Bruna Suptitz, no Jornal do Comércio
A candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à presidência da República em 2018 é o único cenário aceito pelo partido, afirma o deputado federal Pepe Vargas (PT), presidente da sigla no Rio Grande do Sul. “Lula está sendo vítima de um julgamento político por parte de um juiz que já tinha previamente determinado qual a posição dele”, acusa, referindo-se ao magistrado Sérgio Moro, que, no início do mês, condenou o petista a 9 anos e meio de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex em Guarujá (SP).
Mesmo com o risco de Lula não conseguir se candidatar no próximo ano, Pepe crê que a decisão contra o ex-presidente pode fortalecer uma candidatura do PT, cenário também projetado para o pleito no Estado. Sem antecipar possíveis candidatos, Pepe prevê que uma aliança de forças da esquerda possa fazer o contraponto ao governador José Ivo Sartori (PMDB). “Vemos muita dificuldade para o Sartori, é um governo que não tem nenhum discurso de esperança para as pessoas.”
Crítico do projeto econômico dos governos federal e estadual, o parlamentar petista sustenta que a renegociação da dívida com a União é ruim, que as privatizações em curso fazem parte de um histórico já praticado em outras gestões do PMDB no Estado e diz que o PT pretende colocar esses temas em discussão no período eleitoral. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Pepe também defende que a Câmara dos Deputados deva aceitar a denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB), cuja análise está prevista para acontecer nesta semana.
Jornal do Comércio – Como a denúncia ao ex-presidente Lula pode interferir no cenário de eleições para 2018?
Pepe Vargas – O objetivo do golpe parlamentar que aconteceu com o apoio de setores da mídia, do empresariado e de alguns setores do aparato estatal, para se completar, precisa tirar o Lula do cenário político brasileiro. Não tem sentido darem um golpe e tirar um governo eleito legitimamente pelo voto popular para, em dois anos, ser eleito novamente. O processo contra o Lula, ao nosso ver, tem esse objetivo. A sentença do Moro é uma pérola de quebra do Estado Democrático de Direito, de uma sentença não fundamentada em provas. Isso não sou só eu que estou dizendo, os principais juristas brasileiros estão deixando muito claro que não há nenhuma materialidade na denúncia contra o Lula, nos embargos de declaração, o Moro se contradiz em relação à própria sentença. Essa sentença será revertida na segunda instância, onde há um colegiado, e não a decisão monocrática de um juiz. O que queremos fazer nesse momento é o debate com a população para mostrar que o Lula está sendo vítima de um julgamento político por parte de um juiz que já tinha previamente determinado qual a posição dele.
JC – Partidos de situação avaliam que isso pode inviabilizar politicamente uma candidatura do PT, do Lula ou da própria esquerda.
Pepe – A sentença vai favorecer o nome do Lula. De certa forma, já iniciamos esse processo, de mostrar as inconsistências da sentença do juiz Sérgio Moro. Isso vai fortalecer a figura do Lula, porque não tem prova material. E o Lula, que, em qualquer pesquisa de opinião, aparece sempre em primeiro lugar, na medida em que esse debate for feito, entendemos que ele vai até se fortalecer, e se fortalece, de certa forma, o PT.
JC – Há ações da defesa junto ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e algumas iniciativas de mobilização de rua, mas ainda não com tanta força como se percebia em outros momentos…
Pepe – Nossa estratégia não é tanto de fazer mobilização de rua, mas atividades, eventos, esclarecimentos à população do quanto a defesa do Lula foi cerceada no próprio processo tanto por Moro quanto pelo promotor Deltan Dallagnol, que apresentou a denúncia baseado exclusivamente em convicções. O devido processo legal, o ônus da prova do acusador, a presunção da inocência do acusado, o direito de a defesa ter acesso a todas as partes do processo, tudo isso foi pisoteado ao longo do processo. As mobilizações de rua vão acontecer por outra razão, contra as reformas da Previdência e trabalhista, para defender os direitos dos trabalhadores, junto com todas as forças e movimentos sociais que estejam dispostos a fazer essa luta. Evidente que quem tem participado desse processo também faz a defesa do Lula e entende que ele é o presidente da República que fez um governo com distribuição de renda, com programas inovadores, onde de fato as pessoas com menor poder aquisitivo tiveram enormes ganhos.
