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A grande vitória: uma contribuição às definições do PT

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A derrocada no centro do capitalismo do paradigma neoliberal, que já vinha demonstrando nos anos últimos anos grande perda de legitimidade, cria um espaço novo e mais amplo para a retomada da cultura socialista, para a elaboração de programas pós-neoliberais e de movimentos que se relacionem mais diretamente com o socialismo.

Este novo período histórico pode ser, pois, decisivo para a edificação do socialismo internacionalista do século XXI.

(IX Conferência Nacional da Democracia Socialista, junho de 2009)

I. Da disputa de projetos à construção de uma nova hegemonia

As possibilidades do novo período político

1. A eleição da companheira Dilma corresponde ao novo período político marcado não só pela superação do neoliberalismo como, sobretudo, pela possibilidade da construção de uma nova hegemonia no Brasil.

2. O segundo mandato do Governo Lula desenvolveu avanços significativos nessa direção. O mais contundente foi a supremacia da agenda do desenvolvimento, com forte inclusão social e avanços iniciais na distribuição de renda.

3. Interrompemos o projeto neoliberal e iniciamos uma alternativa de desenvolvimento nacional. Incompleta, com muitos desafios pela frente, mas uma alternativa que retirou milhões da miséria, que fortaleceu econômica e socialmente a classe trabalhadora, reduziu a dependência externa do Brasil, abriu um novo período para as políticas sociais públicas, em particular a educação, e vem permitindo que seu desdobramento seja disputado vitoriosamente pela esquerda.

4. É importante assinalar uma vitória estratégica contra o neoliberalismo no Brasil, anterior à vitória eleitoral. Trata-se do enfrentamento da crise internacional de 2008-2009 com uma intensa atuação anticíclica do governo, que, podemos dizer, ultrapassou os limites do keynesianismo. A política de elevação do salário mínimo foi mantida, assim como as políticas sociais. Os bancos públicos foram fortalecidos e ganharam mais espaço face aos bancos privados. O Banco Central, ainda que com enorme atraso, ficou menos autônomo. A oferta de empregos manteve-se em crescimento mesmo em 2009. Com isso, o Brasil retomou o crescimento – e de forma menos dependente em relação à globalização neoliberal.

5. Nesse contexto, a oposição liberal começou a perder antes das eleições. Frente a um governo com elevadíssimo índice de popularidade e diante do desgaste das principais bandeiras neoliberais, a candidatura Serra chegou ao fim de agosto de 2010 em crise de identidade e com menos de 25 % dos votos nas pesquisas. A partir daí, articulando uma ampla aliança liberal conservadora, iniciou, com o franco apoio da mídia empresarial, uma campanha inédita em sua violência e reacionarismo contra a candidatura Dilma. O segundo turno foi, então, travado em meio a uma forte polarização ideológica direita versus esquerda, na qual a candidatura Dilma retomou a ofensiva política, apoiada em ampla mobilização dos movimentos sociais. Apesar de não contar hoje com um projeto nacional alternativo, de estar claramente dividida entre estratégias políticas de oposição e lideranças, os liberais conservadores conseguiram polarizar parte expressiva do eleitorado e conquistaram governos estaduais importantes. Bastante enfraquecido no Congresso Nacional, em crise programática, é razoável supor que a oposição liberal conservadora necessitará de uma reorganização programática e partidária, para que volte a ter capacidade de polarizar uma disputa nacional.

A oposição liberal e sua onda conservadora

6. Sem capacidade de desenvolver um projeto alternativo, a oposição liberal optou por uma campanha eleitoral de cunho profundamente conservador. É importante analisar que esta onda conservadora concentrou-se exatamente ali onde existem pontos fracos na cultura brasileira democrática e republicana em formação: os direitos da mulher, em particular o direito ao aborto; a construção dos valores de uma justiça de transição, que julgue os crimes da ditadura militar a partir dos valores da democracia; a apropriação pública pelo PT e pelo governo Lula dos avanços alcançados na luta contra a corrupção; a regulamentação do oligopólio da mídia empresarial nas comunicações e a ausência de uma construção de um setor público democrático nesta área tão vital do processo de formação da opinião. Contou muito para a formação desta onda conservadora, a posição da Igreja católica brasileira, através de uma intervenção direta de setores mais retrógrados da CNBB e do próprio papa.

