Diretrizes do programa apontam medidas efetivas para resgatar o “público”.
Por trás dos fatos mais aparentes, a luta que se dá nesse cenário de crise é entre a defesa intransigente do público e a lógica privatista, que a direita tenta impor a todo custo. Esse embate tem sua raiz na formação do Estado brasileiro, que herda uma promiscuidade entre o público e o privado, nunca bem delineada. A formação do público é dependente de luta contra valores mercantis clientelistas e patrimonialistas. Dessa forma, sem ética, a noção de público cai em descrédito e atinge todo o programa da esquerda.
Essa lógica privatista se torna alimento de uma “governabilidade” tortuosa. A partilha do governo cumpre o papel de atração de apoio para fazer maioria, já que o parlamento está estruturado de forma extremamente atrasada. Uma nova governabilidade requer também democratização da representação parlamentar e de legitimação do governo. Fundamental para essa outra organização são as formas de participação direta e a reforma política.
O PT já apontava, nas Diretrizes do Programa de Governo definidas no XII Encontro Nacional, de 2001, a centralidade desse debate: “a boa experiência do orçamento participativo nos âmbitos municipal e estadual indica que, apesar da complexidade que apresenta sua aplicação no plano da União, ela deverá ser estendida para essa esfera”.
As diretrizes também reivindicavam, como condição para um novo padrão de desenvolvimento, um “novo modelo de gestão estatal”. Para isso seria essencial abrir duas grandes vertentes: a gestão participativa e a gestão estratégica. Diz o documento: “a
gestão pública participativa – uma das referências centrais de nossos governos estaduais e municipais – deve ser uma dimensão básica da reformulação da relação entre o Estado brasileiro e a sociedade, também no nível central. A constituição de novas esferas públicas democráticas, voltadas à co-gestão pública, à partilha de poder público, à articulação entre democracia representativa e democracia participativa será fator-chave para, ao mesmo tempo, combater as práticas clientelistas, valorizando a fala dos direitos, e propiciar a participação de novos protagonistas sociais, representando a maioria da população, hoje excluída das decisões (salvo raras exceções). Serão, portanto, não apenas espaços de debate e deliberação envolvendo Estado e sociedade, mas igualmente de disputa de hegemonia com a cultura clientelista e com os valores neoliberais”.
Outra governabilidade. XII Encontro do PT, em 2001, apontou
importância do Orçamento Participativo
Mais à frente, o documento aponta iniciativas relevantes no campo da democracia participativa: “a implementação do orçamento participativo no nível central será desafio de peso, na medida em que não se trata de efetuar uma mera transposição mecânica de políticas em curso nos níveis local e estadual para o central, que é muito mais complexo (será necessário, por exemplo, tomar na devida conta a estrutura federativa brasileira); os variados conselhos temáticos ou setoriais – inclusive para o controle público das empresas estatais e das concessionárias de serviços públicos; a reformulação de fundo das agências nacionais de regulação, integrando representantes dos consumidores; instituições como as câmaras setoriais, voltadas à elaboração, negociação e implementação de políticas industriais ou setoriais; gestão participativa dos fundos públicos etc.”.
O documento também aponta os “principais pontos de uma reforma política democratizadora”: a adoção do financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, a fidelidade partidária e a redefinição da representação dos estados na Câmara Federal (respeitados os princípios federativos). Além disso, as diretrizes indicam necessidade da democratização dos meios de comunicação, de reformulação das agências reguladoras e da Lei de Responsabilidade Fiscal e da reforma e controle externo do Judiciário.
Também o Programa de Governo de 2002 materializava o debate da reforma política. O programa tratava o tema considerando a reforma “urgente e necessária para promover uma efetiva democratização da sociedade e do Estado, permitindo que as disputas eleitorais sejam mais transparentes, equânimes e capazes de abrir espaço para o surgimento de novas lideranças”. Ali são reafirmadas as propostas de financiamento público, a fidelidade partidária e o reequilíbrio da representação proporcional na Câmara. O programa adota também a proposta de instituir eleições proporcionais por lista.
De fato, o partido já demonstrou ter propostas claras e experiência nesse campo, para fazer da gestão participativa uma condição orientadora do governo e da reforma política uma prioridade estrutural. Esses compromissos precisam ser retomados para que de fato se realize uma outra governabilidade. Sem essas mudanças estruturais, que reorganizam o Estado em outras bases, a tendência é a manutenção de um ambiente propício a práticas anti-democráticas e anti-republicanas.
Leia ainda:
Diretrizes do programa de governo do PT para o Brasil [Link Indisponível]
Leia a íntegra do documento aprovado no XII Encontro Nacional do Partido, realizado em dezembro de 2001, na cidade do Recife. (no portal do PT – www.pt.org.br)
A política dos “aliados” [Link Indisponível]
Más companhias. Setor da direita fisíológica nunca apoiará medidas populares.
Três táticas na conjuntura [Link Indisponível]
Papel do PT. Veja o texto que foi base da proposta apresentada na reunião do Diretório nacional do dia 18 de junho.
Saídas de esquerda para a crise [Link Indisponível]
Pilares da mudança. Democracia participativa, combate à corrupção e nova política econômica.
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PED 2005. Campo majoritário muda tese, mas mantém contradições.
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