Durante os 71 anos de sua história a UNE sempre teve como uma de suas pautas centrais a mudança radical da universidade brasileira. Sendo assim, após a realização de uma ampla discussão na base do movimento estudantil, a UNE terá finalmente o seu projeto estratégico de Reforma Universitária. Este projeto deverá representar a unidade da categoria dos estudantes em torno de um projeto de educação que orientará a nosso debate para transformar o ensino superior brasileiro.
RAFAEL CHAGAS
Em toda a sua história, a UNE sempre teve na luta pela reforma universitária uma de suas importantes bandeiras. A universidade no Brasil, desde sua fundação, sempre esteve intimamente ligada ao projeto das elites brasileiras, ou seja, espaço de reprodução do seu poder e das desigualdades enraizadas na sociedade. No início da década de 60, com o grande movimento pelas reformas de base na nossa sociedade, a UNE não deixou de levantar a sua bandeira, organizando durante esse período três seminários sobre a reforma universitária. Nesses seminários, ficou nítida a opção dos estudantes em debater não só os problemas internos da universidade, mas principalmente qual o seu papel na sociedade. As resoluções aprovadas nesses seminários questionavam a estrutura das universidades e colocavam a necessidade de seu projeto ter como horizonte a superação dos problemas nacionais.
Mas todo este movimento de luta por reformas de base no Brasil foi sufocado pelo golpe militar em 1964. Nas universidades, além da falta de democracia com a perseguição do movimento estudantil, esta também sofreu com o retrocesso em sua estrutura. O acordo MEC- USAID, feito pela ditadura militar, implantou os departamentos e definiu regras autoritárias para o funcionamento das instituições de ensino superior. Neste período, os estudantes enfrentaram a repressão e lutaram contra o governo autoritário e sua política para as universidades brasileiras.
O fim da ditadura militar e o processo de redemocratização no Brasil colocaram novamente em disputa o projeto de sociedade. A UNE, em conjunto com diversos movimentos sociais, alcançaram vitórias no sentido de democratizar a universidade brasileira e recolocar em pauta a necessidade de mudanças em sua estrutura. A esperança de uma nova universidade, entretanto foi esvaziada com a implementação do projeto neoliberal nos anos 90, que teve como lógica desresponsabilizar o Estado com a educação pública. Todas as conquistas democráticas foram perdidas, como a nova lei de escolha dos dirigentes universitários por consulta, lista tríplice e uma proporcionalidade de 70% para os professores nos conselhos superiores das universidades, além do sucateamento que as instituições federais foram submetidas e a proliferação desregulada do ensino privado.
O resultado destas políticas dos governos neoliberais para a educação brasileira reflete a crise em que se encontram atualmente as universidades brasileiras, que vai desde o gargalo financeiro até a sua falta de legitimidade com o conjunto da sociedade. É por isso que uma reforma na educação brasileira – na sua universalização, na sua qualidade, no seu engajamento para solução dos grandes desafios nacionais – deve ser uma luta de todos os estudantes brasileiros.
O processo de reforma no ensino exige um papel protagonista das entidades estudantis. Deve afirmar a participação ativa dos estudantes nos espaços educativos como princípio fundamental, que abarca desde a participação na formulação das políticas públicas de educação, até na vida cotidiana das escolas e universidades. Por isso, a União Nacional dos Estudantes, neste período em que o projeto neoliberal sofre enorme contestação na sociedade brasileira, tem como tarefa central a formulação de um projeto de educação que tenha a capacidade de mobilizar os estudantes e a sociedade para a transformação do ensino superior brasileiro.
O projeto de Reforma Universitária da UNE, que vai ser aprovado no CONEB com a participação de todas e todos os estudantes, deve representar o acúmulo histórico das lutas e das formulações da UNE em defesa da universidade pública, democrática, de qualidade e socialmente referenciada.
Rafael Chagas é diretor de Políticas Educacionais da UNE.