Notícias
Home / Conteúdos / Artigos / Últimos combates do Lenin

Últimos combates do Lenin

Dos mais de seis anos que Lenin esteve à frente da revolução, desde meados de 1921 sua capacidade de trabalho foi afetada por doenças e sequelas do atentado que sofreu em 1918. Entre maio de 1922, temporariamente, e dezembro desse ano, de forma definitiva, esteve prostrado em uma cadeira de rodas.  Veio a falecer em 24 de janeiro de 1924.

Lenin lançou a NEP (Nova Política Econômica) nessas difíceis circunstâncias pessoais. E foi consciente dos perigos que ameaçavam a revolução pelo processo de burocratização e pelas tensões provocadas pelos estímulos ao setor privado da economia.

Entre as mensagens que enviou ao partido, há uma particularmente dramática. Em 4 de janeiro de 1923 escreveu:

“Stálin é brusco demais, e este defeito, plenamente tolerável em nosso meio e entre nós, os comunistas, se coloca intolerável no cargo de Secretário Geral. Por isso proponho aos camaradas que pensem a forma de passar Stálin a outro posto e nomear a este cargo outro homem que se diferencie do camarada Stálin em todos os demais aspectos apenas por uma vantagem a saber: que seja mais tolerante, mais leal, mais correto e mais atento com os camaradas, menos caprichoso, etc. Esta circunstância pode parecer fútil tolice. Porém eu creio que, desde o ponto de vista de prevenir a divisão e desde o ponto de vista do que escrevi anteriormente sobre as relações entre Stálin  e Trotsky, não é uma tolice, ou se trata de uma tolice que pode adquirir importância decisiva.”   (Carta ao Congresso – Testamento Político de Lenin )

O texto não foi divulgado ao partido e a direção  acabou não encaminhando a proposta do Lenin.  Como poucos, ele intuiu que o funcionamento da direção tal como estava levaria a uma crise da própria revolução.  Diferentemente de 1917 quando Lenin estava em plena atividade e pode disputar suas posições dentro do partido para impulsionar a toma do poder pelos sovietes, agora estava em condições físicas e mentais que lhe impediam participar diretamente das disputas e evitar o terminador contrarrevolucionário que assomava no horizonte.

ECOLOGIA E ANTI-ECOLOGIA – POR ALVARO ALENCAR E REGINA BRUNET 

Na Constituição Soviética, na Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, Capitulo II, se lê: “Todas as florestas, todos os recursos naturais e todas as águas de significado estatal, assim como todos os bens vivos ou mortos, fazendas de espécies e empresas agrícolas são declarados propriedade nacional”. Desde então, se coloca sob proteção do Estado Soviético, toda a terra e seus seres. O desenvolvimento tanto teórico quanto prático oportunizado pela Revolução de 1917 para com o ecossocialimo são frutos que colhemos ainda na atualidade.

“Literatura: caminho para o comunismo” – 1920

Uma das políticas ambientais mais famosas e significativas da fase de ecologia jovem da URSS são as reservas naturais (zapovedniks) criadas primeiramente em 1919, sob as ordens de Lenin. Como herança hoje temos 103 reservas naturais com uma área de 27,5 milhões de hectares. A maioria destas reservas foram criadas na primeira década pós-revolução, e forneceu o maior nível de proteção do mundo para a maioria das terras dentro de qualquer nação, sob a designação da União Internacional por Conservação da Natureza de “reservas naturais restritas”. 

Existe um episódio, de 1919, famoso entre ecossocialistas, do encontro de um jovem agrônomo com Vladimir Ilyich Lênin. Nikolai Podyapolski viajou do norte do delta do rio Volga, até Moscou. “Chegando ao escritório do líder bolchevique para buscar aprovação para um novo zapovednik, Podyapolski sentiu-se ‘preocupado’, disse ele, ‘como antes de um exame no colegial’. Mas Lênin, um entusiasta de longa data de caminhadas e acampamentos, concordou que proteger a natureza tinha ‘valor urgente’”.

Podiapolski lembra o resultado do encontro com Lenin: “Depois de me fazer algumas perguntas sobre a situação militar e política na região de Astrakhan, Vladimir Ilich expressou sua aprovação para todas as nossas iniciativas e, em particular, sobre o projeto para o zapovednik. Ele afirmou que a causa da conservação era importante não apenas para o Astrakhan krai, mas para toda a república também”. Dentre os diversos relatos acerca da conduta de Lênin no que tangem as políticas ecológicas, fica sempre nítido sua visão do meio ambiente enquanto patrimônio da URSS e da humanidade.

É interessante notar que os zapovedniks tinham como objetivo uma preservação de grau tão extenso que não eram permitidas visitas ou turismo nas áreas de preservação. Ou seja, a consciência de que o meio ambiente não deveria ser uma vitrine para apreciação estética dos seres humanos ou um produto em potencial, e sim um patrimônio da nação e da humanidade.

