Lúcio Costa *
Faleceu no domingo, 4 de outubro, em Buenos Aires, a cantora argentina Mercedes Sosa, uma das vozes mais poderosas da música contemporânea. La Negra, como era conhecida devido aos cabelos escuros, revelador de suas raízes indígenas, faleceu aos 74 a nos de idade, depois de duas semanas internada com um grave quadro de disfunções orgânicas.
Mercedes nasceu em 9 de julho de 1935, na província de Tucuman. A cantora teve uma infância em um lar humilde, onde bebeu da cultura popular chegando a ser professora de danças folclóricas. Os primeiros passos de sua carreira artística foram dados em meados da década de 40 junto com seu esposo, o músico Manoel Oscar Matus. Na época, participou do movimento “Nuevo Cancionero”, que renovou o folclore argentino. Desse período é seu primeiro disco, “Canciones con fundamento”, uma produção independente. A experiência marcou a fogo sua carreira artística, na qual sempre foi presente um forte compromisso político – o que a obrigou a um longo exílio durante a última ditadura argentina (1976 -1983).
Em 1965, conseguiu cantar pela primeira vez no tradicional Festivas de Cosquín, em Córdoba, e gravou o único tema da obra conceitual “Romance de la muerte de Juan Lavalle”, escrita por Ernesto Sábato e musicada por Eduardo Falú. Durante os anos 70, chegou a atuar sob a direção do argentino Leopoldo Torre Nilson, nos filmes de “El santo de la espada”, sobre o herói da independência argentina, Jose de San Martín.
Durante mais de 40 anos, Mercedes Sosa desenvolveu uma carreira impressionante, na qual gravou 40 discos, percorreu o mundo e foi aclamada pelo público dos cinco continentes. Cantou na Capela Sistina do Vaticano (dezembro de 1984), no Carnegie Hall em Nova York (fevereiro de 2002) e no Coliseu de Roma (maio 2002) para pedir pela paz no Medio Oriente junto com Ray Charles e outros.
“Ela foi a voz dos que não tinha voz na época da ditadura (1976-1983) e levou a angústia pelos direitos humanos na Argentina a todo o mundo”, declarou o músico argentino Victor Heredia, cantor e compositor de alguns temas que Mercedes tornou famosos, por exemplo, “Razón de Vivir”. Heredia recorda que Mercedes Sosa viveu “situação muito complicadas em sua vida, como os exílios, os regressos, as angústias e as alegrias”, e sua vida foi marcada por um forte compromisso com os movimentos populares.
Mercedes Sosa é considerada responsável pela difusão mundial da obra da poetisa e cantora chilena Violeta Parra. Além disso, popularizou canções dos cubanos Silvio Rodríguez e Pablo Milanés, bem como de Milton Nascimento.
Provocadora nata, Mercedes Sosa desafiou os tradicionalistas do folclore e inaugurou uma parceria inédita com músicos provenientes do rock como Charly García, Fito Páez e León Gieco. Da mesma forma, não teve medo da lírica, chegando a gravar com cantores de ópera.
Várias vezes condecorada, em 1992, foi declarada cidadã ilustre de Buenos Aires. “Os prêmios não são porque canto, são porque penso. Penso nos seres humanos, na injustiça. Penso que se eu não houvesse pensado, outro seria o meu destino”, disse, uma vez, sobre sua exitosa carreira. “Quero que haja paz, porque é a única forma com que se pode mudar as coisas”, definiu. Que vivam a voz e os pensamentos de Mercedes.
* Com informações de La Jornada e Pagina 12.
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