Precarização de direitos é responsável pelo alto número de acidentes e adoecimento no ambiente de trabalho

Héber Carvalho

Em 2023 foram registradas cerca de 600 mil notificações de acidentes de trabalho no País, além 3,5 milhões de pedidos de licença média por motivos de saúde relacionados ao trabalho

Foto: Gustavo Bezerra

É necessário ampliar a fiscalização das condições de trabalho precárias ou insalubres, especialmente para trabalhadores informais, terceirizados ou vinculados a plataformas digitais. O alerta foi feito pelos participantes da audiência pública sobre o “Abril Verde, Ambiente Digno e Seguro de Trabalho”, realizada pela Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (14/5). No debate proposto e presidido pelo deputado Bohn Gass (PT-RS), foi apontado o alto número de notificações de acidentes de trabalho no País, cerca de 600 mil em 2023, além 3,5 milhões de pedidos de licença média por motivos de saúde relacionados ao trabalho.

Ao lembrar que, recentemente, foi realizada a campanha Abril Verde, para conscientizar a população sobre os riscos de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, Bohn Gass declarou logo no início do debate que é preciso que a sociedade se mobilize para garantir cada vez mais direitos que assegurem a segurança física e mental de todos os trabalhadores.

O aumento da informalidade, da plataformização, da terceirização e flexibilização dos direitos e salários, cada vez mais precarizados, segundo o deputado, são desafios enfrentados pelos trabalhadores frente aos interesses do capital. “Para o processo de trabalho garantir a saúde física e mental dos trabalhadores, é preciso somar forças, através da participação e do controle social, e da ocupação dos espaços coletivos e institucionalizados, para ampliação do debate e fortalecimento do dialogo necessários ao enfrentamento e combate as violências no mundo do trabalho”, defendeu Bohn Gass.

Ele apresentou dados preocupantes sobre os acidentes e doenças relacionadas ao mundo do trabalho no País. Segundo dados do Observatório de Segurança de Saúde do Trabalho, organizado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), na década entre 2012 a 2022, foram registrados mais de 6 milhões de afastamentos por acidentes ou doenças relacionadas ao trabalho. Nesse período, houve ainda mais de 2 milhões de afastamentos motivados por acidentes, que resultaram em 26.417 mortes, ou, 1 morte a cada 3 horas e 47 minutos.

Naturalização dos acidentes

A procuradora do Trabalho e Coordenadora Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e Saúde do Trabalhador e Trabalhadora do MPT, Cirlene Zimmermann, apontou que o alto número de acidentes e afastamento por doenças relacionadas ao trabalho não podem ser normalizados.

“Será que naturalizamos 600 mil pessoas no mercado de trabalho formal se acidentarem todos os anos no Brasil? E isso é só os acidentes típicos, porque aos adoecimentos relacionados ao trabalho muitas vezes não aparecem nas estatísticas, principalmente os ligados a saúde mental. Se estamos naturalizando isso, esse é o momento de dizer não. As instituições que estão aqui não aceitam que seja assim”, afirmou.

Plataformas digitais de transporte de mercadoria

Outro ponto apontado para a ocorrência de milhares de acidentes de trabalho é a falta de condições dignas de segurança para trabalhadores vinculados a plataformas digitais de transporte de mercadoria. O ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Alberto Carlos Balazeiro, revelou que dos 30% dos atendimentos no Hospital Sarah Kubitschek em Brasília – referência nacional em neuro-reabilitação, inclusive ortopédica – são de trabalhadores que prestam serviço em motocicletas.

“Estamos ceifando, matando uma geração de jovens, a maioria negros, com idade até 25 anos, que fazem entrega de comida ou produtos em alta velocidade, sem nenhum tipo de proteção, nem proteção previdenciária. O número de lesões irreversíveis e impressionante”, lamentou.

Para alterar esse cenário, o ministro do TST defendeu que o Congresso ratifique, o mais rápido possível, a Convenção 187 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Essa Convenção introduz novos paradigmas para a promoção da segurança e saúde no ambiente do trabalho, apontando para a implementação do gerenciamento de risco nas organizações, além da adoção de uma cultura nacional de prevenção em matéria de segurança e saúde no trabalho.

Governo Lula atento ao problema   

Durante a reunião foi destacado que o Governo Lula está atento ao problema e vem adotando medidas para aumentar a segurança dos trabalhadores. O diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego, Rogério Silva Araújo, informou, por exemplo, que a pasta vem revisando várias Normas Regulamentadoras (NRs), que estabelecem regras e requisitos obrigatórios para empresas e estabelecimentos adotarem, visando garantir a saúde e segurança a seus trabalhadores.

Entre vários exemplos, ele citou a revisão da norma que retirou em 2022 (durante o governo Bolsonaro) a insalubridade de trabalhadores expostos ao calor a céu aberto, bem como da norma sobre os limites de exposição de trabalhadores a 55 tipos de agentes químicos. Essa última revisão havia sido feita em 1978.

“O trabalhador não pode voltar para casa adoecido, com lesão ou, ainda mais grave, não voltar ao seio familiar. Por isso, defendemos a prevenção e esperamos, cada vez mais, essa consciência social para prevenirmos os acidentes no ambiente de trabalho”, disse.

Direitos trabalhistas

Por sua vez, o presidente da Fundacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho), Pedro Tourinho, apontou como grande culpado da maioria desses acidentes e afastamentos de trabalhadores por motivos de saúde a precarização dos direitos trabalhistas.

“Tudo isso, relacionado a precarização, principalmente por aplicativos, das plataformas, que estabelecem uma relação de trabalho com outra roupagem, outra forma de contratação, que não garante direitos e segurança do trabalhador. Essa é uma realidade inconveniente para alguns, que julgam o fato de ter um emprego ou uma ocupação como suficiente para negligenciar outros aspectos de risco e periculosidade no trabalho”, observou.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) também discursou durante a audiência pública defendendo mais segurança e atenção à saúde dos trabalhadores.

Entre as várias entidades, participaram ainda do debate representantes do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait); do Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e Ambiente de Trabalho (Diesat); do Ministério da Saúde e do Movimento Amplia AFT.

Héber Carvalho, Via PT na Câmara.

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