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Sobre o discurso “coach” de Pablo Marçal e a pesquisa da Fundação Perseu Abramo de 2017 | Carlos Henrique Árabe

Na última semana, importantes analistas retomaram uma pesquisa da FPA publicada em 2017, Percepções e Valores Políticos nas Periferias de São Paulo. O que nos mobilizou à investigação, na época, foi o baixo desempenho eleitoral do PT em todo país no pleito municipal de 2016. E resultados como a vitória de João Dória para a prefeitura de São Paulo, mobilizando a ideologia empreendedora sob a assinatura “João Trabalhador” (curiosamente ele não foi chamado João Empreendedor, mas trabalhador!).

De fato, encontramos, 8 anos atrás, entre uma amostra do eleitorado que havia deixado de votar no PT, algo — denominado, então, “liberalismo popular” — bastante galgado numa vontade de ser “empreendedor” e numa resistência com relação aos governos.

Encontramos evidências posteriores, no entanto, de que a tendência verificada em 2017, hoje, parece estar em xeque ou, pelo menos, não exibe o vigor de quase 10 anos atrás. Vale dizer, aquele achado pode ser, acreditamos, melhor interpretado à luz da evolução das percepções obtidas nos anos seguintes. Por isso, consideramos imprescindível mostrar a evolução que a Fundação Perseu Abramo, através do Núcleo de Opinião Pública Publicações e Estudos (NOPPE), e outros institutos de pesquisa vêm registrando ao longo do tempo.

Destacamos alguns trabalhos.

Em 2022 (pós-pandemia), a pesquisa Cultura Política: Percepções e Valores da População Brasileira Não Polarizada deu conta de evidenciar que aqueles que não se alinham ao bolsonarismo — o que corresponde à imensa maioria — valorizam o Estado e as políticas públicas, destacadamente no que concerne às políticas públicas para a redução das gritantes desigualdades do país. Essa atitude convive com críticas contundentes em relação à gestão da coisa pública e, naturalmente, aos governantes e aos partidos. Daí decorre, a necessidade de batalhar para viver diante das dificuldades era incontornável. E, “trabalhador” – mais do que o lugar que ocupa na sociedade de classes – é um atributo, uma marca de valor do povo.

A pesquisa sobre o eleitorado não polarizado nos levou também a perceber que, mesmo havendo diferenças contundentes no que diz respeito a valores e percepções sobre a política no geral, os três perfis — bolsonarista, lulista, não alinhado — tinham um chão comum: as condições da vida real, material e prática, principalmente no mundo do trabalho.

Esta conclusão nos levou — em parceria com as Fundações Maurício Grabois (PCdoB), Lauro Campos e Marielle Franco (PSOL) e a Rosa Luxemburgo (Die Linke) — a buscar aprofundar diagnósticos sobre a classe trabalhadora. Fizemos novas pesquisas, em duas etapas: primeiro com trabalhadores de empresas por aplicativos; e depois uma quantitativa com 4 mil entrevistas com pessoas economicamente ativas. Esta pesquisa revela uma situação de precarização e insegurança financeira por parte da classe trabalhadora, que se preocupa com sua saúde e com sua renda. Quatro em cada dez trabalhadores se sentem sob riscos psicológicos, e um a cada três teme por sua integridade física. Há insatisfação com a renda para 51% da amostra. Nesse sentido, 64% veem como principal ponto negativo no trabalho por conta própria o risco de ficar incapacitado e sem renda. Os principais achados dessas pesquisas foram publicados em agosto e estão disponíveis no relatório da pesquisa As Classes Trabalhadoras.

Em agosto de 2024, foi noticiada uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Ibre) que mostra que sete em cada dez trabalhadores brasileiros autônomos gostariam de ter carteira assinada.  Ao nosso ver, estas percepções indicam que a tendência de adesão de parcela das classes trabalhadoras à cultura e ideologia do empreendedorismo verificada desde 2015/2016 está em declínio.

Em todas essas produções, o que nos preocupa é a atual situação de precarização da classe trabalhadora que também se sente vulnerável diante das mudanças climáticas (queimadas, enchentes e outros desastres cada vez mais recorrentes), o que dá contornos ainda mais dramáticos para uma perspectiva de futuro já pouco otimista.

Ao lado deste quadro, há percepções de um forte distanciamento entre o sistema representativo e as expectativas de resolução dos problemas sentidos pelas maiorias. Por exemplo, 55% dos entrevistados na nossa pesquisa referida acima sentem-se “invisibilizados” pelo sistema político. Também 55% se dispõem a participar de consultas sobre políticas públicas.

A combinação entre um mundo do trabalho hostil e um mundo político excludente cria um terreno fértil para o avanço de figuras de extrema-direita com saídas individualistas e de ódio. Para vencê-las é preciso enfrentar as causas originárias desses fenômenos. E, vale lembrar que de 2017 para cá, avançamos na luta contra tais figuras, afinal saímos vitoriosos na eleição presidencial de 2022 e continuamos trabalhando por mais vitórias.

Em paralelo à produção de pesquisas, diagnósticos e diálogos dentro e fora do partido para atualizar nossas leituras sobre a sociedade brasileira, a Fundação Perseu Abramo também produziu materiais e conteúdos para subsidiar o partido na disputa política, como:

Os esforços feitos pela Fundação Perseu Abramo estão em sintonia com objetivos programáticos do Partido dos Trabalhadores, permanentemente em busca de compreender a sociedade brasileira em suas mudanças.

Carlos Henrique Árabe é Diretor da Fundação Perseu Abramo (criada pelo Partido dos Trabalhadores em 1996) e do seu Núcleo de Opinião Pública, Pesquisas e Estudos (Noppe).

Via Fundação Perseu Abramo.

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