Com a presente revista, chegamos em nossa décima edição da Revista Democracia Socialista.
Por ocasião do centenário de Florestan Fernandes e de Celso Furtado, nossa maneira de homenageá-los é relacionar suas reflexões com nossas tarefas atuais. Juarez Guimarães destaca em Florestan Fernandes a questão democrática como elemento organizador, que dá coerência ao conjunto de sua obra; seja em sua postura crítica em relação à tese da democracia racial no Brasil, seja em relação ao processo de formação da moderna sociedade de classes. “A democracia, então, de caráter subversivo seria o programa das classes trabalhadoras. Esta raiz sociológica de classe, pela sua própria dinâmica, levaria a que a luta democrática não devesse ser autocontida na ordem burguesa e muito menos na democracia liberal. Por isso, o conceito de uma revolução democrática vai ao centro da obra madura de Florestan Fernandes.” A partir desse entendimento podemos ler o atual período, de desestabilização da democracia, como uma contrarrevolução. É preciso então atualizar o debate sobre a revolução democrática, ir além da disputa institucional e construir um programa para revolucionar o Estado brasileiro.
André Drumond destaca como categoria central na obra de Celso Furtado o conceito de humanismo. Inscrevê-lo nessa tradição política secular nos permite ter uma leitura mais generosa e abrangente, que vai além de suas formulações sobre a teoria do subdesenvolvimento brasileiro e remete à disputa democrática na contemporaneidade.
As eleições de 2020, com certeza, ocupam um lugar de destaque nesta edição. Os resultados e as dinâmicas das eleições nos trazem pistas para refletir sobre os caminhos da esquerda no Brasil, os desafios exigidos para uma profunda reorganização da luta social, da atuação partidária. Primeiramente, apresentamos um texto da coordenação nacional da DS de contribuição ao balanço eleitoral do PT, e em seguida textos de análise sobre algumas situações específicas: um texto de Giliard Tenório sobre a vitória de Margarida Salomão em Juiz de Fora; um texto coletivo dos membros da coordenação nacional da juventude da DS, Gabriel Medeiros, Regina Brunet, Guilherme Barbosa e Moara Saboia, sobre a forte presença de jovens nas eleições; uma análise de Piti Nelsis sobre o processo eleitoral em Porto Alegre e um texto de Robinson Almeida, denunciando o abuso da máquina pública e a manipulação da fé nas eleições de Feira de Santana.
Raul Pont defende a importância de uma frente de esquerda no Brasil para fazer frente aos avanços da direita, numa perspectiva ampla, que alie partidos e organizações a partir de um programa comum, um caráter permanente e de ação comum nas lutas cotidianas.
As leituras sobre a conjuntura internacional estão centradas na América Latina e nos Estados Unidos. Marilia Closs e Talita Tanscheit analisam as principais disputas da esquerda na Bolívia, no Chile e no Uruguai. O professor Sebastião Velasco e Cruz preparou uma reflexão sobre as implicações internacionais das eleições norte-americanas de 2020.
Renata Moreno, Miriam Nobre e Nalu Faria apresentam os resultados da pesquisa realizada pela SOF (Sempreviva Organização Feminista) e Gênero e Número sobre o cotidiano das mulheres durante a pandemia, sob uma perspectiva feminista, colocando no centro da agenda política a sustentabilidade da vida, ou seja, os trabalhos de cuidados realizados pelas mulheres em condições precárias e invisibilizadas. Sem parar: o trabalho e a vida das mulheres na pandemia mostra, em dados, entrevistas, artigos e relatos, os impactos do contexto de isolamento social para a vida das mulheres, considerando as desigualdades imbricadas de raça, gênero e classe.
Jéssika Martins elaborou para esta edição da revista uma resenha sobre o livro Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. O diálogo entre as pensadoras Nancy Fraser e Rahel Jaeggi analisa o contexto atual do capitalismo, a partir de suas transformações e permanências sociais, políticas e ambientais para, numa perspectiva crítica, pensar as lutas de resistência.
Na reflexão final, apresentamos dois poemas de Cida Pedrosa, ganhadora do último Prêmio Jabuti. Com “Os meninos da minha cidade” e “Urbe”, a poeta pernambucana, e militante feminista, eleita vereadora em Recife pelo PCdoB, nos remete mais uma vez à desigualdade, em particular a racial, e da vida nas cidades, marcas profundas do ano de 2020.
Seguindo na luta.
Boa leitura!
Os editores