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59º Congresso da UNE e os Desafios da Juventude Brasileira | Kizomba e CNJDS

Dos dias 12 a 16 de julho, estudantes de norte a sul do país se reencontraram em Brasília para a realização do 59º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), no intuito de debater os rumos políticos do movimento estudantil brasileiro e eleger a nova diretoria da entidade. Após um longo período pandêmico, que impossibilitou a realização presencial do Congresso, o movimento estudantil brasileiro apresentou inúmeras dificuldades para a retomada de sua organização e formação das bases estudantis, reafirmando assim a importância desse CONUNE para a reorganização de sua dinâmica, sobretudo a partir de um novo ciclo histórico que se inaugura com a eleição de Lula à Presidência da República.

Foto: Divulgação Site Kizomba

Dessa forma, em um congresso histórico, foram mais de quatro mil votos, representando mais de quatro milhões de estudantes,  na chapa em que construímos: “Coragem e unidade: nas ruas para reconstruir o Brasil” (Kizomba, UJS, Levante, Paratodos, Enfrente, Luta, Esperançar, JSB, Reinventar e Mutirão), totalizando quase 75% dos votos. O campo democrático-popular conquistou a totalidade da composição da mesa diretora da entidade, após quatro anos sendo composta pela oposição de esquerda no cargo da Secretaria-Geral, consolidando assim uma importante vitória para nosso campo. Nesse cenário, a Kizomba garante sua cadeira na diretoria executiva da entidade, que será ocupada pela estudante de Ciências Sociais da UFES, Manu Kisse.

Há muito tempo não víamos um Congresso com tanta consonância entre as forças políticas nas pautas propostas, apresentando apenas divergências táticas para a condução da entidade. Por um lado, o campo democrático e popular apresenta a tese de que a UNE deve ser uma frente das lutas organizadas do movimento estudantil, que mantenha autonomia de posição política em relação ao governo,  mas sem deixar de construir conjuntamente pautas de unidade programática – para que possamos qualificar políticas públicas, organizar processos de participação popular direta e propor avanços para nosso povo.

Nessa compreensão, olhamos para a UNE enquanto parte do tecido do movimento social brasileiro, que não pode ter receio em pautar, por exemplo, a revogação do Novo Ensino Médio e criticar a política do Arcabouço Fiscal. Fazemos isso pois acreditamos que o papel dos movimentos sociais é não só garantir o programa popular eleito nas urnas em 2022, mas também avançar nas pautas e demandas do povo brasileiro. Não perdemos de vista quem são nossos verdadeiros inimigos: as grandes corporações financeiras que através de Campos Neto mantém juros altíssimos pelo Banco Central, Arthur Lira e o centrão que pautam o Marco Temporal, perseguem politicamente mulheres da esquerda e avançam em tensões na disputa por mais poder, e a extrema direita organizada pelo bolsonarismo que segue tendo lastro social e precisa ser combatida, como foi feito no ato público do congresso.

Infelizmente, setores da oposição da entidade propagam discursos que equiparam o PT e o governo Lula como parte da lista de inimigos da classe trabalhadora e propõem táticas de lutas contra o governo, e não pautas sob as quais podem haver divergências. Outros setores da oposição fazem um grande espantalho da atuação da UNE no último período e suas limitações mas, sem uma proposição efetiva de mudança na dinâmica da entidade, acabam construindo um discurso meramente oposicionista, esvaziado de programa, em que sua pauta é apenas ser contra a majoritária. Por conta disso, apesar do crescimento que algumas dessas forças acumularam individualmente, apresentaram dificuldades em agregar o conjunto das organizações que compunham historicamente esse campo e, como resultado geral, diminuíram sua intervenção na entidade.