7. Atacaram frontalmente a nossa candidata por ser uma mulher. Recorreram ao argumento da fragilidade feminina – “Ela não vai dar conta”, dizia a campanha – e da dependência ao presidente Lula, com a afirmação de que sem ele não teria capacidade de governar.

8. A grande mídia incorporou essa campanha. Percebeu aí uma oportunidade de enfraquecer a candidatura do PT. Contribuiu, então, com a agenda do conservadorismo, incluindo aí a criminalização das mulheres pela prática do aborto. A candidata Marina Silva teve um papel importante para esse conservadorismo, posicionando em alguns temas a partir de sua posição religiosa e aliou um programa liberal-ecológico a posições retrógradas no campo da moral.

9. Embora a candidatura feminina em si representasse uma conquista importante, as respostas da nossa campanha estiveram aquém do acúmulo do PT sobre as lutas das mulheres e o feminismo. Ter uma candidata mulher a presidência da República significava uma oportunidade inédita para tratar questões como a representação política das mulheres desde uma visão de questionamento do machismo. Em contradição com o acúmulo feminista do PT, foi reforçada a relação da nossa candidata com a maternidade e com os estereótipos da feminilidade.

10. No segundo turno, a oposição liberal aprofundou seu investimento no conservadorismo. Mobilizou significativos símbolos retrógrados da história do nosso país, como a TFP – Tradição, Família e Propriedade –, monarquistas, grupos da antiga repressão e da tortura, os setores mais obscurantistas e reacionários da religião (que chegaram ao seu momento máximo com a fala inquisitorial e imperativa do papa Bento XVI). A candidatura do PSDB renunciou o caráter laico do Estado, investiu em cisões regionalistas e estimulou o preconceito de classe, ao valorizar o voto dos mais ricos em detrimento dos mais pobres.

11. No acirramento da disputa, a campanha petista, atacada pelas chantagens de setores da Igreja Católica e de igrejas evangélicas, buscou, de forma equivocada, dar garantias a esses setores, apresentando documento que reforçava a confusão entre religião e política, fragilizando a posição do nosso partido sobre a necessária laicidade do Estado. Assim, nossa campanha não soube responder à tática da onda conservadora da direita brasileira e reforçou uma visão familista de Estado com propostas de políticas que reforçam uma visão tradicional de família, centradas nas mulheres como mães em detrimento de reforçar a construção de sua autonomia. Esta situação nos coloca o desafio de reafirmar a trajetória feminista do PT e de buscar que o Governo Dilma desenvolva os compromissos com a construção de uma sociedade progressista e republicana também em relação aos direitos das mulheres.

12. É possível que ocorra uma reorganização partidária de setores de centro e direita, dada sua crise programática cujo ápice foi a derrota de 2010. As bases políticas para esse processo encontram-se nos governos estaduais conquistados pelo PSDB. De todo modo, parece seguir, por um período ao menos, com enormes dificuldades para uma unidade nacional de projeto.

13. Alguns temas explorados pela direita refletiram aspectos da nossa experiência de governo que permaneceram truncados, como é o caso da reforma política.

14. No novo cenário, é previsível a continuidade de embates políticos com a direita liberal conservadora, mas num quadro de avanços possíveis rumo a uma nova hegemonia da esquerda.

Elementos da situação internacional

O êxito ou o fracasso das forças populares contra o imperialismo e a direita, visando ao fortalecimento e desenvolvimentos dos elementos populares de governos progressistas e ao avanço na transição para um modelo pós-neoliberal, definirá não apenas o papel da América Latina no século XXI (se independente e unida ou se quintal dos EUA), como também a própria face da esquerda latinoamericana – se uma esquerda com poder de convocatória social e capacidade de constituir alternativas anticapitalistas de massas ou se pequenos grupos de propaganda socialista.

(IX Conferência Nacional da Democracia Socialista, junho de 2009)

15.O neoliberalismo, como longa hegemonia específica do capitalismo tardio, vem produzindo crises cada vez mais difíceis de administrar, especialmente nos chamados países centrais. Seu caráter terminal não vem significando, infelizmente, saídas à esquerda, mas um processo desigual (e pouco combinado, por enquanto) de um mundo mais caótico e com poucas expectativas. A crise da globalização neoliberal, que se reflete com mais força na Europa e nos EUA atualmente, pode desencadear uma crise mais ampla do capitalismo. A capacidade de direção dos EUA, em particular, continua a ser minada mas uma saída progressista e de esquerda depende cada vez mais dramaticamente de uma profunda alteração na correlação de forças na ordem mundial.

