoral, o que torna contraproducente e até impeditivo misturarmos as eleições internas em plena disputa com os demais partidos. Em 2004, não houve outra saída, senão prorrogar o mandato das direções que acabou sendo de quatro anos.

  1. b) Processo eleitoral das direções partidárias

Alterar o processo eleitoral com voto direto e em separado para presidente nas várias instâncias.

Artigos 22, 23 e 35 que tratam do PED devem ser alterados para eleições simultâneas aos Encontros com candidatos identificados com as chapas (listas) em disputa.

No município ou zonal, o voto direto deverá ser simultâneo ao Encontro e com direito de voto e participação a todos os filiados em dia com os seus compromissos partidários.

No Estado e no País, o Encontro será de delegados com eleição da direção por chapas (listas) e com candidatos à presidência identificados com as listas, mas com votação separada.

As tendências partidárias, nos Encontros, poderão disputar apenas a proporcionalidade de delegados e de participação na instância diretiva e apoiar um dos candidatos à Presidência.

O calendário será invertido do atual no que diz respeito às inscrições das chapas: 1º os Encontros Municipais, 2º os Encontros Estaduais e em 3º o Encontro Nacional.

  1. c) Cota de gênero

No artigo 22, inciso V que trata da cota de mulheres, substituir por uma cota mínima de gênero nunca inferior a 40% para homens e mulheres.

  1. d) Fortalecimento do núcleo de base

Apesar da unanimidade sobre os núcleos, na origem do Partido, esses nunca foram instância de delegação de poder no PT.

Com o argumento da antiga Lei Orgânica dos Partidos Políticos e com o argumento de que os processos de voto direto eram mais democráticos, os núcleos foram reduzidos à organização das lutas nas frentes de massa e serviram de propaganda do caráter democrático e de base do PT.

Na primeira década de vida do Partido, esse debate e a polêmica foi dura e acirrada, mas a idéia de um Partido organizado a partir de células de base não prevaleceu.

Mesmo assim, os núcleos e as setoriais foram conquistando espaços de representação direta nos Encontros e Congressos, através de delegados diretos que não passavam pelos Encontros locais.

Com a reforma de 2001 e a generalização do voto direto em nome de que esse processo seria “mais democrático”, as representações setoriais e de núcleos deixaram de existir.

No art. 58, onde se trata da nucleação devemos recuperar essa instância como organizadora para levar a cabo todas as tarefas partidárias nas mais variadas frentes de massa e a possibilidade dos filiados organizados em núcleos de atuação terem a possibilidade de eleger representantes e/ou delegados diretos nos Encontros e Congressos.

É evidente que todos os filiados que participam nesse processo não tem direito de votar também, através do voto direto. Isso configuraria uma duplicidade de sufrágio.

O importante é retomar a experiência e a possibilidade da representação direta via núcleo ou setorial nos Encontros e Congressos. Significa fortalecer, valorizar e manter um sentido de participação de militância.

  1. e) Extinção das prévias para escolha de candidatos

Essa experiência mostrou que se a disputa é pública, o descontrole sobre como os meio de comunicação tratam essas disputas é prejudicial ao Partido e aos candidatos.

Da mesma forma, com o instituto da reeleição, qualquer prévia onde o detentor do mandato dispute, isso já traz conseqüências irreparáveis na campanha.

A escolha via Encontro diminui sensivelmente o desgaste da disputa interna e permite um debate muito mais racional e orgânico sobre as conseqüências de possíveis divergências programáticas ou de competência se houver disputa de indicação a cargos majoritários.

Por isso, devemos propor, simplesmente, a extinção das prévias e a retomada da deliberação dessas candidaturas em Encontros partidários com essa finalidade.

  1. f)Sustentação financeira do Partido

Uma das piores conseqüências da Reforma estatutária de 2001 foram as decisões sobre finanças. Aí reside um dos exemplos mais claros sobre a tendência do Partido ao eleitoralismo e ao predomínio dos portadores de mandato e ao poder econômico dentro do partido.

A contribuição anual mínima desestimula e descompromete o filiado com o papel e a importância da sustentação democrática do Partido.

Essa política também incentiva a filiação sem critérios, despolitizada, criando-se verdadeiros “currais eleitorais” dignos do coronelismo político que sempre afirmamos combater no Brasil.

Nas convenções e encontros, essa política da contribuição mínima cria o voto a cabresto onde as kombis e ônibus substituem a participação voluntária e consciente dos filiados.

O Partido depende e vive, cada vez mais, das finanças eleitorais, dos endividamentos e de campanhas milionárias que só se sustentam com contribuições de empresas, com todas as conseqüências que daí advém.

O Partido precisa retomar e fazer valer o princípio de que o direito do voto depende do compromisso da sustentação financeira com a contribuição mensal, regular e permanente dos filiados.

Isso significa, também, autonomia regional e local para estabelecer contribuições de acordo com as possibilidades regionais e locais, desde que respeitados os mínimos nacionais.

O fundamental é que a contribuição seja pré-requisito para o direito do voto e não pode ser a contribuição mínima e única que predomina hoje, que só estimula a corrupção, o voto de cabresto e o poder econômico dentro do Partido.

  1. g) Distribuição do Fundo Partidário

A distribuição hoje estabelecida nos artigos 186/187 é totalmente leonina, centralizadora e concentradora na direção nacional do Partido.

O Fundo deve ser dividido da seguinte forma: Os 20% destinados pela lei à Fundação; 30% para Direção Nacional e 50% para os Diretórios Estaduais.

Este montante dos Diretórios Estaduais deve ser rateado mediante a média do número de filiados, porcentagem de municípios organizados e porcentagem de votos alcançados pelo Partido no Estado. Isso estimula a organização e o enraizamento do Partido, bem como seu crescimento numérico.

Esse rateio é automático e sem política de retenção e/ou compensações pelo DN. Este deverá estabelecer cotas de contribuição dos Estados e estes dos Municípios que serão pré-condições para a participação nos processos dos Encontros e Congressos partidários.

O DN deverá rever a política de cotização dos portadores de mandato, principalmente diante da orientação predominante nos parlamentos de burlar os reajustes indexados e a pressão da opinião pública, substituindo reajustes salariais por verbas indenizatórias ou por aumento dos recursos de gabinete, que distorcem bastante a realidade de ingresso dos detentores de mandato.

  1. h) Reforma Política

O Partido deve intensificar a propaganda e a defesa da Reforma Política em curso, demonstrando claramente à população o que defendemos e queremos com essa reforma.

É imperioso propagandear e mostrar que o sistema eleitoral e de representação partidária é um dos principais responsáveis pelo Congresso que temos cuja melhor síntese vimos agora com a eleição de Severino Cavalcanti (PP) para a presidência da Câmara Federal.

Uma reforma que contemple o voto em lista partidária, financiamento público e controle rigoroso dos gastos por partido, o fim das coligações proporcionais, cláusula de barreira para representação parlamentar e poder efetivo do Partido sobre o estabelecimento da fidelidade partidária, já teria um significado revolucionário na vida do país via combate dos balcões de negócios, das siglas de aluguel e do arrivismo político de grande parte dos Partidos políticos brasileiros.

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