Por óbvio, o sistema capitalista possui uma visão antagônica de noção de mundo e civilidade. É possível traçar um paralelo acerca do tratamento que o capital reproduz com respeito a natureza e as mulheres, que ao seu ver são fontes inesgotáveis: de matéria prima e recursos no caso da natureza, e de trabalho e reprodução no caso das mulheres. E ainda, no momento em que ambas atingem seus limites, a estratégia do capitalismo é a mesma – de mercantilização dos corpos, das vidas e do meio ambiente.

Infelizmente, não foi somente a ideologia capitalista que adotou esta concepção. As políticas aplicadas durante o período de Stálin limitam a preservação ambiental a uma fonte de lucro (vide ecoturismos, estações de esqui, etc.) e de exploração. É uma estratégia de dominação, na qual nada além de um suposto desenvolvimento nacional importa, e que por consequência tenta desvincular o método de produção e reprodução com a ideologia do sistema econômico.

“O objetivo final da aclimatação, entendido em sentido amplo, é um rearranjo profundo de todo o mundo vivo – não só a parte que agora está sob o domínio da humanidade, mas também a parte que ainda permaneceu selvagem. De um modo geral, todos as espécies selvagens desaparecerão com o tempo, algumas serão exterminadas, outras serão domesticadas. Toda a natureza viverá, prosperará e morrerá a não ser pela vontade dos humanos e de acordo com seus projetos. Esta é a perspectiva grandiosa que se abre diante de nós “.  NF Kaschenko, 1929

Estas frases ilustram a obtusa visão estalinista da relação dos humanos com a natureza. Consequência da idéia utilitarista de subjugar a natureza, de conceituá-la apartada da humanidade, e colocar tudo a serviço da produção material de bens, a ciência soviética produziu desastres ecológicos, pseudociência, como a negação da genética de Mendel, a idéia da aclimatação, a tentativa de cultivar abacaxis na Ucrânia, entre outros fatos ridículos.

Os desastres ecológicos da União Soviética sob o comando de Stalin foram tantos e tão significativos que conseguiram esconder as primeiras medidas do governo bolchevique que se colocavam na direção de uma consciência conservacionista. É inclusive nesse sentido que quando se fala em ecologia na URSS existe uma divisão de períodos utilizada por John Foster dividida em (1) A jovem ecologia soviética – que vai de 1917 até meados dos anos 30; (2) a fase intermediária, que compreende o período de Stalin, seguindo dos anos 30 ao final dos anos 50; e, (3) a ecologia soviética tardia, que inicia no final dos anos 50 e se estende até a queda do muro de Berlim e o fim da URSS.

Marx e Engels já notavam em seus escritos a incompatibilidade do modo de produção capitalista e um ponto de vista ecológico sobre o desenvolvimento. Experiências como a da Economia Solidária com suas práticas de autogestão e trabalhos em rede, que desenvolvem projetos feministas e enegrecidos, hoje já apontam nesse sentido como um caminho revolucionário a ser trilhado. Para evitar catástrofes ambientais, a criação de uma sociedade baseada não nos princípios capitalistas de lucro e competitividade enquanto valores máximos, mas sim nos princípios de cooperação, sustentabilidade e solidariedade é urgente.

Mesmo uma sociedade inteira, uma nação ou todas as sociedades simultaneamente existentes, tomadas em conjunto, não são proprietárias da terra, são simplesmente seus possuidores, seus beneficiários e têm que legar em um estado melhorado para as gerações sucessivas […]” – Karl Marx (1981: 911), O Capital, Tomo III.

Hoje os marxistas se definem como ecossocialistas. Na busca da convergência entre o pensamento socialista e a militância ecologista de esquerda, atualmente a luta ecológica pressupõe reorganizar produção e consumo desde pequenas experiências locais e pensar em escala mundial, algo impossível sob a hegemonia do capital. Pressupõe criar um modo de vida alternativo à produção ilimitada de mercadorias inúteis, destinadas ao descarte para erguer montanhas nos “lixões” das grandes cidades.

O capitalismo coloca em risco a vida sob a Terra: a eminência de catástrofes, desertificação, desaparecimento continuo de espécies, redução dos reservatórios de agua potável, aumento do nível dos mares e tudo o que isso promove de flagelo humano.

O futuro da luta socialista se encontra na capacidade de incorporar os conceitos ecológicos na sua visão de desenvolvimento e o futuro da luta ecológica está na incorporação das noções de luta de classes. Esta fusão num programa ecossocialista é determinante para gerar força política e social para incidir no dilema crucial da nossa civilização:  a escolha entre socialismo ou barbárie.

Para saber mais:
A Ecologia Soviética Tardia e a Crise Planetária – Foster, John Bellamy
Manifesto Ecossocialista Internacional

Veja também

Eleições no Estados Unidos e a crise de hegemonia | Nara Roberta da Silva

O retorno de Trump marca uma derrota histórica – não apenas para os democratas, mas …

Comente com o Facebook