16. O Brasil tem sido uma exceção, entre os países de maior população e economia. Mas não é razoável supor apenas um quadro de isolamento. Junto com as contradições do neoliberalismo surgem espaços e possibilidades, e uma delas continua sendo o esforço de unidade latino-americana.

17. Em nossa IX Conferência Nacional, afirmávamos que os processos em curso na América do Sul tiveram sua legitimidade sustentada graças ao crescimento econômico e à recuperação parcial de soberania nacional. “Agora, eles dependem mais da construção de legitimidade política e da participação popular ativa para sustentar, aprofundar e enfrentar, desde o ponto de vista dos interesses do povo trabalhador, os novos conflitos que estão a caminho”, dizia a Resolução Política.

18. A presença do Brasil no mundo e uma retomada do internacionalismo em um cenário em que se aguçam as contradições do imperialismo são mais importantes ainda. É claro, no entanto, que esse processo ocorre em meio a uma reorganização desigual do movimento socialista e há muitos sinais de recrudescimento de uma direita retrógrada e com muitos traços de barbárie.

19. O terceiro mandato do PT à frente do governo brasileiro deve, portanto, manter relação de apoio a todos os governos que sinalizem oposição ao neoliberalismo. Nesse sentido, é fundamental avançar na integração regional. Iniciativas como a UNASUL e o Parlamento do Mercosul apresentam-se com potencialidades nessa direção. É preciso que a esquerda latino-americana, no governo de vários países, elabore uma perspectiva mais ampla e mais ambiciosa historicamente de integração continental. Também será fundamental, por todas as razões, as ações políticas em defesa de uma ampla e histórica política de reparação em relação aos direitos dos povos africanos.

II. Governo Dilma

20. A montagem do governo Dilma apresenta boas novas. A primeira e mais importante é o reforço da equipe do Ministério da Fazenda, a saída de Henrique Meireles do Banco Central e sua substituição por Alexandre Tombini, que é funcionário do Banco Central e era o seu diretor de normas.

21. A segunda resulta da difícil negociação com o PMDB. O PMDB deixa três importantes ministérios: Comunicações, Integração Nacional e Saúde. Paulo Bernardo (PT) saiu do Ministério do Planejamento e foi para o Ministério das Comunicações. Para a Integração Nacional, foi Fernando Bezerra do PSB, indicado pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Para a Saúde, foi Alexandre Padilha (PT), que estava na Secretaria de Relações Institucionais.

22. O PMDB permanece no Ministério das Minas e Energia com o mesmo titular Edson Lobão, senador pelo Maranhão. Foi para o Ministério do Turismo, o veterano deputado maranhense Pedro Novais (que não é vinculado ao Sarney e sim ao eterno líder parlamentar Henrique Alves, do PMDB do Rio Grande do Norte). Moreira Franco, ex-governador do Rio de Janeiro, foi indicado pelo vice presidente Michel Temer para ocupar a Secretaria de Assuntos Estratégicos.

23. Neste pequeno balanço inicial, o PMDB perdeu posições. Há que se registrar, no entanto, a saída do ministério do original pensador brasileiro, o diplomata Samuel Pinheiro Guimarães, cuja contribuição à construção de um projeto nacional deve ser mantida.

24. Cabe mencionar ainda outra mudança positiva. O Ministério da Indústria, que nos dois governos anteriores ficou sob direção de Furlan e de Miguel Jorge, ligados à FIESP, agora tem Fernando Pimentel, do PT.

25. O PT assume novas e importantes responsabilidades. Na primeira reunião ministerial, a presidenta anunciou que seu governo terá quatro grandes áreas, coordenadas da seguinte forma: 1) Econômica – Guido Mantega da Fazenda, 2) Infra Estrutura – Mirian Belchior do Planejamento, que passa a coordenar o PAC, 3) Combate a Pobreza – Tereza Campelo do Desenvolvimento Social e 4) Cidadania – Gilberto Carvalho da Secretaria Geral.

26. Reparem que são quatro petistas que participaram dos oito anos do governo Lula em áreas importantes. Lembremos também que Mirian Belchior e Tereza Campelo colaboravam com a então Ministra Dilma na Casa Civil, na coordenação do PAC e dos grandes programas sociais (Territórios da Cidadania, Minha Casa Minha Vida).

