Democracia Socialista

Um balanço do 13º Encontro Nacional do PT

Jornal DS – 19. Retomada do debate realizado em 2001 marca Encontro.

O 13º Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores (ENPT), que aconteceu em São Paulo entre os dias 28 e 30 de abril, contou com a presença de mais de mil delegados e delegadas de todos os estados do Brasil e do Distrito Federal entre seus cerca de 1.500 participantes.
Foram aprovadas moções de solidariedade ao povo cubano; contra a criminalização dos movimentos sociais; acerca do Sistema Brasileiro de TV Digital; acerca do posicionamento de parlamentares petistas diante da luta das mulheres pela descriminalização do aborto; além da moção de repúdio ao PPS, por conta da movimentação pró-impeachment desencadeada pela direção desse partido. A íntegra das resoluções e moções aprovadas pode ser encontrada na página do partido na internet, www.pt.org.br.

Quanto às resoluções, é importante destacar que as teses de Conjuntura e de Diretrizes de Programa retomam o fio condutor estabelecido no 12º Encontro Nacional, de 2001, que havia sito roto pela prática do governo e da maioria da direção entre 2002 e 2005. Essa foi a principal vitória, e avança no objetivo de preencher a polarização eleitoral com um conteúdo programático de enfrentamento do neoliberalismo e de superação das limitações do atual governo. Assim, os resultados do 13º ENPT devem ser avaliados à luz da conjuntura e da luta política em curso no país.

Militância. Mais de mil delegados e delegadas deliberaram sobre as tarefas partidárias.

Resoluções aprovadas
O sentido geral desses textos é o de propor marcos programáticos que delineiam um governo de participação popular e de marcha para estruturar um paradigma pós-neoliberal para a economia e a sociedade brasileira. O texto sobre Diretrizes afirma que: “O nosso objetivo é de construir um Brasil democrático e popular, liberto da dependência externa, com soberania nacional e igualdade social. Não se trata, porém, de ficar preso à comparação com o medíocre governo FHC. Nem, tampouco, de propor uma simples continuidade do até aqui realizado. (…) Esse modelo resgata a esperança desatada pela candidatura Lula em 2002 e pelos 26 anos da história do PT. A realização desses objetivos não é um simples ato de vontade política. (…) Mas, sobretudo, dependerá dos avanços na democratização do Estado brasileiro e da intensa participação da sociedade, construindo novas bases para a governabilidade, expandindo a cidadania, a participação popular e o protagonismo das entidades representativas dos trabalhadores e dos movimentos sociais, afirmando a soberania nacional e promovendo integração regional”.

Destaca, ainda, que “o socialismo petista – nosso horizonte estratégico – é uma construção histórica e não um objetivo abstrato a ser atingido. O PG-2006 – sua formulação e implementação – tem de estar em sintonia com nossa visão mais ampla sobre o futuro do Brasil”. As teses apresentadas foram complementadas por um conjunto de emendas, dentre as quais o reforço do sentido crítico à política econômica, a afirmação da democracia participativa e da reforma agrária.

Por outro lado, a definição da política de alianças retrocedeu a um patamar semelhante ao das eleições de 2004. Sua conseqüência prática, no entanto, pode ter uma validade pequena, a depender das definições de outros partidos. As alianças sem critério programático que foram aprovadas podem não ser concretizadas pela verticalização, pelo caráter fragmentado dos partidos de centro e de direita e, sobretudo, pela polarização política da conjuntura.

Também é importante destacar o manifesto dos sindicalistas apresentado ao 13º ENPT, que buscava expressar um conjunto de reivindicações dos sindicalistas petistas visando a um eventual futuro mandato capaz de superar as contradições do primeiro. Essa iniciativa deve ser reforçada e precisa refletir-se não apenas na ação política partidária, mas também na organização interna, com a presença orgânica dos sindicalistas na vida partidária.

A mídia e a questão ética
Nem bem terminou, o 13° ENPT (Encontro Nacional do PT) foi apresentado pela grande mídia de acordo com seus próprios interesses em relação ao PT. Foi notória a tentativa de condenação de todo o partido justamente no momento em que este repudiou explicitamente condutas antiéticas, através de resolução do Encontro, repondo a necessidade da apuração de responsabilidade de dirigentes e parlamentares acusados de corrupção.

