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Meu susto e o de Bush

A festa de Halloween é um evento tradicional nos Estados Unidos. De uma maneira passiva e até submissa, a data vem sendo incorporada por países do hemisfério Sul

Ao caminhar por uma rua de Montevidéu no fim do mês passado, levei um susto enorme ao encontrar um diabo, um grito e a morte, tranqüilamente passeando. Explico: encontrei três crianças fantasiadas. Num primeiro momento, imaginei que se tratava de alguma escola que havia promovido uma festa de fantasia. Mas sinceramente não tinha gostado, não das fantasias, mas de ver crianças as utilizando.

Ora, que mal gosto uma família fantasiar uma criança de diabo, quando no máximo ela deve ter feito pequenas diabruras, mas nenhum grave pecado que a identificasse como tal. É até pecado, imaginam alguns, fantasiar uma criança de diabo.

Também não gostei da morte, carregando sua arma ceifadora, representada por uma criança. Pois quem mais carrega vida e esperança de vivê-la por longos anos são justamente as crianças. Quanto ao grito, não me incomodou, pois demonstra pelo menos, que os pais conhecem um pouco de artes plásticas.

Para ser entendido, explico o que era a fantasia de grito. Trata-se de uma máscara retratando a cara do famoso quadro de Edvard Munch, pintor norueguês que achava mais importante pintar as emoções que as pessoas.

Imagino a dificuldade em pintar o subjetivo: dor, medo, paixão, etc. Para quem sente dor, amor, medo e dá gritos de horror, a emoção é objetiva. Para quem assiste, subjetiva. Vi há muitos anos uma exposição de alguns dos quadros de Munch, e lá estava “O Grito” com uma expressão forte que objetivamente penetrava na alma e afetava as emoções.

Nem bem me recupero do susto, vejo, numa quadra abaixo na mesma rua da capital uruguaia, um par de crianças com fantasias de bruxas. Parei, pensei, e concluí: hoje é 31 de outubro, dia de “halloween”. Confesso que fiquei decepcionado, pois bem que poderia ser uma simples festa de fantasia ou simples travessuras de crianças.

Decepcionado, perguntei-me por que numa escola no Uruguai se festeja esta data, sabendo que o povo uruguaio é um povo culto, portanto, imagina-se, crítico. Aliás, esta mesma pergunta também já fiz em relação ao Brasil.

Comemora-se no Uruguai, no Brasil e em muitos outros países do mundo porque pelo menos parte da população está culturalmente dominada. Só espero que não esteja também sendo festejado no China. Aí sim estamos perdidos (nós e os chineses).

A festa de Halloween, hoje conhecida como o dia das bruxas, é um evento tradicional nos países anglo-saxônicos, principalmente Estados Unidos. De uma maneira passiva e até submissa, a data vem sendo incorporada por alguns países do hemisfério Sul.

Infelizmente, quem incorpora a cultura dos dominadores acaba, por vezes, por esquecer a própria. Quando mesmo é comemorado o dia do Saci?

Se, ao ver algumas crianças fantasiadas, me assustei, imagino o susto que levaria o Bush se, numa rua qualquer dos Estados Unidos, encontrasse o Bin Laden, que, segundo Michael Moore (documentário Fahrenheit 11, sobre o 11 de setembro), um dia negociou com a família Bush.

A polícia dos Estados Unidos encontrou, no mesmo dia 31 de outubro, um cidadão fantasiado (para comemorar o dia das bruxas) de Osama Bin Laden, portando metralhadora e cinto de explosivo, falsos. Encontrou e o prendeu.

Fico contente em saber que, enquanto alguns se submetem à cultura dos poderosos, outros protestam, como foi o caso deste cidadão norte-americano, que aproveitou o dia de Halloween para protestar contra a política de Bush. E fez o protesto com razão, pois a invasão do Iraque deu razão de vida à Al-Qaeda.

Torço para que meu próximo susto seja encontrar muitos Sacis pelas ruas a festejar seu dia. Torço também para que a cultura dos dominadores, o terror e os terroristas sejam derrotados.

Dr. Rosinha, médico pediatra, deputado federal (PT-PR) e secretário-geral da Comissão do Mercosul.

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