27. A definição do companheiro Afonso Florence como Ministro do Desenvolvimento Agrário é uma grande vitória da DS. Além disso, reflete com justiça e legitimidade o trabalho que realizamos nos oito anos anteriores e perfeitamente de acordo com a nossa proposição de continuidade na direção do MDA com avanços. A Democracia Socialista reafirma seus compromissos com o Governo da companheira Dilma, numa área onde aprendeu e acumulou enormemente – sendo reconhecida por seus méritos na gestão dos companheiros Miguel Rossetto e Guilherme Cassel, não só pelo núcleo central do governo anterior e por boa parte dos movimentos sociais, como também por diferentes governos progressistas de outros países e por organismos internacionais. A partir de agora, tem o desafio de manter e inovar em políticas públicas para o desenvolvimento rural, notadamente para colaborar com o objetivo central do governo que é erradicar a pobreza extrema.

28. A expectativa de que o governo Dilma será de continuidade e de avanços em relação ao governo Lula se delineia positivamente.

29. Continua a haver, no entanto, a lacuna política-democrática na formulação dos objetivos e no discurso do governo. Salvo engano, a reforma política, por exemplo, não foi mencionada até agora com centralidade. Cabe contribuir para superar essa lacuna no âmbito do governo, dos movimentos sociais, da bancada e das instâncias do PT.

Abrimos um novo tempo de potencialidades

30. Enunciar a idéia de um novo período político no Brasil pós-neoliberal deve significar novas tarefas e o esforço de atualização dos desafios programáticos. O novo período aberto com a chegada do PT ao governo central do país é marcado pela possibilidade da conquista de hegemonia da revolução democrática no Brasil. E seu horizonte é a vinculação da revolução democrática com o socialismo.

31. Fomos capazes até agora de impor derrotas ao neoliberalismo, de erguer um novo modelo de desenvolvimento, de integrar amplas massas ao conceito de nação e de contribuir para iniciar mudanças importantes no cenário internacional em oposição ao imperialismo, de recuperar e desenvolver a capacidade de ação do Estado no planejamento público e nas políticas sociais.

32. Devemos assumir o desafio de inserir uma profunda inovação política no centro desse modelo de desenvolvimento. Trata-se de aprofundar sua dimensão política democrática. Essa é a idéia fundamental da revolução democrática, conceito trabalhado pelo PT desde 1994, retomado pelo 3º e 4º Congressos, e que deve ser atualizado.

33. Nesse novo quadro, devemos compreender o Governo Dilma, localizar os novos potenciais políticos e um novo papel dos movimentos sociais e esforçarmo-nos numa ampla atualização do nosso partido.

34. A Central Única dos Trabalhadores, em sua resolução pós-eleições, definiu a seguinte tarefa estratégica frente à eleição da presidenta Dilma: “À inclusão econômica e social – base social fundamental junto com o fortalecimento da classe trabalhadora – devemos agregar a “inclusão” democrática. A luta por um processo amplo e participativo de reformas democráticas na sociedade e no Estado – na supremacia da sociedade sobre os mercados, nos direitos do trabalho, na eliminação da pobreza, na rápida redução da desigualdade social, na emancipação das mulheres e dos jovens e na conquista da igualdade racial, na relação com o meio-ambiente, na democratização da comunicação, na reforma política e na democracia participativa – tem novas e melhores condições e forças para avançar”. Temos amplo acordo com essa formulação.

35. A reforma política, por sua vez, deve ir ao centro dos objetivos do mandato da nova presidenta. Além da reforma eleitoral democrática, deve ter como objetivo propiciar o protagonismo popular nas decisões políticas. O Presidente Luis Inácio Lula da Silva, agora presidente de honra do PT, pode liderar uma grande mobilização nacional, abarcando o conjunto dos partidos progressistas, através de debates em todo o país , em torno dos cinco Projetos de Lei ordinárias que tramitam no congresso nacional, que tratam sobre a reforma política, a fim de acumular força social que pressione no sentido de sua aprovação.

