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Um internacionalismo para o século XXI

América Latina expressa um novo processo na luta socialista

O internacionalismo é um dos valores estratégicos constitutivos da luta pelo socialismo. A fraternidade universal dos povos precisa ser buscada e, assim como o capital globalizou sua dominação, não há como desenvolver o socialismo de forma isolada em um ou outro país. Portanto, um projeto pós-neoliberal, para ser coerente, necessita ser socialista e internacionalista.

Há condições fundantes para a transição e a superação do neoliberalismo. São elas: o antiimperialismo; a defesa da soberania nacional dos povos; a denúncia e o enfrentamento da condição subdesenvolvida dos países da “periferia” e da aliança da classe dominante com o capital internacional; a produção teórica e ideológica da luta pelo socialismo; a ética e a moral na política; a permanente luta por uma democracia participativa e a necessária construção de forças políticas com independência de classe capazes de levar isso a cabo.

A crise do “socialismo real”, no momento do auge da hegemonia neoliberal, entre o final dos anos 1980 e a primeira metade da década passada, afetou profundamente toda a esquerda mundial. Aquela crise significou, em grande medida, um novo desenho da esquerda no mundo inteiro. Houve perdas significativas quando importantes contingentes passaram ao campo do neoliberalismo ou abandonaram a militância política.

Mas também aconteceu que as fronteiras ideológicas construídas durante o século XX e, particularmente, aquelas vinculadas ao debate sobre a URSS e o Leste Europeu, foram se erodindo em face às novas realidades e desafios colocados pelo século XXI.

A retomada das lutas sociais que aconteceu no final dos anos 1990 e na presente década se dará sobre um novo território político. Ao contrário do que foi a história das esquerdas no século passado, não há hegemonias estabelecidas nem forças políticas em condições de disputar a condução única desse processo.

Há, no entanto, novas questões estratégicas, novos desafios teóricos e políticos. Frente a eles, esboçam-se campos de construção socialista e internacionalista, e novas polaridades.

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Antiimperialista. FSM mostrou necessidade de construção de um novo internacionalismo

O novo cenário e seus atores
Dessa forma, a retomada das lutas sociais, que aconteceu no final dos anos 1990 e na presente década, se dará sobre um novo território político. Ao contrário do que foi a história das esquerdas no século passado, não há hegemonias estabelecidas nem forças políticas em condições de disputar a condução única desse processo.

O debate sobre um internacionalismo para o século XXI deve recuperar os valores e a herança positiva das quatro internacionais anteriores, mas também deve fazer um balanço dos seus erros. Deve identificar os novos atores hoje existentes, assim como aqueles que permaneceram (após a crise geral das esquerdas no início da década passada). E deve, sobretudo, ser capaz de impulsionar um internacionalismo aberto e plural, estreitamente vinculado às lutas em curso.

A dimensão internacional das mudanças na América Latina é um aspecto central desse novo cenário. Nesta região onde o neoliberalismo e a dominação imperialista atingiram estágios “selvagens”, vêm se concentrando fortes questionamentos à ordem imperialista, ainda que de forma desigual, mas também com aspectos comuns e espaços de cooperação.

Na confluência entre crise dos projetos neoliberais e emergência popular, surgiram novos atores e renovaram-se outros. Os espaços amplos e unitários de lutas contra as diversas expressões da globalização neoliberal só são possíveis hoje por causa desse novo quadro em que se encontram as esquerdas no mundo e, em particular, na América Latina.

A construção de espaços e articulações internacionais criou um ambiente propício para que esse novo quadro emergisse. O Fórum Social Mundial, a Assembléia de Movimentos Sociais, a Campanha Continental contra a ALCA, a Aliança Social Continental, a Marcha Mundial das Mulheres, a Coordenadora de Centrais Sindicais do Cone Sul, os fóruns de trabalhadores em economia solidária, entre outras iniciativas, têm significado avanços importantes na luta contra a globalização neoliberal, o imperialismo, a guerra e o patriarcado capitalista no continente.

O grande impacto das recentes ações contra Bush e a ALCA na Cúpula dos Povos (impulsionada pela Aliança Social Continental), em Mar del Plata, foi uma mostra concreta do acerto dessa política internacionalista. Os significativos avanços políticos registrados no Fórum Social Mundial de Caracas, em janeiro passado, apontam para igual sentido.

Assim, esse novo internacionalismo necessário está sendo construído nas lutas, nas campanhas e nos espaços unitários regionais e internacionais. A crise de legitimidade do projeto neoliberal na América Latina, produto de impasses desse programa e da resistência popular à sua aplicação, abriu um novo período político na região. O ascenso das lutas sociais e o avanço, no plano institucional, de partidos de esquerda e progressistas são expressão desse novo cenário. A tradicional hegemonia do imperialismo norte-americano na região vista como seu “quintal” está em questão.

Internacionalismo e raízes nacionais
Essas conquistas não são nem estranhas nem contraditórias com uma política nacional, ao contrário, devem ser a continuação dela no plano internacional. Inclusive porque uma política internacionalista precisa escapar de aplicações mecânicas de determinações de um agente central, e sim, deve considerar processos históricos e atores diferenciados, como se observa na América Latina.

Mesmo o marxismo, quando chegou ao continente, veio como uma ideologia “fora de lugar”. Foram cento e cinqüenta anos de mútuo aprendizado entre os povos latinos (que buscaram no marxismo uma ferramenta para sua libertação) e o marxismo, que, para ser um pensamento universal, precisa se “deseuropeizar”. Dessa forma, às elaborações teórico-políticas da luta pelo socialismo, somam-se experiências diversificadas e realidades históricas diferenciadas, que apresentam acúmulos de força importantes para a construção das lutas populares mundo afora.

Sendo assim, embora ainda se esteja longe de sínteses programáticas e de formas organizativas do amplo, variado e plural processo de internacionalização de lutas sociais e de organização política, ao mesmo tempo, é visível que esse processo já ultrapassou o período mais defensivo, de resistências. Um excelente cenário para se desenvolverem novas experiências e elaborações internacionalistas.


 

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