Importante ressaltar que este foi o Congresso da unidade. Se em unidade derrotamos Bolsonaro e elegemos Lula presidente, será também em unidade que o movimento estudantil brasileiro irá garantir o projeto eleito e derrotará a extrema-direita, junto a seu projeto neoliberal, nas ruas. A Kizomba, desde o golpe contra Dilma Rousseff em 2016, pauta a unidade entre as frentes Brasil Popular e Povo sem Medo como necessária para o enfrentamento da contra ofensiva da direita em nosso país e formação de uma frente de esquerda capaz de mobilizar para construir vitórias em um cenário de retrocessos. A decisão madura da Juventude Sem Medo (Afronte, RUA, Fogo no Pavio, Brigadas Populares, Manifesta e Travessia), de defender a tese de conjuntura junto ao campo popular e democrático e de romper com o campo oposicionista da entidade, foi fundamental para o início da consolidação desta unidade programática de esquerda e para avançarmos nas transformações estruturais e necessárias para a reconstrução do nosso país e do movimento estudantil brasileiro.

RECONSTRUIR O MOVIMENTO ESTUDANTIL PARA RECONSTRUIR O BRASIL

Neste congresso vimos a mudança significativa da composição do conjunto do movimento estudantil. Pudemos notar uma maior participação de mulheres, negras/os, da população transexual e travesti e, em especial, da população indígena, um importante saldo político. Contudo, ocorreu também o avanço da violência nos espaços de disputa política do movimento estudantil: nas eleições de DCE’s, no processo de tiragem dos delegados para o Congresso, e sobretudo na própria cena do Congresso da UNE.

Foto: Divulgação Facebook UNE*

Cenas como vaias às representações públicas, que as impediram de falar e ser ouvidas, interrupções contínuas nas falas dos próprios estudantes que faziam inscrições para debater nas mesas políticas propostas, e inúmeras agressões físicas e verbais a estudantes durante a plenária final e votação dos delegados, são ações que não podem ser aceitas ou naturalizadas nos espaços do Movimento Estudantil.

Mais do que nunca, é preciso reconstruir o movimento estudantil nos marcos de uma nova cultura política, que garanta espaços de respeito mesmo em momentos de divergência. É importante que nesse próximo ciclo haja prioridade na construção de consensos coletivos a partir das instâncias de debate da entidade, como as reuniões da Diretoria da UNE e o CONEB (Conselho Nacional de Entidades de Base), e também o fortalecimento e ampliação dos espaços formulativos do movimento estudantil, como o ENUNE (Encontro de Negros e Negras da UNE), Encontro LGBT+ e o EME (Encontro de Mulheres Estudantes da UNE). Nesse tom, construiremos caminhos para superar esse cenário de violência e  avançar em nossas divergências em prol da organização da luta das e dos estudantes brasileiros.

Para que o movimento estudantil cresça, seja em número de pessoas organizadas ou em influência política nas universidades e no Brasil, é preciso amadurecimento. O amadurecimento de criar ambientes que construam mais do que disputas, que unifique mais do que fracione e, sobretudo, que compreenda que a pluralidade de opiniões é uma riqueza que deve ser canalizada para a qualificação das sínteses que precisamos construir para avançar nas lutas com o povo brasileiro.

CONTRIBUIÇÕES DO MOVIMENTO KIZOMBA PARA UMA UNE MOBILIZADA E POPULARIZADA

Sob o mote “Os Brasis que quero ver” a Kizomba se apresentou ao 59º CONUNE, pautando a importância da reconstrução do Brasil e do movimento estudantil nesse novo ciclo da conjuntura brasileira. Nesse sentido, pautamos a realização de uma caravana de reconstrução das entidades de base e que possa debater a reforma universitária. Nossa intervenção priorizou qualificar os debates conjunturais e educacionais, pautando a importância da luta contra o capitalismo neoliberal e seus avanços na educação, assim como a defesa de pautas estratégicas para a popularização da universidade: a defesa da lei de cotas, de uma reforma universitária que tenha como prioridade a assistência e permanência estudantil e o combate à violência contra as mulheres nas universidades.