36. A reforma política é um quase-consenso no PT no que diz respeito ao seu conteúdo (centralidade do financiamento público das campanhas e do voto em lista) mas não em relação ao caminho para conquistá-la. Há dois tipos de resistências a serem vencidas: os partidos liberais e conservadores que são, em geral, favoráveis ao financiamento privado irrestrito e sem controle das campanhas e a dos políticos fisiológicos, que sobrevivem e se reproduzem a partir do que há de antirrepublicano no sistema partidário e eleitoral. O grande desafio da reforma política é, portanto, a partir de uma unidade partidária mais ampla, capaz de abarcar os partidos de esquerda e centro-esquerda, ganhar as batalhas do apoio da opinião publica e dos movimentos sociais. Sem esta unidade ampla e pressão social, o Congresso Nacional não votará uma reforma política progressista.

37. Por isso, é fundamental , junto com a reforma política, introduzir a democracia participativa a partir de elementos já praticados em caráter inicial pelo governo, como as conferências nacionais, os conselhos setoriais, os Territórios da Cidadania e dos elementos acumulados pelo PT nas suas práticas de governo municipal e estadual ( nesse caso, do RS). Será fundamental avançar em proposições que coloquem em discussão a aplicação do orçamento federal. Além disso, o governo Lula acumulou mobilização e propostas de políticas públicas através das inúmeras e muito representativas Conferências Nacionais realizadas em todas as áreas do conhecimento. O resultado, tanto em conteúdo quanto em mobilização, destas conferências é tão significativo e transformador que deve servir de referência para o governo Dilma. Valorizar o resultado das conferências nacionais, traduzi-las em projetos de lei e políticas públicas, fortalecerá a credibilidade do povo brasileiro na democracia, na sua capacidade de ser protagonista de uma nova história para o país.

38. O processo de revolução democrática exigirá o estabelecimento democrático de novas bases de formação da opinião pública no Brasil. Esta conquista histórica deverá abarcar três dimensões conjugadas: a aprovação de marcos democráticos que regulem a comunicação e garantam transparência aos processos de outorga e renovações de concessões públicas, além da proibição da propriedade cruzada, como já existe em muitos países democráticos; a construção dos meios de comunicação pública, como a TV Brasil, pluralista e dirigida com participação da sociedade civil organizada; o incentivo à inclusão , ao pluralismo e à formação de redes de comunicação alternativas que reflitam as vozes plurais da cidadania brasileira em formação.

39. Uma revolução democrática, enfim, só pode se realizar com enorme movimento de mudança cultural. Para tal, educação e cultura, com participação cada vez maior dos debates e produção coletiva do público, são esferas decisiva para a produção de uma nova cidadania libertária, igualitária e democrática. A educação, que tem o acesso ampliado em grande velocidade no país, deve ser transformada também qualitativamente, combinando-a com o projeto de sociedade que temos construído. Precisamos disputar os currículos da educação técnica e do ensino médio, que se ampliarão significativamente. É preciso construir as condições para uma formação humanista plena, contrária aos interesses da sociedade de mercado.

Nossa participação no Governo

40. Um dos avanços programáticos dos oito anos de governo Lula foi o desenvolvimento rural articulado com o desenvolvimento no interior do país e com um novo modelo agrícola. É amplo o reconhecimento por parte do governo e do PT, das entidades representativas dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, dos movimentos sociais em torno da agricultura familiar, que o MDA formulou e avançou com políticas públicas acertadas para o campo. É reconhecido também o papel central dos companheiros e companheiras da DS que dirigem o Ministério desde 2003. Acumulamos, como corrente política, uma enorme e exitosa experiência de governo. Daremos continuidade a esta experiência. Será fundamental neste novo período criar novas condições institucionais e de apoio social para o avanço qualitativo da política de reforma agrária.

41. Junto com ele, devemos contribuir para o sucesso do governo em seu conjunto. Essa contribuição se dá no governo, nos movimentos sociais e no PT.

Avançar a correlação de forças a partir de vitórias do PT e da esquerda e da atividade dos movimentos sociais

42. A vitória nas sucessões estaduais – continuidade no Acre, reeleição na Bahia e em Sergipe e reconquista do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal – tem enorme papel na nova correlação de forças no plano institucional. Ela se junta às ampliações de bancada parlamentar e às conquistas dos partidos de esquerda nas alianças das quais participamos. Desenvolver nos governos estaduais elementos programáticos de hegemonia é uma tarefa central que contribui também para o avanço da experiência de governo no plano nacional, especialmente no que se refere à democracia participativa. Do mesmo modo, contribuir para uma nova e mais democrática prática parlamentar associa-se à luta pela reforma política democrática.

