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Colômbia e a vingança popular | Marcelo Caruso Azcarate

A posse diante de uma multidão repleta de emoções que demonstrou um nível de consciência política sem precedentes. A Colômbia prepara-se para uma longa revanche contra o colonialismo e por uma sociedade emancipada.

Imagem: Divulgação

 

Protocolos importantes e até teorias do pensamento crítico foram questionados e qualificados durante o processo de posse presidencial, fenômeno que vale a pena rever sem pretensões acadêmicas. Em primeiro lugar, o protagonismo social e político da sociedade civil popular, em toda a sua diversidade, que foi promovido e aceito pelo próprio governo empossado. A posse frente aos povos originários, depois dos movimentos sociais resistentes e, finalmente, diante de uma multidão repleta de emoções que demonstrou um nível de consciência política sem precedentes para este tipo de cerimônias e muito superior ao anunciado por Antonio Negri.

Uma longa revanche – que não é vingança – estava sendo preparada na história colombiana desde as lutas anticoloniais dos Comuneros del Socorro até as explosões e revoltas que marcaram os 3 anos anteriores. Não conheço caso semelhante neste século, onde a história da resistência tenha sido o eixo de reflexão e ação para reivindicar e reparar uma mudança de governo. Dos quais não só fizeram parte o emocionante retorno à luta pela paz com a espada de Bolívar e os profundos discursos oficiais, mas também o surpreendente protagonismo das dezenas de milhares de participantes, que com uma orientação política “espontânea”, justa e adequada aplaudiram e vaiaram as autoridades estrangeiras visitantes, de acordo com o que mereciam.

O rei da Espanha e o presidente do Equador -vencedores por meritocracia negativa – ficaram perplexos e se sentiram no lugar errado, e os mais aplaudidos, a presidenta de Honduras e os presidentes da Bolívia, Chile e Argentina, sorriram e refletiram – talvez autocriticamente – diante de um cenário onde a política integrava governantes e governados, mas com a primazia da voz popular. Faltou a delegação dos Estados Unidos, que certamente teria conquistado o primeiro lugar nas vaias, e a de Cuba, que teria triunfado nos aplausos. A democracia de exceção, caracterizada por Hugo Moldiz como uma versão autoritária da democracia liberal, teve seu melhor exemplo na Colômbia, onde encontrou uma excepcional ampliação direta e consciente, que faz parte de uma consciência continental em desenvolvimento.

Passado esse momento histórico, muito lutado e esperado por suas vítimas sociais e políticas, foram propostos 10 eixos principais que podem ser montados com os 10 pontos do Comitê Nacional de Desemprego. Para alcançá-los, como o presidente em poder pontuou perante os movimentos e organizações sociais, não bastarão belas ações simbólicas. Cada um deles terá que fortalecer sua construção concreta como sujeitos sociais empoderados que impulsionam e constroem, para que seja possível convertê-los nas reformas e transformações que foram exigidas e acumuladas em mais de 200 anos de dominação neocolonial.

O império está confuso, manda saudações e depois não envia delegação de alto escalão. Os governos da Europa não têm tempo de observar a América Latina porque estão olhando para o novo umbigo ao qual estão ligados. Entretanto, a integração dos povos e governos progressistas e de esquerda do continente tem hoje novas propostas para enfrentar desafios comuns, que terão de ser pensados e elaborados abrindo o debate a toda a sociedade civil popular. Elas e eles já falaram na Praça Bolívar em Bogotá e seguirão lutando para realizar seus pequenos e grandes sonhos.

Marcelo Caruso Azcarate é analista político, professor universitário e consultor em direitos humanos e direito à participação.

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