Os 450 delegados presentes na IV Conferência Internacional da Via Campesina apontaram as lutas contra os transgênicos, contra as transnacionais e pela soberania alimentar como as principais pautas para o próximo período. Não faltaram críticas ao subsídio dado aos grandes agricultores e à recente manifestação da FAO a favor dos transgênicos, questionada por Paul Nicholson e José Bové (abaixo).
Via Campesina critica FAO e rechaça OMC
IV Conferência. Lutas contra os transgênicos e pela soberania alimentar são prioridade.
Não é só no Brasil que políticas agrícolas têm incentivado o agronegócio e prejudicado os pequenos agricultores. As lutas por mudanças na Política Agrícola Comum da União Européia, contra o uso de mão-de-obra semi-escrava nos Estados Unidos ou contra o plantio de transgênicos da Monsanto na América Latina representam reivindicações de pequenos camponeses de todo o mundo.
Unidos por uma plataforma comum de lutas, cerca de 450 integrantes de movimentos camponeses de 76 países participaram da IV Conferência Internacional da Via Campesina – organização que congrega movimentos de pequenos agricultores e sem-terra de todo o mundo –, realizada de 15 a 19 de junho, em Itaici (SP). A última edição da Conferência havia acontecido na Índia, em 2000.
Os pilares camponeses
A plataforma de ações da Via Campesina inclui pontos como reforma agrária e a luta contra os transgênicos. Entre esses pontos, um dos principais para a entidade é a soberania alimentar. Em poucas palavras, ela representa o direito das populações, dos seus Estados ou Uniões a definirem a sua política agrícola e alimentar, sem dumping (preço de venda menor do que o custo de produção) face a países terceiros.
Uma das ameaças à soberania alimentar tem sido a política de subsídios agrícolas exercida por diversos países do “Norte global”. Segundo Dina Holf, pequena agricultora dos EUA que também faz parte da Comissão Coordenadora Internacional da Via Campesina, essa prática beneficia apenas os grandes agricultores e favorece as exportações ao gerar dumping. “Seria preferível ter uma política de preço justo do que de subsídios agrícolas, que têm sido usados para colocar um agricultor contra o outro. Eles têm efeitos negativos sobre os camponeses do Sul, sem representar os interesses dos pequenos agricultores do Norte”, afirma Dina.
Com quem se aliar
Mais do que a afirmação de sua plataforma, um dos focos da Conferência foi o debate sobre as alianças estratégicas da entidade. A Rede de Movimentos Sociais foi apontada como aliada primordial das atividades da Via Campesina. O debate, porém, não foi tão fácil ao se discutir a relação com organismos internacionais, tais como a FAO (Food and Agriculture Organization), agência da ONU para questão de alimentação e agricultura.
A Via Campesina vinha colaborando com a agência no último período; no entanto, a divulgação de um documento aceitando os organismos geneticamente modificados (OGMs, ou transgênicos) como instrumentos de combate à fome soou como um mau sinal. “A FAO tem mandato expresso para incentivar a pequena agricultura e combater a fome. No entanto, só nos últimos 5 anos, o número de famintos no mundo passou de 800 mil para mais de 1 bilhão. E agora ela passa a aceitar os OGMs como instrumento de combate à fome”, diz Rafael Alegria, de Honduras, Secretário Internacional de Operações da Via Campesina. “A FAO está se tornando um organismo a favor das transnacionais, o que a coloca na condição de nossa adversária”, completa.
João Pedro Stedile, do MST, uma das entidades afiliadas a Via Campesina, denunciou ainda o modo de funcionamento das instituições internacionais, que têm como características a ausência de democracia e de expressão e participação popular. “Temos que negar a eles o direito de dizer que falam pelos povos do mundo. Eles são espaços de governo”. Rafael Alegria criticou especificamente a Organização Mundial do Comércio. Para ele, o livre comércio pregado pela organização responde apenas aos interesses das corporações.
Esse questionamento se materializa em outra bandeira da Via Campesina: “Agricultura e alimentação fora da OMC”. A oposição à Organização, aliás, motivará uma semana de Jornada Mundial contra a OMC e as Transnacionais, de 19 a 24 de julho. O dia 10 de setembro também foi estabelecido como dia de lutas contra a OMC. O calendário aprovado é intenso, como têm sido as atividades da Via Campesina. A próxima Conferência já tem local determinado: será em Moçambique.
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