43. A derrota que o PT sofreu no Pará deve servir de aprendizado e cabe reorganizar as forças e preparar, no partido, uma nova estratégia de disputa. Do mesmo modo, derrotas importantes, como a de Minas Gerais, onde o partido perdeu identidade e unidade frente ao avanço da capacidade de polarização e cooptação do PSDB, devem servir para revisão de trajetórias e recomposição de projetos estaduais de disputa.

44. Em todos os estados devemos contribuir para uma estratégia de aproximar as condições estaduais de disputa à condição nacional de construção de uma hegemonia democrático-popular.

45. Aos movimentos sociais populares e ao movimento sindical está posto o desafio de reconstituir uma dinâmica unitariamente ofensiva por ampliação dos direitos e da democratização da sociedade e dos espaços de poder.

46. Especialmente na CUT, cabe desenvolver uma atualização de tarefas e de perspectivas buscando aumentar o protagonismo social. Em momentos decisivos, a CUT demonstrou seu potencial de mobilização de massas e de unificação das lutas sociais. Nossa Central cumpriu papel fundamental para consolidar o novo período político com a vitória de Dilma presidenta. O reposicionamento dos temas relacionados ao trabalho demonstra o potencial da luta sindical.

47. À juventude brasileira cabe a necessidade de formular novos desafios diante das potencialidades abertas. A nova dinâmica do desenvolvimento brasileiro deve incorporar os temas relacionados à condição social da juventude. Com isso, será potencializado seu protagonismo social com a mesma ênfase da ampliação de direitos. A educação reassume centralidade nessa agenda democrática. Diz respeito à ampliação do acesso, mas também ao conjunto de políticas sociais emancipatórias que permitam à juventude permanecer no sistema educacional em todos os níveis, produzir cultura livre e não entrar precocemente no mercado de trabalho. Não há revolução democrática sem a incorporação da agenda emancipatória da juventude, que supere a realidade segundo a qual a precarização do trabalho de jovens é aliada indissociável da pobreza e da evasão escolar.

III. PT: ofensividade na sociedade, no governo e na construção partidária

48. O PT deve se preparar para assumir um papel de vanguarda na construção de uma nova hegemonia no país em conjunto com as forças de esquerda, com setores democráticos e com os movimentos sociais que, no 1º turno e mesmo no 2º turno, se posicionaram pela eleição de Dilma. Nosso partido realizou o 4º Congresso e dele tirou uma plataforma abrangente de reformas democráticas na sociedade brasileira, um programa da revolução democrática com a perspectiva do socialismo.

49. O PT pode – e devemos lutar por isso – desenvolver uma plataforma de complementação, aprofundamento e superação a partir do programa econômico e social em curso. Em outras palavras, buscar imprimir uma perspectiva socialista.

50. O PT precisa posicionar-se de maneira mais ofensiva em três dimensões: em relação à sociedade, ao governo e à própria construção partidária.

a) O espaço para politização e organização na sociedade deve ser maior e mais favorável à democracia. Nossa visão de democracia é inseparável do caráter participativo e da conquista da força política da classe trabalhadora, da CUT em especial. Nesse sentido, devemos não apenas apoiar a Plataforma da CUT, como contribuir para desenvolvê-la politicamente;

b) Nosso governo apresenta uma tendência economicista, com a qual devemos nos relacionar no sentido de sua complementação, aprofundamento e superação. O programa econômico é um avanço fundamental e tem conseguido elevar as condições de vida de amplas massas proletárias. Sem isso, não há bases sociais para a democracia. Mas é insuficiente para um programa de emancipação social, ou seja, para o socialismo. Além disso, o aprofundamento exigiria mudanças de qualidade nas relações de trabalho, de propriedade, gênero e elementos da luta pela igualdade;

c) Em relação ao próprio PT, devemos lutar para garantir a continuidade da reconstrução de sua identidade socialista e ética. Avançar em sua construção como uma força socialista de massas, capaz de incorporar partidariamente uma ampla camada da sua base social. E recompor sua capacidade de intervir politicamente na sociedade e no governo.

51. No processo eleitoral o PT chegou a alcançar nas pesquisas 30% de preferência partidária (embora no voto proporcional tenha alcançado 16%), elegeu 5 governadores, 11 novos/as senadores/as e 88 deputados/as. Na campanha, em particular, no segundo turno, percebemos a reaproximação de gerações antigas e uma nova leva de militantes que combateu a direita e defendeu a conquista do nosso 3º governo.