A resolução em questão também expressa a crítica aos métodos de organização partidária que permitiram esses desvios. O mais importante nisso é a afirmação de que não há conivência da maioria do partido com atos de corrupção de que foram acusados dirigentes e parlamentares do PT. Essa questão estava em “stand-by” após o PED, com seguidas derrotas no Diretório Nacional das propostas que apontavam para completar o processo de apuração e de posicionamento do partido.

Essa resolução reforçou o que já constava da tese de Conjuntura aprovada. A proposta aprovada determina ao Diretório Nacional definir prazos e procedimentos para apuração de casos específicos de acusações, garantido o direito de defesa; aprofunda a crítica ao modelo de centralização que vigorou no partido e a dependência eleitoral no financiamento partidário: “O 13º Encontro Nacional do PT considera que não se esgotou, no interior do PT, o processo de discussão sobre as origens da crise que vivemos em 2005 e de apuração de responsabilidades. (…) Considera que esse processo de averiguação possui uma dimensão individual e crítica; mas ao partido interessa, sobremaneira, a dimensão coletiva e auto-crítica, porque estamos diante de um fenômeno de causa e solução sistêmicas”.

Não esgotou. ENPT afirma não conivência do partido com atos de corrupção.

estigação de mensaleiros”, revelando o empenho de parte da mídia em condenar o conjunto do partido. O ataque da mídia à soberania do Encontro recoloca um tema muito decisivo para o PT: sua capacidade de estabelecer uma comunicação de massas com a sociedade e, sobretudo, com seus militantes e sua base social. Um grande esforço político e organizativo, como foi o 13º Encontro nacional, parece frágil frente a uma manchete de um jornal burguês, ou ao noticiário da noite. Uma política de esquerda e a conquista de uma hegemonia de esquerda na sociedade implicam na construção de uma mídia de esquerda. Esse esforço deve também merecer a atenção do PT.

Mudanças no estatuto
Um aspecto bastante negativo no 13º ENPT foi a derrota da emenda que defendia a contribuição financeira mensal dos filiados e a auto-sustentação do partido como uma das condições para assegurar sua independência política e sua democracia interna. A aprovação dessa emenda teria profundo impacto positivo como parte da necessária resposta do partido face à grave crise financeira e política que o assolou.

No tema Construção Partidária, foram incorporadas emendas que destacavam a necessidade da retomada dos núcleos (para efeito de representação no próximo Congresso e como instrumento de organização na campanha de 2006). A iniciativa pode ser vista como um sinal positivo do ponto de vista da organização do partido, já que tanto se falou, ao longo do último ano, em reatar a relação que o PT sempre manteve com a sua militância de base.

No entanto, a recusa a mudar o estatuto no ponto crucial da contribuição financeira dos filiados mantém a idéia de partido diluído, com relação frouxa com os filiados (e o risco de serem tratados como massa de manobra) e não convoca a base militante do PT para reerguer financeiramente o partido e garantir sua autonomia face ao risco que envolve a dependência de financiamento eleitoral.

Perspectivas do debate partidário
O desejo de mudança expresso majoritariamente no PED, fortemente crítico à direção do antigo campo majoritário, foi parcialmente consolidado nas novas orientações programáticas. Carrega, no entanto, uma grande contradição entre elas e a políticas de alianças.
De outro lado, o impulso do PED não foi suficiente para superar o modelo eleitoral de organização partidária, praticado ao longo de 1995 a 2005. O 13º ENPT, assim como o novo Diretório Nacional,  não avançou nesse ponto crucial. Esse debate, mais uma vez, fica adiado, e deve ser apreciado pelo III Congresso do partido, a se realizar em 2007. Nesse sentido, o único passo à frente, que não é desprezível, foi a decisão de dar continuidade ao processo de apuração de possíveis crimes contra o partido atribuídos a alguns dirigentes e parlamentares.

Mesmo observando mudanças significativas de posicionamento interno de correntes à esquerda em direção à antiga maioria – o que possibilitou a aprovação das posições sobre alianças e sobre finanças do partido – não parece possível falar da formação de uma “nova maioria” estável na direção do PT. O processo partidário parece mais complexo e sujeito aos debates que transcorrerão em meio à batalha eleitoral. Um novo “mapa” interno do PT dependerá desse processo interno-externo e dos debates preparatórios ao III Congresso.