Potencial democratizante faz da Economia Solidária projeto estratégico.
Elvino Bohn Gass
A Economia Popular Solidária – ou, como alguns a chamam nos meios acadêmicos, Economia Social -, é uma prática que cada vez mais ganha espaço na indústria, no comércio, nos serviços e em setores como a agricultura familiar ou as associações de trabalhadores, sejam elas rurais ou urbanas. Não se trata de uma prática nova. Desde o século XIX até hoje, se sucedem as propostas de cooperativas e práticas de produção solidária no interior do capitalismo. Mas se, por um lado, isto garante tradição e história à Economia Solidária, de outro, isto também fez com que muitas experiências tenham se adaptado ao sistema, transformando-se em cooperativas degeneradas, muito distantes dos princípios fundadores.
A Economia Popular e Solidária de que falamos é aquela que o professor Paul Singer define como “um modo de produção e distribuição alternativo ao capitalismo, criado e recriado periodicamente pelos que se encontram ou temem ficar à margem do mercado de trabalho. A Economia Solidária casa o princípio da unidade entre posse e uso dos meios de produção e distribuição com o princípio da socialização destes meios”. Como se vê, este conceito encerra um método. E este método pressupõe autogestão, distribuição equânime dos ganhos (ao contrário da lógica capitalista tradicional, em que o lucro é apropriado) e igual poder de voz a todos os participantes. De novo Paul Singer: “queremos pessoas que não queiram ser vencedores para que não haja perdedores”. Economia Solidária é isso. Trabalho e renda verdadeiramente democratizados.
De sua parte, o Estado e as políticas públicas no Brasil têm tido historicamente um caráter funcional ao desenvolvimento do setor privado capitalista, com raras ações no sentido da distribuição de seus recursos para os trabalhadores. Sob a égide das políticas neoliberais, durante dez anos, não apenas a riqueza do país ficou ainda mais concentrada, como também o Estado foi abdicando de sua responsabilidade pública de garantir vida digna para seus cidadãos, na medida em que foi transferida para o chamado “terceiro setor” a responsabilidade pelo desenvolvimento de políticas sociais.
A várias mãos. Cooperativa democratiza trabalho e renda, como
no caso dos agricultores de Concórdia.
Está sendo necessário, portanto, reconstruir não só a capacidade reguladora e indutora da distribuição de riquezas, como também reconstruir uma relação estado-sociedade com caráter republicano e democrático. Para isso, são necessárias políticas amplas que atuem na diminuição da desigualdade e permitam oportunidades para o desenvolvimento a partir da democratização também da economia. Nesse sentido, a Economia Solidária constitui-se como uma estratégia que comporta grande vigor social e de impacto para o processo de inclusão a partir do desenvolvimento econômico alternativo e, portanto, deve ser foco de investimentos públicos relevantes e adequados para sua expansão e consolidação no âmbito das políticas de desenvolvimento de nossos municípios, estados e da União.
Políticas em curso
As políticas públicas já desenvolvidas por diversas prefeituras no país e a criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), pelo governo Lula, refletem essa visão de Estado. A criação deste órgão tem demonstrado, em menos de três anos de existência, a sua importância estratégica. É através da Senaes, vinculada ao Ministério do Trabalho, que muitos empreendimentos solidários, como fábricas autogestionárias, cooperativas rurais e urbanas, assim como redes de comercialização, estão sendo apoiados a partir de projetos que articulam diferentes ministérios, como Desenvolvimento Agrário, Saúde, Desenvolvimento Social, Cidades e instituições de fomento, como BNDES e Caixa Federal. Além disso, a Senaes realiza uma intervenção que fortalece a idéia de construção de um novo modelo de desenvolvimento para o país, com base no apoio ao desenvolvimento local sustentado a partir da auto-organização dos trabalhadores.
Assim, entendemos que a Economia Solidária é um projeto estratégico de inclusão social, que mantém e amplia oportunidades de trabalho e acesso à renda a partir da democratização da economia, por meio de empreendimentos autogestionários, organizados de forma coletiva e participativa pelos próprios trabalhadores.
A pouca ou quase nenhuma menção sobre o crescimento da Economia Solidária por parte da grande mídia ou dos formadores de opinião não nos surpreende, pois entendemos que na medida em que esta outra economia cresce e avança como alternativa, ela adquire um caráter revolucionário. E assim, como afirmou Paul Singer, abre-lhe a perspectiva de superar a condição de mero paliativo contra o desemprego e a exclusão; ou seja, comprova, em uma prática cotidiana, o questionamento à lógica da exploração e da alienação intrínseca ao modo de produção capitalista, afirmando uma outra sociedade possível, baseada na igualdade e na emancipação social.
Elvino Bohn Gass é deputado Estadual do PT-RS e autor de projeto de lei que cria o Sistema Estadual de Fomento à Economia Popular Solidária no RS.
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Economia Popular e Solidária: um projeto para produzir e viver
Veja ainda a Cartilha produzida pelo mandato do Deputado Elvino Bohn Gass que traz um documento sobre Economia Solidária, o Projeto de Lei e uma vasta bibliografia sobre o tema. (no side do Deputado Bohn Gass –www.deputadobohngass.com.br)
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