Democracia Socialista

SINAIS TROCADOS

Bernardo Cotrim 

 A mídia empresarial, em uníssono, amanheceu o dia a festejar o desembarque em massa do Titanic governista, que – supostamente – caminha para um inevitável impeachment no próximo domingo. A construção de um clima de vitória da direita (ou, pra usar um conceito da moda, a “manipulação dos afetos”) tem, por óbvio, o duplo objetivo de arrefecer a resistência popular, de um lado, e reforçar junto aos parlamentares “indecisos” o golpismo como único caminho a seguir – e quem ficar de fora da canoa, será punido.

Este movimento começou com força no fim de semana, numa operação comandada por Temer e Cunha, envolvendo desde a montagem do futuro governo até ameaças explícitas do achacador geral da república e seus dossiês já famosos (ressalto aqui o corajoso depoimento do deputado Aliel, da REDE, ameaçado com enorme truculência por Cunha para que votasse pelo impeachment). O ápice foi o áudio “vazado” por Temer, discursando já como presidente empossado, sinalizando para o empresariado, para a população e, principalmente, para os parlamentares indecisos.

Cabe aqui uma reflexão: a ofensiva articulada da direita em todas as suas expressões revela, exatamente, o contrário do que é dito. Ainda existe um número enorme de parlamentares que “flutuam”, escondem a posição, aguardam até o último segundo para votar com o lado vencedor – seja ele qual for. O canto antecipado de vitória dos golpistas é, exatamente, a luta política de alta intensidade para conquistar os 342 votos no domingo.

Entra no mesmo cardápio de manobras o rito de votação defendido por Cunha – ao invés da votação nominal do impeachment de Collor, uma votação organizada a partir das regiões e começando pelo sul do país, de maneira a conquistar, logo de início, uma dianteira de votos pró-golpe, abrindo a caixa de ferramentas de chantagens e ameaças aos deputados do nordeste, por exemplo, onde reside uma maioria anti-golpe.

O resumo da ópera indica que a disputa continuará em elevada temperatura, e que a pressão popular segue como o instrumento decisivo para o desfecho do drama. É preciso reforçar o caráter ilegítimo de um assalto ao poder comandado por uma aliança eclética de corruptos, neoliberais e fascistas, dispostos a salvar a própria pele, saquear o Estado e arrasar com todas as conquistas populares não só dos últimos anos, mas da História – onde a CLT é o caso mais explícito.

Os parlamentares indecisos devem lembrar dos riscos de derrubada de um governo legitimamente eleito para a montagem caricata de algo que já nasce condenado, fustigado dia e noite por um pico de mobilizações populares a carimbar-lhe a testa com a pecha de golpistas e incapaz de reaquecer a economia, pois mira no retrovisor com nostalgia a farra neoliberal dos anos FHC.

Cabe aos partidos e movimentos incrementar a resistência democrática, pressionando de todas as formas e desmascarando o conluio de interesses escusos que alimenta o moinho do impeachment; e cabe ao governo, concretamente, dialogar com amplos setores do parlamento e convencê-los que o caminho mais seguro para o país é o respeito à Constituição e a democracia, e sinalizar para a ampla coalização de energias militantes, pensamento crítico e força criativa os novos rumos do governo imediatamente após derrotar o golpe, promovendo o reencontro vigoroso entre o povo, o governo e o programa eleito em outubro de 2014.

Bernardo Cotrim é Secretário de Formação Política do PT-RJ