JC – Caso a candidatura de Lula seja inviabilizada, mesmo que depois possa reverter, mas que não consiga concorrer em 2018, como o PT pretende se colocar em nível nacional? Tem outro nome a apresentar ou apoiaria outra candidatura?
Pepe – Não estamos trabalhando com outro cenário que não seja o da inocência do Lula, a absolvição e a candidatura dele. Não tem plano B. São duas frentes, uma coisa é a defesa do Lula no âmbito jurídico, aqui no TRF-4; e nós, enquanto partido e forças aliadas, vamos fazer esse processo de esclarecimento da população, disputar na opinião pública aquilo que os nossos adversários tentam imputar ao Lula para tentar destruir a figura pública dele. Não vamos fazer outra discussão que não essa da defesa do Lula, e temos a convicção de que ele será absolvido e será candidato.
JC – Acredita que tanto a denúncia quanto uma possível retirada da candidatura dele possam interferir no cenário das eleições no Estado?
Pepe – Mesmo que, por hipótese, ele fosse condenado, não mudaria nossa estratégia. Estamos convictos de que será absolvido, e com certeza o PT e o Lula serão protagonistas ativos na eleição. No plano estadual, entendemos que as coisas estão muito interligadas. O bloco que sustenta o governo Sartori é o mesmo bloco que sustenta o governo Temer. O programa é o mesmo e não levará a nenhum futuro nem para o País, nem para o Rio Grande do Sul. O que o Temer faz: aumenta os impostos. O que o Sartori faz: aumenta os impostos. O Sartori aumentou o ICMS, e o Temer aumentou o preço da gasolina. O modelo que eles defendem leva a isso. Aumento da carga tributária, redução de serviços prestados à população, crise econômica permanente, baixo crescimento ou recessão. Vamos fazer esse debate no processo eleitoral, de construir uma alternativa completamente distinta dessa ortodoxia neoliberal que eles representam.
JC – Vê no Rio Grande do Sul nomes com condições de tomar frente a esse processo?
Pepe – O PT é um partido que não tem carência de nomes. Temos dois ex-governadores, a maior nominata na Assembleia Legislativa, deputados federais, ex-ministros. O PT tem nomes construídos na sociedade gaúcha. Não chegou ainda a etapa de discutirmos nomes, vamos definir o calendário, que passa por uma discussão programática, construir e atualizar um programa de governo para o Rio Grande do Sul que estimule o desenvolvimento do setor produtivo gaúcho, que existe, é dinâmico, mas hoje há uma carência de políticas públicas para estimular o desenvolvimento desses setores. Ao mesmo tempo, ao estimular esses setores, podemos resolver parte dos problemas fiscais que o Estado tem. Mas obviamente que também passa pela necessidade de o Rio Grande do Sul ter uma postura mais altiva em relação ao governo federal, cobrar dívidas que a União tem, e não só ficar discutindo uma renegociação nos moldes que o governador Sartori está querendo fazer, imposto pelo governo Temer, que envolve inclusive vender ativos lucrativos e que, se forem vendidos, irão reduzir a receita pública e agravar ainda mais a crise fiscal do Estado. Vamos fazer esse debate de conteúdo, de programa de governo, de política de alianças e definição de nomes. Ainda estamos no prazo.
JC – Tem previsão de quando conseguiria apresentar?
Pepe – O diretório estadual ainda não definiu esse calendário, mas até o final deste ano é um prazo bastante adequado para poder definir uma candidatura majoritária do PT. Para o Senado temos já o nome do (Paulo) Paim, que está posto, até porque está no exercício e tem condições de ser reeleito; e para o governo do Estado vamos juntos, depois desse processo de discussão programática, também definir um nome.
JC – Além do Paim, mais algum nome para o Senado?
Pepe – Por enquanto, o PT tem discutido só o nome do Paim, até porque, como queremos fazer aliança…
JC – E acredita que vão conseguir unir os partidos que representam a esquerda?
Pepe – Eu diria que as principais forças de esquerda do Rio Grande do Sul e do Brasil atuaram unificadas em torno dos governos Lula e Dilma (Rousseff). Estão até mais unificadas ainda na pauta de luta contra a tentativa de retirada de direitos que o governo Temer faz. Para nós, o horizonte de alianças passa por essas forças políticas. Poderá acontecer de que se tenha mais de uma candidatura na eleição para governador, mas, como temos dois turnos, é perfeitamente possível que, no segundo, a gente tenha a esquerda no Estado unificada, naquilo que vem sendo uma polarização de muito tempo, um campo mais de centro-esquerda e um campo mais de centro-direita, digamos assim, fazendo a disputa do governo. Acreditamos que o cenário não deverá ser diferente nessas eleições.