Nesse sentido, é fundamental relembrarmos a realização do 10° Encontro de Mulheres Estudantes (EME) da UNE no último semestre, importante espaço para o acúmulo e auto-organização feminista das mulheres estudantes, e que nesse 59º CONUNE consolidou vitórias fundamentais, como o lançamento, na abertura da Plenária Final, da Cartilha de Enfrentamento à Violência nas Universidades, em parceria com o Ministério das Mulheres, que será distribuída pela UNE nas universidades de todo Brasil, e o compromisso de realização de uma pesquisa nacional nas Universidades, que será feita também em parceria com o Ministério das Mulheres e com o Ministério da Educação (MEC), para compreender a realidade das mulheres estudantes e a dimensão da violência na sua experiência acadêmica.

Foto: Divulgação Facebook UNE*

Sabemos que o acirramento da violência no último período nefasto para a democracia e economia brasileira foi sentido sobretudo pela vida das mulheres, a violência se aprofundou em casa, nas ruas, e também nas universidades. Por isso, junto ao Ministério das Mulheres, a Diretoria de Mulheres da UNE está construindo um GT Interministerial permanente para aprofundar a pesquisa nacional, qualificar os dados e o mapa dessa violência, formulando a partir disso políticas públicas de enfrentamento à violência nas IES. Posicionando-se assim, como uma vitória concreta para a vida das mulheres estudantes e de consolidação da nossa política para dentro da entidade.

Convocando a unidade na prática política, aprovamos duas importantes moções: uma organizada pelos militantes indígenas da kizomba em repúdio ao Marco Temporal e à ofensiva do mercado aos territórios indígenas; outra afirmando o compromisso da entidade na construção da Marcha das Margaridas, convocando o conjunto das mulheres estudantes a participar desse momento central de luta pela vida das mulheres. Ambas amplamente aceitas pelos movimentos presentes no congresso.

Na formulação, contribuímos com alguns debates fundamentais para a União Nacional dos Estudantes. Na pauta de Movimento Estudantil, conseguimos colocar como prioridade a luta pela revogação imediata do Decreto 997/1993, que proíbe a construção de novas creches universitárias. É hora de avançarmos nessa luta histórica das mulheres estudantes, nossas vidas não podem ficar à mercê de entraves burocráticos!

Na educação, apontamos a importância do PNAES como lei, mas não só: é preciso que contemple desde a educação básica até a pós-graduação, assim como a lei de cotas. Além disso, trouxemos à tona o debate das BigTecs nas universidades. Hoje, é comum que as universidades públicas armazenem suas pesquisas, dados e interações em plataformas como a Google, que terminam tendo acesso aos dados de tudo que é produzido no âmbito da educação pública. É urgente o desenvolvimento de plataformas independentes das grandes corporações como um ato público de soberania.

Na conjuntura, não deixamos que o duro período pandêmico fosse esquecido, não apenas pelo governo genocida de Bolsonaro, mas também pelo poder impune das transnacionais que, em nome de seus lucros e suas patentes, impediram que os diversos povos ao redor do mundo tivessem acesso à vacina. Não podemos esquecer que, num momento crucial de nossa história, poucos países e empresas tiveram o poder de definir quem teria direito de viver ou morrer e, dessa forma, milhares de vidas se perderam. Ainda na conjuntura, denunciamos a não retirada da educação do Arcabouço Fiscal e demarcamos a luta pela taxação das grandes fortunas.

Por fim, saímos desse congresso com essas importantes contribuições da Kizomba para o movimento estudantil brasileiro e com muita disposição militante para seguir construindo a luta social e estudantil junto aos kizombolas do país inteiro! Convocamos toda a juventude a ler e difundir nossa tese Brasil afora. É momento de se organizar para construir os Brasis que queremos ver!

Kizomba e CNJDS

*Fotos divulgadas em conjunto no Facebook da UNE – Autores: @imatheusalves @uiseepitacio Rafael Nascimento/MS. @kboughoff @yuri_salvador

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