52. Outros partidos de esquerda que lutaram pela eleição de Dilma também cresceram, acompanhando esse movimento ascendente. A CUT e os movimentos sociais tiveram papel muito decisivo.

53. Esse quadro coloca novo potencial para a construção partidária petista e para a formação de amplo campo de esquerda e de setores democráticos com vocação hegemônica na sociedade.

54. Um elemento muito importante no PT é a reforma organizativa-estatutária prevista como continuidade do 4º Congresso e que deveremos assumir como uma das tarefas centrais e em grande sintonia com a reforma política.

55. As eleições de 2012 devem merecer atento trabalho de preparação para ampliar as conquistas no plano municipal. Elas devem se constituir em um momento de aprofundamento das conquistas populares nesse âmbito.

56. O marco unitário conquistado pelo PT no 4º Congresso deve ser mantido como uma das condições importantes de avanço.

IV. DS: crescemos junto com o PT e temos melhores condições de contribuir

57. Crescemos junto com o partido. Esse desafio sempre presente na nossa construção mais uma vez foi superado e nos coloca hoje em melhores condições para prosseguir nossa contribuição nos governos do PT ou em aliança e na construção partidária.

58. Do mesmo modo que defendemos uma atualização das tarefas e da organização partidária, cabe à nossa corrente similar esforço. Nossa última Conferência Nacional foi realizada em 2009. Realizaremos, em 2011, nossa X Conferência. O seu objetivo central, então, será elaborar um programa da revolução democrática para o período, capaz de dialogar com as potencialidades e também com os impasses do nosso movimento político. Este programa deve ser capaz de unir de forma coerente a elevação da consciência política em direção aos valores afins ao socialismo, do feminismo e do anti-racismo, mudanças estruturais na correlação de forças entre as classes sociais e mudanças qualitativas na natureza do Estado brasileiro, no sentido da sua democratização e superação dos privilégios do grande capital (na gestão do sistema financeiro, do agronegócio, do sistema tributário brasileiro fortemente regressivo, dos poderes não regulados democraticamente das grandes mídias empresariais, das relações da economia brasileira com o mercado mundial, etc). Todas estas mudanças devem se combinar com a busca da superação das raízes e fundamentos patriarcais e racistas do Estado e da sociedade brasileira. A elaboração deste programa da revolução democrática, cuja meta pressupõe um novo ciclo de forte e elevada articulação de lutas sociais e culturais com as práticas institucionais, será fundamental para renovar o horizonte histórico da práxis do PT, dos partidos de esquerda, e dos movimentos sociais brasileiros. Além disso, será um componente fundamental para a renovação das condições de legitimidade e governabilidade política do governo Dilma, para além de um horizonte parlamentar.

59. Até lá, devemos dar conta da nossa participação no governo federal e nos governos estaduais liderados pelo PT ou em aliança na qual participamos.

60. Ao mesmo tempo, com mais condições para um efetivo funcionamento nacional, devemos reforçar organicamente nossa corrente, adequando as instâncias nacionais a essa nova e melhor situação. Será cada vez mais decisivo integrar os companheiros eleitos para o Congresso Nacional nos esforços da direção nacional da tendência.

61. Para tanto, será imprescindível recompor o funcionamento do escritório nacional da DS, a partir do qual teremos maior capacidade de coordenar nossa organização, comunicação, formação e sustentação financeira.

V. Mensagem ao Partido

62. O movimento Mensagem ao Partido, que conta com a nossa decisiva presença, também cresceu junto com o partido. Pode assumir os desafios postos ao PT e contribuir na sua solução com a perspectiva socialista e democrática.

63. Nossa forte presença em governos estaduais e na nova bancada aumenta nossa responsabilidade no avanço da luta pela revolução democrática no Brasil. Esse quadro requer organicidade e ação coordenada de nossos parlamentares, bem como sua relação com a dinâmica partidária e com os movimentos sociais.

64. Devemos desenvolver em conjunto com os demais agrupamentos e dirigentes que organizam a Mensagem um amplo esforço de organização, ampliação e elaboração política. Com esse sentido, devemos realizar o 3º Encontro Nacional da Mensagem ao Partido.

Coordenação Nacional da Democracia Socialista – DS – Tendência interna do PT

Brasília, 12 de fevereiro de 2011

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