JC – O PMDB aposta na reeleição de Sartori.
Pepe – Vemos muita dificuldade para o Sartori, sei que o PMDB tem uma avaliação mais otimista do potencial dele, mas é um governo que não tem nenhum discurso de esperança para as pessoas, só chora que não tem dinheiro, quer vender o patrimônio, não paga os salários em dia e não tem uma política de investimentos. Se pegar a situação das estradas, é calamitosa, instrumentos que o Estado tem que poderiam ajudar a alavancar o desenvolvimento ele está desconstituindo, como a Fepagro (Fundação de Pesquisa Agropecuária), por exemplo. Achamos que vão ter muitas dificuldades, mas, apesar disso, é lógico que esse campo historicamente tem força, assim como o campo de centro-esquerda tem força, e acreditamos que a polarização eleitoral vai ser essa.
JC – Como seria o enfrentamento ao discurso do governador Sartori, tente ele reeleição ou não?
Pepe – Óbvio que esse debate vai acontecer no processo eleitoral. Vamos querer discutir se negociar a dívida nos moldes propostos pelo pela União é bom ou ruim para o Rio Grande do Sul. Na nossa opinião, é ruim, pois não diminui uma vírgula no montante da dívida, ganha uma moratória de três anos, mas continua correndo juros e correção, então quando se retomarem os pagamentos a dívida vai estar mais alta. E ainda tem que se desfazer de ativos que trazem recursos ao caixa do Estado. O Banrisul, quando distribui lucros e dividendos, parte disso vem para o acionista majoritário, que é o Estado do Rio Grande do Sul, só para pegar um exemplo. Vender esses ativos ou de empresas públicas que são lucrativas ou que prestam serviços essenciais, como no saneamento básico, em vez de melhorar a condição do Estado e da população, vai piorar.
JC – Não seria uma opção…
Pepe – Até porque esse discurso da privatização já foi feito no passado, inclusive num governo do PMDB, no tempo em que o (Antônio) Britto (1995-1998) era do PMDB. Ele vendeu boa parte da estrutura do setor público, e a dívida só aumentou. Então não é a solução. A Yeda Crusius (PSDB, governadora entre 2007-2010) vendeu quase metade do Banrisul; neste sentido, além de perder um instrumento para fomentar o desenvolvimento econômico da região, ainda perde receita pública direta e agrava a situação fiscal do Estado. Precisamos de outro modelo de desenvolvimento que não esse. Agora, para que a nossa economia tenha também um resultado melhor, é evidente que tem que mudar a política econômica nacional, porque o Estado sofre muitas dificuldades.
JC – Qual a expectativa para a denúncia contra Temer, que será votada na Câmara?
Pepe – Prefiro não trabalhar com expectativa, posso dizer o que achamos que a Câmara deveria fazer: aceitar a denúncia, que não é já condenar o Temer, é dar a oportunidade para que ela seja apurada. O que não dá é para engavetar previamente.
Perfil Gilberto José Spier Vargas, o Pepe Vargas, tem 59 anos e é presidente estadual do PT desde junho deste ano. Natural de Nova Petrópolis, é formado em Medicina pela Universidade de Caxias do Sul e especializado em Homeopatia pela Associação Médica Homeopática do Paraná. Como médico, Pepe foi diretor clínico do Hospital Beneficente Nossa Senhora do Caravaggio, no município de Jaquirana. Foi médico dos sindicatos dos Metalúrgicos de Caxias, dos Têxteis de Farroupilha, e dos Trabalhadores do Polo Petroquímico. Iniciou a vida política como militante no movimento estudantil nos anos 1970. Em 1981, filiou-se ao PT. Elegeu-se vereador em Caxias do Sul em 1988. Em 1994, foi eleito deputado estadual e, em 1996, elegeu-se prefeito da cidade, reeleito em 2000. Atualmente, está no terceiro mandato de deputado federal, eleito nos anos de 2006, 2010 e 2014. Durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), foi ministro do Desenvolvimento Agrário, dos Direitos Humanos e da Secretaria de Relações Institucionais.
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